A Bela que mostrou Portugal ao monstro Hermès
Bela Silva assina um modelo do icónico lenço da marca francesa. No dia 2, inaugura a exposição em Lisboa. A artista fala sobre o universo que criou e em que se criou
MARIANA PEREIRA A artista portuguesa, atualmente a viver em Bruxelas, fez este La Maison des Oiseaux Parleurs para a Hermès, um lenço de 90X90 cm disponível em três cores. Avisou-os que bloqueia quando tem um tema e deram-lhe liberdade total love é artista.’ Mas mulheres e artistas é mais difícil”, afirma aquela que, depois de sair de Chicago – estudou no Art Institute – se mudou para Nova Iorque, onde fez ilustrações para o The NewYork Times “Não quis seguir a carreira de ilustradora, porque tens de ilustrar sempre o que te dão. Não tem a ver comigo”, justifica a artista que, aliás, avisou a Hermès que bloqueava quando tinha um tema, e por isso lhe foi dada liberdade para chegar até àqueles pássaros, àquela partitura, e às muitas formas que cada um decifrará. Ainda sobre a ilustração para o jornal, diz: “E depois também tens o political correct. Lembro-me de na altura ter feito um menino em cima de uns livros a desenhar e de eles dizerem que as nádegas estavam demasiado redondas, evidentes. É o que eles dizem: não é por eles, é que a América é muito grande, e depois eles recebem queixas.”
O seu ateliê e grande parte da sua vida estão agora em Bruxelas, onde gosta sobretudo “da parte das antiguidades”, dos museus e da centralidade geográfica, que lhe permite apanhar um comboio e chegar a Londres ou Paris. “Quando cheguei lá foi difícil: por causa do clima, dos teus amigos; tens saudades, mudas de novo para um outro país. As histórias de emigração nunca são fáceis, são sempre vidas de desassossego: acabas por ser estrangeiro lá e cá.” É em Bruxelas, portanto, que Bela, 52 anos, continua a trabalhar a cerâmica – tantas vezes em evocações marinhas, e daí que os belgas, conta, intuam que ela vem de ao pé do mar – sozinha, um trabalho de força de muitos anos que o corpo já acusa, e que ela por vezes descansa com o desenho. “O desenho é uma dança, eu danço”, conta, num sorriso.
Começou por fazer cerâmica na Faculdade de Belas-Artes. “Mas na altura, trabalhar com o barro era considerado craft e tinha uma conotação negativa, não eras artista. Eu é que sempre me estive nas tintas, sempre achei um material em que é possível fazer tanta coisa diferente. Ficávamos com uma conotação de artes decorativas, de que eu gosto muito, acho que dizem muito de um povo”, argumenta.
Bela Silva também está também, por exemplo, naqueles cadernos que fez para a loja A Vida Portuguesa, inspirados nos bonecos de barro de Barcelos e de Estremoz (hoje património da UNESCO), em desenhos de joias portuguesas do século XVIII e em padrões de chita; como está naquele carré da Hermès, já à venda em Portugal (360 euros); ou nisto que diz: “Se mexe comigo, se é a minha paixão, é o que eu faço… Caramba! Só vivemos uma vez.”