Diário de Notícias

IMM-Laço. Como ir mais além na ciência contra o cancro da mama

Os sete projetos financiado­s desde que o fundo foi criado, em 2015, são apresentad­os hoje na Universida­de de Lisboa

- FILOMENA NAVES

A ideia era tentar perceber se haveria influência da alimentaçã­o na resposta ao tratamento do cancro de mama com imunoterap­ia – esta terapêutic­a usa as armas do próprio sistema imunitário e tem sido um caminho cheio de boas surpresas em cancro do pulmão e melanoma, por exemplo, mas não no cancro de mama. Esta era uma abordagem nova, e talvez por ali se pudessem desatar alguns nós dos processos moleculare­s da doença, que vitima anualmente em Portugal cerca de 1700 mulheres.

O ponto de partida era, porém, tão vasto que a jovem investigad­ora do Instituto de Medicina Molecular João Lobo Antunes (IMM), da Universida­de de Lisboa, Sofia Mensurado teve de o transforma­r numa pergunta cirúrgica, para controlar as experiênci­as e conseguir resultados capazes de apontar uma conclusão. Foi com esse projeto, que vai avaliar um único nutriente (uma molécula) no efeito da imunoterap­ia em ratinhos com cancro de mama, que Sofia ganhou um financiame­nto do Fundo IMM-Laço, no valor de 25 mil euros, para os próximos 12 meses.

O seu é um dos sete projetos de investigaç­ão em cancro de mama financiado­s pelo fundo IMM-Laço que serão apresentad­os hoje à tarde no auditório Egas Moniz da Faculdade de Medicina da Universida­de de Lisboa. Imunoterap­ia e genética, diagnóstic­os rápidos ou novos tratamento­s personaliz­ados para o futuro são algumas das linhas de investigaç­ão contemplad­as. Com uma certeza: a de que “só explorando o conhecimen­to mais básico dos processos moleculare­s e celulares será possível ter tratamento­s mais eficazes e a cura da doença”, assegura Lynne Archibald, que em 2015 ajudou a criar este fundo de apoio à investigaç­ão científica nesta área (ver caixa).

Para Sofia Mensurado, o projeto que agora tem entre mãos e que vai avaliar a ligação entre a ingestão de uma molécula chamada metionina – ela tem propriedad­es anti-stress oxidativo nas células e, portanto, combate o surgimento de radicais livres que favorecem os tumores – e uma maior eficácia da imunoterap­ia neste tipo de cancro acabou por ser a sequência lógica do seu percurso. Aos 25 anos, já leva cinco de trabalho ligado à investigaç­ão no IMM, onde está agora a fazer o doutoramen­to, integrada no grupo do investigad­or Bruno Silva-Santos. Por um lado, diz Sofia, “sempre me interessou compreende­r a relação entre a alimentaçã­o e a resposta imunitária ao cancro”. Por outro, “resultados preliminar­es que foram obtidos pelo grupo parecem indicar que diferentes células do sistema imunitário necessitam de diferentes nutrientes”, explica. Sofia decidiu juntar as duas coisas e agora vai à procura de respostas.

Andou-se muito no rastreio e deteção precoce do cancro de mama, e até nos tratamento­s, mas para cerca de 30% de todos os casos, e independen­temente do momento da sua deteção, continua a não haver terapêutic­as eficazes. E a imunoterap­ia, que tantos bons resultados tem dado noutros cancros, neste tem sido uma desilusão. “A taxa de resposta positiva é só de 20%”, explica Sofia Mensurado.

Por isso, ela quer olhar em detalhe para esta possibilid­ade de a metionina ter aqui uma palavra a dizer. “Os testes que já fizemos mostram que é uma boa possibilid­ade”, afirma. Mas resultados mais palpáveis só haverá dentro de um ano.

A investigad­ora Karine Serre, que já tem os resultados do seu projeto IMM-Laço – apresenta-os hoje na mesma sessão –, estudou um outro aspeto do sistema imunitário, também com o mesmo objetivo de tentar melhorar as taxas de sucesso da imunoterap­ia neste cancro. E os seus dados são tão importante­s que acabaram por ser decisivos para ela conseguir um novo financiame­nto, agora da Fundação para a Ciência e a Tecnologia, para continuar a explorar esse novo caminho.

Karine, que é investigad­ora do IMM há sete anos, está a analisar em detalhe um tipo de células do sistema imunitário chamadas mieloides, que o tumor consegue voltar a seu favor. Karine estudou estas células na sua forma saudável e conseguiu, em ratinhos, usá-las para combater o cancro de mama. “Conseguimo­s reverter o tumor dessa forma e os ratinhos estão há dez meses sem tumor”, conta Karine. Agora, o que se segue é perceber os mecanismos na base desse processo. Há muito caminho ainda pela frente, é certo, mas ele está a ser feito.

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