Vitória independentista antes da batalha por Puigdemont
Catalunha. Roger Torrent foi eleito presidente do Parlamento catalão, com o voto dos deputados detidos mas não dos exilados. Primeira votação para o líder da Generalitat deve ser dia 31
Os independentistas recuperaram ontem o controlo do Parlamento catalão, com a eleição de Roger Torrent, da Esquerda Republicana da Catalunha (ERC), para a presidência deste órgão legislativo. É o primeiro passo na batalha para reeleger Carles Puigdemont, que se autoexilou em Bruxelas para fugir à justiça espanhola e está ameaçado de prisão caso regresse a Espanha. “Estou convencido de que exercerá o cargo com nobreza e coragem, protegendo as instituições e o país”, escreveu o ex-presidente da Generalitat no Twitter, felicitando Torrent.
A primeira reunião da Mesa do Parlamento, onde os independentistas têm quatro dos sete lugares, está marcada para as 11.30 (10.30 em Lisboa) de hoje. Na agenda deste órgão deverá estar a data da sessão de investidura do presidente do governo catalão – que tem que ocorrer até dez dias depois da eleição da Mesa, isto é, até dia 31 de janeiro. A partir daí, e caso falhe a eleição (a primeira votação por maioria absoluta, na segunda por maioria simples), começa um prazo de dois meses em que tem que haver investidura – caso contrário é preciso convocar novas eleições.
O acordo entre a ERC e o Junts per Catalunya, a lista que foi a mais votada do bloco independentista, prevê a indicação de Puigdemont como candidato à presidência da Generalitat. O problema é que este quer ser investido à distância, por videoconferência, mas os juristas do Parlamento catalão já disseram que tal não está previsto na lei. A decisão final cabe contudo à Mesa do Parlamento, liderada por Torrent. O primeiro-ministro espanhol, Mariano Rajoy, já disse que não o deixará ser investido e governar a partir de Bruxelas, planeando recorrer ao Tribunal Constitucional caso isso aconteça.
No seu discurso após ser eleito, Torrent reiterou que a sua prioridade é “restaurar em pleno as instituições catalãs”, defendendo “o fim imediato à intervenção” do governo de Madrid. Após a declaração unilateral de independência, a 27 de outubro, Rajoy acionou o artigo 155.º da Constituição espanhola, suspendendo a autonomia da Catalunha. Torrent diz que quer “recuperar a normalidade institucional necessária”, falando ainda assim de um “contexto complexo e anómalo” que a região enfrenta, com três deputados detidos e cinco no exílio “porque podem receber o mesmo tratamento se regressarem ao país”.
Torrent, de 38 anos, é o mais jovem presidente do Parlamento catalão. Licenciado em Ciência Política, está há duas décadas na ERC. Há dez anos que era presidente da câmara de Sarrià de Ter, na província de Girona. É o sucessor de Carme Forcadell, a braços com a justiça precisamente porque desde a liderança do Parlamento deixou avançar o referendo e a declaração unilateral de independência.
No seu discurso, nunca fez referência à “república da Catalunha”, para desagrado da Candidatura de Unidade Popular (CUP, radicais). Torrent foi eleito com 65 votos, num total de 70 independentistas – os três deputados presos, impedidos de estar pessoalmente pelo juiz, delegaram o voto (apesar das tentativas de o impedir por parte do Ciudadanos e do Partido Popular), mas os cinco exilados optaram por não o fazer. Nas cadeiras dos ausentes havia laços amarelos, que simbolizam o que consideram “presos políticos”. Como previsto, os oito deputados da Catalunya en Comú-Podem, que inclui o Podemos, abstiveram-se na votação.
O discurso mais duro do dia coube a Ernest Maragall, irmão do ex-presidente da Generalitat Pasqual Maragall, que por ser o deputado mais velho liderou os trabalhos. “O Estado não sabe ganhar, só sabe derrotar. Não sabe partilhar, só sabe impor e humilhar”, disse o ex-socialista e atual eleito pela ERC.