Supernanny. Bloco quer intervenção do governo
Televisão. Grupo parlamentar bloquista pretende que executivo diga se o programa da SIC viola os direitos das crianças
“Este programa (...) devassa a vida de crianças que, naturalmente, encontram-se nesta situação de exposição e fragilidade emocional apenas por decisão de outrem, neste caso as mães e os pais, vendo as suas emoções exploradas para fins comerciais ou, dito de outra forma, de audiência. (...) Os efeitos nefastos no desenvolvimento das crianças que foram levadas a participar no referido programa fazem-se sentir já hoje e propagarão os seus efeitos durante um tempo que não é mensurável. A violência desta exposição far-se-á sentir em cada caso concreto de forma diversa.” É nestes termos de resoluta condenação que o grupo parlamentar do BE se refere ao formato Supernanny, que estreou no passado domingo na SIC, no introito das duas perguntas que ontem endereçou ao ministro da Cultura.
Nestas, pede-se ao governante que se pronuncie sobre se considera o programa uma violação dos direitos das crianças e questiona-se se “pondera recomendar a observância” de disposições da Lei de Proteção de Crianças e Menores e da Convenção sobre os Direitos da Criança que impõem o respeito pela privacidade das crianças “em todas as situações de utilização e difusão da imagem, história de vida ou identidade das crianças (independentemente da existência de autorização legal dos pais das mesmas)”.
Mas que pode o governo fazer? Qual a sua margem de ação no caso de um programa de TV? A deputada Sandra Campos, a primeira signatária da iniciativa, explica: “Creio que tem a responsabilidade de se pronunciar e de fazer algum tipo de pressão. É essa a nossa expectativa.” A parlamentar admite no entanto tratar-se de uma questão complexa: “A lei não está propriamente em incumprimento, por haver autorização dos pais. Mas coloca-se um problema ético. Por exemplo na Lei de Proteção de Crianças e Jovens está previsto que haja proteção da identidade das crianças institucionalizadas, para que não possam ser identificadas. Podia ao menos haver esse cuidado, o de proteger a identidade das crianças através da utilização de filtros e de elementos identificativos. Porque até a casa de morada da família e o local de trabalho da mãe foram identificados.”
Estando em preparação uma diretiva europeia sobre precisamente o reforçar das garantias de privacidade das crianças, Sandra Campos considera que faz sentido não só debater o assunto como avançar com uma proposta legislativa no sentido desse reforço: “Estamos a ponderar apresentar algo que permita proteger as crianças deste tipo de exposição. Creio que se pode incluir uma ressalva na Lei de Proteção de Crianças e Jovens que se aplique a todas as crianças e não apenas às institucionalizadas.”
A questão, naturalmente, é que na legislação atual são os pais que têm o poder de decidir sobre a exposição dos filhos, e quaisquer medidas em relação a decisões que ponham as crianças em risco ou lhes violem os direitos só podem ser tomadas depois do facto – a família da menina de 7 anos retratada na estreia do formato terá sido já ouvida pela Comissão de Proteção de Menores da sua área. De resto, a Comissão Nacional de Promoção dos Direitos e Proteção de Crianças e Jovens tomou logo na segunda-feira posição contra o programa, assim como a UNICEF Portugal e o Instituto de Apoio à Criança, cuja presidente da direção afirmou ontem ao DN que considera que o programa deve ser suspenso.
Para Sandra Campos (BE), “a lei não está propriamente em incumprimento, por haver autorização dos pais. Mas coloca-se um problema ético”