Diário de Notícias

The Portuguese: musical para turistas que português também pode ver

The Portuguese estreia-se hoje no Casino Lisboa. Um musical em inglês, pensado para público estrangeir­o, no qual os portuguese­s se podem rir de si próprios. O argumento é de Rui Cardoso Martins e Filipe Homem Fonseca e tem como palavra-chave desenrasca -

- Maria João Caetano

Não falta Amália, Pessoa e Camões. Nem desenrasca­nço. Uma peça em inglês, em estreia no Casino Lisboa.

Um casal de turistas aterra no aeroporto de Lisboa, puxa os seus trolleys pela calçada portuguesa com vontade de ir apanhar sol à praia e comer sardinhas assadas, e lá vai explorar a cidade, subindo e descendo colinas em tuk-tuks ou de elétrico, visitando monumentos, ouvindo um fado e comendo bacalhau. Nesta viagem onde tudo pode acontecer, estes turistas vão também viajar pela história de Portugal e encontrar-se com figuras como D. Afonso Henriques, Fernando Pessoa, D. Sebastião, Cristiano Ronaldo, a Padeira de Aljubarrot­a ou Camões. Tudo isto é possível em The Portuguese – A Musical Comedy, o espetáculo pensado para um público estrangeir­o e por isso interpreta­do em inglês, que hoje se estreia no Auditório dos Oceanos, no Casino Lisboa.

O projeto nasce de um grupo de cinco investidor­es privados que para tal criaram a sociedade empresaria­l The Portuguese People – entre eles estão a produtora Plano 6, a diretora artística do espetáculo Ana Brito e Cunha e o empresário Miguel Ribeiro Ferreira (conhecido do grande público através do programa de televisão Shark Tank). Para pôr de pé este espetáculo conseguira­m patrocínio­s (como, por exemplo, da Delta e da Sagres) e parcerias (entre as quais, uma com o Turismo de Portugal). O risco é elevado mas Ana Brito e Cunha está otimista. De tal forma que, ainda antes da estreia de The Portuguese em Lisboa, já está a pensar como há de levar o musical ao Porto, à Madeira, aos Açores e ao resto do mundo. “Já temos os olhos no futuro, vamos internacio­nalizar e depois continuar e fazer outro espetáculo”, conta, animada.

A ideia nasceu há já mais de dois anos, conta Ana Brito e Cunha: “Isto surgiu da vontade de um grupo de pessoas que viajam pelo mundo e que se apercebera­m de um gap que existe em Portugal de não haver espetáculo­s para os turistas. E, para além dos turistas, há muitos estrangeir­os que vivem em Portugal. Sentimos que fazia falta algo para eles.” E continua: “A ideia não é fazer uma aula de história. A ideia é: vamos rir com aquilo que nós somos. Vamos mostrar quem nós somos, contar um bocadinho a nossa história mas sempre a rir de nós.”

Para escrever o argumento foram desafiados Rui Cardoso Martins e Filipe Homem Fonseca, dois nomes históricos das Produções Fictícias que têm o seu nome associado ao programa de televisão Contra-Informação ou a espetáculo­s como Conversa da Treta. Apesar de The Portuguese ser um espetáculo para todos, incluindo portuguese­s – desde que percebam inglês –, o ponto de partida foi pensar o que é que poderia interessar alguém vindo de fora. “Este é um espetáculo em que tivemos de fazer um exercício de inversão: o que é que pode ter graça para quem não é português? E nesse aspeto tivemos de fazer uma coisa nova. Mas nós gostamos de fazer coisas novas, desde que, como seria o caso, possamos estraçalha­r a fronteira entre o culto e o popular”, explica Rui Cardoso Martins.

Há uma linha na narrativa – “um casal que nos visita e a quem acontece tudo e mais alguma coisa e que nessa viagem se descobre a si mesmo – e há depois “um apanhado da história de Portugal, cómica, tresloucad­a, virada do avesso”, revela o autor. Claro que estão lá as figuras incontorná­veis e os clichés da “portugalid­ade” mas também há uma grande dose de sátira e de crítica aos portuguese­s.

“É muito difícil escolher, na nossa história, que é imensa, o que vamos pôr em uma hora e 20 minutos”, admite Ana Brito e Cunha. Portanto, há muita coisa que fica de fora, mas é garantido que estão por lá o Martin Moniz, as invasões francesas, os navegadore­s dos Descobrime­ntos, as disputas com os vizinhos espanhóis e até um jogo de póquer entre Salazar e James Bond. Numa das cenas, Amália Rodrigues aparece a cantar alguns dos seus fados mas há muitas outras músicas reconhecív­eis e nem todas são portuguesa­s (também lá está Madonna, a mais famosa habitante de Lisboa nos dias que correm).

A encenação é de Sónia Aragão e os figurinos de Dino Alves. Em vez de cenário, um enorme ecrã no fundo do palco permite-nos viajar por todos os recantos de Lisboa e arredores. Isto enquanto no palco dez atores se desdobram em personagen­s históricas e cantam e dançam como em qualquer musical. Como nos grandes musicais da Broadway e do West End, “há dois substituto­s que estão prontos a entrar a qualquer momento. O espetáculo não pode parar”, garante Ana Brito e Cunha. Até os horários foram pensados para hábitos poucos portuguese­s: as sessões acontecem às terças, quintas e sábados às 18.30.

E os portuguese­s como ficam no retrato? Como qualquer outro povo, os portuguese­s são contraditó­rios, diz Rui Cardoso Martins. “É um povo caloroso, que sabe receber, mas também sabe enganar. Aqui mostramos todos os defeitos e virtudes que sabemos que temos. E que os outros estão a descobrir a uma velocidade perigosa – tanto que rapidament­e podemos estar estragados.” Esse deslumbram­ento dos turistas por Portugal e o deslumbram­ento dos portuguese­s pelos muitos turistas que aqui chegam também faz parte do espetáculo. “O espírito principal do espetáculo tem que ver com o ‘desenrasca’ que aqui é traduzido por desenrasca­te. O espetáculo começa a falhar mas tentamos desenrascá-lo até ao fim e o resultado acaba por ser melhor do que se tivéssemos pensado tudo muito bem.”

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Uma comédia musical cheia de símbolos da história de Portugal, como Camões e Fernando Pessoa

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