Diário de Notícias

ÁLEX PINA AUTOR DE LA CASA DE PAPEL EXPLICA RAZÕES DO SUCESSO DA SÉRIE

A segunda parte da série – 7,5 horas repartidas por nove episódios – está disponível hoje. O autor, Álex Pina, falou com o DN

- LINA SANTOS

“La Casa de Papel não vive só de um plano magistral, mas das personagen­s e também de uma certa deceção em alguns países com o que se passa nos bancos. Foi o que aconteceu em Espanha, é o que se passa um pouco no Brasil, talvez em Portugal. O espectador conecta-se com esta sensibilid­ade que esconde a série”, afirma Álex Pina, autor e guionista da série, ao DN. A partir de hoje, a plataforma Netflix disponibil­iza a segunda parte.

O que faz de La Casa de Papel um formato com história para contar? “A premissa é muito boa.” Quem o diz é outra pessoa que todos os dias, à frente do computador, escreve frases que, espera, surtam suspense e emoção em quem as vê quando chegarem ao pequeno ecrã, António Barreira, argumentis­ta, autor de ficção em formato novela dos canais portuguese­s, e, ao mesmo tempo, espectador atento do que se passa dentro de La Casa de Moneda y Timbre, quartel-general da série. E a premissa é “ótima”, reforça, porque “o que é inicialmen­te um assalto acaba numa máquina de fazer dinheiro” e “tem twists [reviravolt­as] nos episódios que são magníficos”.

A história, vale a pena resumir, é a de um homem que reúne oito criminosos com pouco a perder, preparados durante cinco meses para executarem “o maior assalto da história”. É assim que se lhe referem os assaltante­s – Tóquio, a narradora da história, Berlim, Rio, Nairobi, Denver e Moscovo, Helsínquia e Oslo. Terem nomes de cidades faz parte do esquema: “Nada de nomes, nada de perguntas pessoais e, claro, nada de relações pessoais”, pede El Profesor no primeiro episódio. Torpedear as regras é o pasto de que se alimentam os episódios, como sabe quem chegou ao fim a entoar com as personagen­s a canção italiana Bella Ciao. “Viciante”, em suma, como diz Álex Pina .

Para quem não pode esperar mais, entremos nas questões práticas. Os episódios a que a Netflix chama de segunda temporada, mas que é, afinal, a segunda parte, e desenlace, de La Casa de Papel, devem ficar disponívei­s às 08.01, hora de Lisboa (00.01 em Los Angeles), que é, regra geral, a hora a que acontece, segundo a agência de comunicaçã­o que representa a plataforma em Portugal.

E quantos episódios vai ter? Essa pergunta, aparenteme­nte, tão simples, não tem resposta por parte da plataforma Netflix. Álex Pina ajuda a fazer as contas. “São nove.”

Quando estreou na estação de televisão espanhola Antena 3 em maio de 2017, La Casa de Papel tinha nove episódios. A segunda parte, emitida a partir de outubro, mais seis. Cada um com cerca de 70 minutos, tamanho habitual dos formatos que são exibidos no horário nobre espanhol. Ao Netflix chegaram 13 com cerca de 50 minutos, a mesma duração dos que aí vêm.

Para passar no Netflix foi preciso voltar à mesa de montagem. “Tem muitíssimo trabalho de análise de guião. Em alguns casos houve que voltar aos ‘brutos’ [imagens gravadas]”, explica. “A série é a mesma mas a experiênci­a visual não. Ver as duas pode ser interessan­te.” De Reservoir Dogs a Infiltrado La Casa de Papel (Money Heist, na tradução inglesa) recorda o filme Reservoir Dogs (Cães Danados), realizado por Quentin Tarantino, em 1992, mas outras referência­s emergem à medida que os episódios se desenrolam. Desde logo, Inflitrado (2006), uma longa-metragem de Spike Lee, com Clive Owen, Jodie Foster, Denzel Washington. “Sou um grande fã do género ‘assalto perfeito’”, aceita Álex Pina.

O argumentis­ta recua ao tempo em que La Casa de Papel nasceu. “Falava-se muito de bancos e surgiu esta ideia: não roubar nada, mas imprimir dinheiro, e ficar lá dentro dez dias até poder sair”, conta, ao telefone com o DN.

“A outra ideia foi transladar o género ‘assalto perfeito’ para a televisão e fazer personagen­s muito mais transversa­is e reais, que se fossem aprofundan­do ao longo dos episódios. Tratamos de colocar sempre o espectador em dúvida. Quem é bom? Quem é mau? Jogamos com a identidade. Fazemos que o espectador esteja sempre ativo.”

“Os castings foram muito complicado­s, demoraram muito tempo”, conta Álex Pina. “Uma personagem como Tóquio tinha de ser decidida mas também ser sentimenta­l. Berlim tinha de ser um misógino mas tinha de cair bem às pessoas, Denver, que era traficante, tinha de ser terno... Procurávam­os as duas dimensões”, explica.

Álex Pina é o autor de séries de êxito da televisão espanhola, como Los Hombres de Paco (2005-2010) e Os Serranos (2003-2004), que chegou a ser adquirida em Portugal e foi adaptada para o universo nacional por António Barreira. Nessa primeira década do século XXI, Espanha já fazia um grande investimen­to na ficção, segundo o guionista português, galardoado com um Emmy pela novela Meu Amor. “Tinham duas equipas de oito guionistas para a série. Eu entregava dois episódios por semana.” La Casa de Papel, diz, “é um pouco do que aqui mesmo ao lado se faz – séries fabulosas”. Recorda, de imediato, duas: Paquita Salas (2016) e

Velvet (2013-2016), ambientada nos anos 50.

O guionista espanhol tem as suas explicaçõe­s. “Estamos num momento em que já vimos muita ficção norte-americana e anglo-

“La Casa de Papel no Netflix permite uma leitura muito mais clara de como se consome televisão agora por oposição aos meios tradiciona­is”

ÁLEX PINA

AUTOR DA SÉRIE LA CASA DE PAPEL

-saxónica. Deram-nos momentos maravilhos­os e também clonaram muito. A ficção europeia e espanhola traz algo diferente”, defende Álex Pina, a propósito da exportação da sua série. “O espectador vê dez horas de ficção por semana, é um especialis­ta, e quer ver ficção diferente. Estamos a pedir muito mais qualidade”, resume o guionista, a trabalhar de novo com o ator Álvaro Morte, El Profesor na série.

Haverá lugar a continuaçã­o em La Casa de Papel? Se em algumas entrevista­s, Álex Pina abriu a porta a essa possibilid­ade, ao DN diz que “a bola não está no nosso telhado”. “Fica o espírito inconformi­sta e rebelde.” Para já, abundam as pontas soltas – a verdadeira história do Professor, a relação com Berlim, o que fará a refém Mónica, o que vai encontrar a inspetora Raquel? – que mantêm os espectador­es alerta.

Como será o fim? António Barreira arrisca uma ideia: “Faria que fossem apanhados pela polícia, mas, com a inteligênc­ia do professor e depois de este dominar a inspetora, os polícias verdadeiro­s seriam presos como ladrões e eles acabariam por escapar disfarçado­s de polícias, prontos a atacar novamente.” O desfecho de Álex Pina está a 7,5 horas de conhecer-se.

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Tóquio é a narradora da série La Casa de Papel. É, ao mesmo tempo, decidida e sentimenta­l, algo difícil de encontrar num casting, diz o autor Álex Pina
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