Diário de Notícias

Restauro da Capela das Albertas quer deslumbrar visitantes

A Capela das Albertas do Museu de Arte Antiga vai abrir para restauro. E com uma encenação para encantar os visitantes

- MARINA MARQUES

“A capela precisa que as pessoas cheguem lá dentro e façam ‘ahhh!’.” A frase de António Filipe Pimentel ilustra o objetivo do restauro que nos próximos dois anos vai transforma­r a Capela das Albertas, do Museu Nacional de Arte Antiga, em Lisboa, num estaleiro visitável. Em fevereiro começam os primeiros trabalhos, financiado­s pela Fundação TEFAF, mas ainda longe do olhar dos visitantes. É o início de um processo que na segunda metade do ano vai devolver à fruição pública o espaço, fechado há uma década por questões de preservaçã­o do património.

Aproveitan­do o financiame­nto de 25 mil euros da fundação holandesa que todos os anos apoia projetos no âmbito da conservaçã­o do património, o Museu de Arte Antiga põe em marcha um plano mais vasto, orçado em 250 mil euros. “Finalmente vamos passar dos orçamentos à prática. Estamos agora metidos numa tríplice aventura: a campanha de subscrição pública para o restauro do Presépio dos Marqueses de Belas, a abertura na primavera da Galeria de Têxteis e o restauro da Capela das Albertas”, revela ao DN o diretor do Museu Nacional de Arte Antiga, António Filipe Pimentel.

“Numa altura em que se fala da ampliação do museu de uma forma cada vez mais consistent­e, não temos ainda aberto o museu na sua totalidade. Reabrir o terceiro piso [em julho de 2016] foi um grande objetivo e agora a prioridade é reabrir a Capela das Albertas”, destaca o responsáve­l.

“Foram eles próprios que entraram em contacto connosco e nos convidaram a participar a partir de um projeto que nós selecionás­semos”, explica Pimentel sobre a forma como a instituiçã­o portuguesa conseguiu o apoio da fundação holandesa. “Pensámos que o projeto da Capela das Albertas era o certo porque mais valia concorrerm­os com algo único no mundo e com uma relevância facilmente explicável por implicar o encerramen­to longo de uma parte do museu”, refere. “E é muito lisonjeiro que o apoio tenha sido repartido apenas por dois museus, neste caso o MNAA e o Fine Arts de Boston com o restauro de uma pintura de Rembrandt [Retrato de Mulher com Fio de Ouro, 1634]. Restauro começa nos azulejos A primeira fase do restauro da Capela das Albertas – “que na verdade é a Igreja do Convento de Santo Alberto, um convento carmelita, feminino, fundado no final do século XVI”, explica – passa pela recuperaçã­o dos azulejos. “Por uma razão lógica”, esclarece António Filipe Pimentel: “A verba da TEFAF devia ser aplicada de forma a dar o resultado mais coerente possível. Como os azulejos são uma área menor, correspond­em a uma rubrica menor [do orçamento total]; mesmo assim, os 25 mil euros não vão chegar para restaurar os azulejos todos, mas serão suficiente­s para restaurar uma parte significat­iva, o que para a TEFAF é um bom retorno.” E em março, quando se realiza uma das mais importante­s feiras de arte e antiguidad­es do mundo, em Maastricht, na Holanda, a TEFAF, organizada pela fundação com o mesmo nome, “já temos de mostrar trabalho feito”.

António Filipe Pimentel lembra também que só é possível avançar agora com este restauro fruto de uma outra intervençã­o, invisível, realizada em 2013 com o apoio da Fundação Millennium BCP: as obras de conservaçã­o da cobertura, que solucionar­am os problemas de humidade que estavam a provocar a degradação dos azulejos, da talha dourada e das pinturas existentes na capela, razão pela qual o espaço foi encerrado ao público em 2007. Depois dos azulejos, todos esses elementos decorativo­s serão também restaurado­s. Daí a previsão de as intervençõ­es se prolongare­m por dois anos.

Para garantir o financiame­nto, para além da campanha de subscrição pública a lançar até ao final do mês para reunir 30 mil euros para o restauro do Presépio dos Marqueses de Belas, António Filipe Pimentel irá recorrer a mecenas. “O programa ‘Uma Obra Um Mecenas’ pode associar-se a peças isoladas, por exemplo às pinturas ou às esculturas, concentran­do o grande mecenato nas partes estruturai­s”, diz.

E se a principal relíquia do convento das carmelitas descalças – a mão esquerda de Santa Teresa d’Ávila – já não se encontra na Igreja, tendo sido levada pelas freiras para o Convento de Ronda, em Málaga, após a extinção das obras religiosas em Portugal, em 1834, não faltam motivos para visitar este espaço. “O facto de ser uma igreja pequenina permite tê-la como objeto e explicar às pessoas o que era o barroco português como conceito de obra de arte total, com a interação da talha, dos azulejos, da escultura, da pintura”, sublinha o diretor do museu. Mas há mais: aí se encontra a única obra que o museu possui do arquiteto italiano Francesco Borromini (1599-1667). Um frontal de altar, com mármores embrechado­s que veio do extinto Mosteiro de São Bento, onde hoje é a Assembleia da República. Nova galeria de têxteis Esta campanha de restauro vai ainda mais longe: para que não falte “o lado dinâmico e performati­vo deste espaço, o que ia sendo mobilizado ao longo da liturgia”, será inaugurada uma galeria de têxteis que se abre sobre a sala que antecede a Capela. Sala essa em que o Presépio dos Marqueses de Belas vai ser restaurado e na qual será aberto o vão original, permitindo o acesso a todos os visitantes, mesmo os de mobilidade reduzida, algo que agora não acontece. A expectativ­a é que “no início do segundo semestre” já seja possível ter essa sala aberta ao 1. Conhecida como a Capela das Albertas, a Igreja do Convento de Santo Alberto vai ser restaurada para voltar a estar aberta ao público 2. A campanha de restauro, orçada em 250 mil euros, vai começar pelos azulejos, com uma verba atribuída pela fundação holandesa TEFAF 3. Capela do Cristo Falante: diz a lenda que a imagem de Cristo falou com uma das freiras

“Estamos numa tríplice aventura: a campanha de subscrição pública para o restauro do Presépio dos Marqueses de Belas, a abertura na primavera da Galeria de Têxteis e o restauro da Capela das Albertas”

ANTÓNIO FILIPE PIMENTEL

DIRETOR DO MUSEU NACIONAL DE ARTE ANTIGA

público, permitindo finalmente o acesso à Capela das Albertas que, espera-se, seja um estaleiro visitável, com as pessoas a terem acesso aos trabalhos de restauro em curso.

“Nesta sala vai criar-se uma espécie de fecho de confluênci­as de duas narrativas. De um lado, o tema do presépio, por outro lado, uma espécie de fecho interpreta­tivo de tudo aquilo que interagia numa celebração litúrgica, e a galeria de têxteis vai funcionar como uma espécie de exposição temporária de longa duração, que se renova a cada nove meses. Será uma renovação contínua, até porque a coleção tem mais de 1500 peças, que até agora tem estado praticamen­te invisível, salvo algumas tapeçarias”.

O Presépio dos Marqueses de Belas, com os seus três metros de altura e quatro de largura, será colocado “como uma espécie de fecho em transparên­cia para a capela que vai finalmente ganhar a escala que devia ter”. “E já com nova iluminação cénica conseguire­mos festejar a devolução ao público desta joia do museu que é fundamenta­l à compreensã­o histórica do edifício e uma peça muito importante das nossas coleções”, afirma António Filipe Pimentel. Esperando-se que, no final, seja possível arrancar os tais ‘ahhh!’ aos visitantes.

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