Cidadania confirmada a português acusado na Lava-Jato
O IRN, tutelado pelo Ministério da Justiça, confirmou a nacionalidade portuguesa originária ao acusado Raul Schmidt
A ministra da Justiça está a a reavaliar a sua decisão de extradição do luso-brasileiro Raul Schmidt, acusado na operação brasileira LavaJato. Em causa está um requerimento da defesa que conta com um despacho do Instituto de Registos e Notariado (IRN), organismo tutelado pela própria Francisca Van Dunem, datado de 9 de janeiro último, no qual reconhece a Schmidt, que nasceu e viveu no Brasil, a nacionalidade portuguesa originária, por ser neto de português, conforme previsto na lei.
Com este averbamento, a lei em vigor impede que Schmidt, perseguido pela justiça brasileira indiciado pelos crimes de corrupção e branqueamento de capitais e organização criminosa seja extraditado para o Brasil, obrigando a realizar o seu julgamento nos tribunais portugueses. “O requerimento recebido, por via eletrónica, no dia 10 de janeiro, às 18.36, dirigido à senhora ministra, dada a complexidade técnica do assunto, designadamente por força das decisões jurisdicionais já proferidas e pendentes de decisão, está a ser objeto da adequada e necessária ponderação”, confirmou ao DN o gabinete da governante.
Em abril de 2016, Francisca Van Dunem tinha considerado “admissível” a extradição de Raul Schmidt, que nessa altura ainda não tinha oficializado a sua naturalidade originária, mas já tinha a nacionalidade portuguesa, além da brasileira. De seguida o Tribunal de Relação (entidade responsável por estes processos) validou o pedido das autoridades brasileiras. Igual posição teve o Supremo Tribunal de Justiça.
Entretanto, a defesa que alegava a ilegalidade do despacho de Van Dunem, afirmando que Raul Schmidt só não tinha ainda obtido a nacionalidade originária porque a regulamentação da lei, da responsabilidade do Ministério da Justiça, demorou dois anos a ser concluída, recorreu para todas as instâncias, até ao Tribunal Constitucional, com a sua tese reforçada pelos pareceres de três dos mais importantes constitucionalistas do nosso país.
Gomes Canotilho, Paulo Otero e Rui Moura Ramos arrasaram a decisão da ministra da Justiça e apresentaram todas as razões legais a fundamentar porque Raul Schmidt não pode ser extraditado. Confrontado na altura pelo DN com estes pareceres, o gabinete de Francisca Van Dunem remeteu para os “tribunais” todas as “questões relativas à extradição, designadamente as relativas à inconstitucionalidade de quaisquer normas jurídicas”.
Com este “novo facto”, a decisão do IRN, a defesa do acusado enviou, no início da semana, requerimentos a quatro entidades para que a extradição fosse anulada: ao Tribunal da Relação, para que indefira o pedido do Brasil, ao Tribunal Constitucional, onde estão pendentes os recursos, à ministra da Justiça, para que revogue o seu despacho, e à procuradora-geral da República, Joana Marques Vidal, para que emita pareceres sobre os requerimentos anteriores.
“Esperamos que depois deste reconhecimento do IRN, um serviço tutelado pelo próprio Ministério da Justiça, a senhora ministra corrija os erros que cometeu”, assevera o advogado Pedro Delille. O responsável pela defesa de Schmidt considera que foram cometidos “erros graves” pela titular da pasta. Um deles, também salientado pelos constitucionalistas, foi admitir a extradição quando a regulamentação da lei, que reconhece a nacionalidade originária a Raul Schmidt, só não estava em vigor por atraso dos seus serviços. “A decisão da ministra da Justiça é neste caso soberana. Se entender que a extradição não é admissível, os tribunais não a podem alterar. Com o despacho do IRN, é um dever da senhora ministra”, conclui. V.M.