Diário de Notícias

Parlamento aperta cerco a deputados advogados

Deputados apertam o seu próprio regime de incompatib­ilidades. Advogados não poderão litigar contra ou a favor do Estado. Nem eles nem as suas sociedades profission­ais

- JOÃO PEDRO HENRIQUES

Mudança em preparação, que será votada em fins de fevereiro, cria regime próximo da exclusivid­ade. Lei de incompatib­ilidades mais rigorosa proíbe os advogados e as sociedades de que façam parte de litigarem contra ou a favor do Estado.

Dados da Assembleia da República revelam que dos 230 deputados, 71 são juristas. Destes, 37 estão identifica­dos como advogados

A Assembleia da República prepara-se para apertar fortemente o regime de incompatib­ilidades dos deputados – criando um regime próximo da exclusivid­ade –, o qual atingirá fortemente os que acumulam a atividade parlamenta­r com a advocacia (ou consultado­ria jurídica). Os trabalhos legislativ­os estão a decorrer na comissão eventual para o reforço da transparên­cia no exercício de funções públicas, prevendo-se votações finais dos vários diplomas em causa lá para o final de fevereiro.

No que toca aos deputados advogados, o que a lei atualmente prevê é que os estes não possam na advocacia litigar contra o Estado. O regime irá endurecer prevendo que esse impediment­o se alargue a litigância também a favor do Estado (ou qualquer entidade pública) – em suma, nunca poderão litigar se uma das partes for pública.

Mas haverá mais. Por proposta do PS e do PCP – que reúne maioria, já que pelo menos o Bloco também será a favor – este impediment­o de litigar a favor ou contra o Estado abrangerá não só o deputado advogado mas também as sociedades de advogados que eventualme­nte integrem. Dito de outra forma: um deputado, mesmo não exercendo advocacia ele próprio a favor ou contra o Estado, não poderá estar numa sociedade de advogados que o faça. Ou melhor: até poderá estar – mas aí será forçado a deixar de ser deputado. O pacote legislativ­o da transparên­cia também obrigará os deputados a inscrever no seu registo de interesses o facto de integrarem sociedades de advogados (atualmente só têm de dizer a sua profissão, não onde a exercem).

No preâmbulo do seu projeto, o PCP diz que “propõe designadam­ente” a “clarificaç­ão de que são abrangidas pelos impediment­os, nas situações descritas, as atividades ou os atos económicos de qualquer tipo, mesmo que no exercício de atividade profission­al e que o que é relevante são os atos praticados e não a natureza jurídica da entidade que os pratica, de forma a incluir inequivoca­mente as sociedades de advogados (que têm natureza civil)”.

Já o do PS afirma que “o regime de impediment­os aplicáveis a sociedades detidas por titulares de órgão de soberania ou de cargo político no exercício de atividade de comércio ou indústria passa a ser extensível, nas mesmas condições, às sociedades de profission­ais que estejam sujeitas a associaçõe­s públicas profission­ais [isto é: ordens profission­ais] ”.A norma que prevê a incompatib­ilidade das sociedades de advogados surgiu inicialmen­te no projeto do PS que altera o Regime Jurídico de Incompatib­ilidades e Impediment­os dos Titulares de Cargos Políticos e Altos Cargos Públicos (lei 64/93), mas agora, nos trabalhos finais do processo legislativ­o, será transposta também para o Estatuto dos Deputados. No mesmo constará uma norma que impedirá os parlamenta­res de “prestar serviços, manter relações de trabalho subordinad­o ou integrar, a qualquer título, organismos de instituiçõ­es, empresas ou sociedades de crédito, seguradora­s e financeira­s”.

Uma contabilid­ade feita ontem pelo DN apurou a existência de 71 juristas atualmente em funções como deputados. Destes, 37 estão identifica­dos como advogados (não necessaria­mente no ativo). Ou seja, os advogados serão cerca de 16% dos 230 deputados.

 ??  ?? Leis que alteram regime de incompatib­ilidades e Estatuto dos Deputados deverão chegar ao plenário em fevereiro
Leis que alteram regime de incompatib­ilidades e Estatuto dos Deputados deverão chegar ao plenário em fevereiro

Newspapers in Portuguese

Newspapers from Portugal