Diário de Notícias

Crise política?

- PAULO TAVARES

Há uma pergunta essencial nestes dias em que o país político e mediático decidiu voltar a falar de crise política: o que levaria PS,Bloco,PCP eVerdes a quebrar os acordos assinados em 2015, provocando uma crise política e eleições antecipada­s, a ano e meio do final da legislatur­a e com a economia e o país no estado em que estão? É óbvio que a grande maioria do capital político fruto dos bons resultados da economia e das finanças públicas será rentabiliz­ado, chegando as eleições, por António Costa e Mário Centeno, mas é igualmente óbvio que comunistas e bloquistas têm uma quota-parte generosa de ganhos de causa a apresentar aos seus eleitorado­s. Por outras palavras, à parte as costumeira­s encenações de divórcio, já uma tradição entre o abril do Programa de Estabilida­de e o outubro do Orçamento, o guião está suficiente­mente bem estudado por todos os parceiros para que nada de grave aconteça. Mais. Bloco, PCP e Verdes alinharam em novembro de 2015 com uma estratégia bem definida e traçada por Mário Centeno – a prioridade seria, como foi, o cumpriment­o dos compromiss­os europeus e o que sobrasse iria, como foi, para a reposição de rendimento­s e não para a retoma sem travões do investimen­to público ou para a requalific­ação dos serviços públicos. Que isso seja agora motivo de ameaças mais ou menos veladas à estabilida­de governativ­a é apenas sinal de que abriu a temporada da contestaçã­o e da luta pelas migalhas orçamentai­s que vão alimentand­o a lealdade da esquerda ao governo socialista. A época fecha a 15 de outubro e aposto que sem sobressalt­os de maior. Dito isto, o valor de que se tem falado – 0,4% do PIB, diferença entre os 1,1% de défice inscritos no OE em outubro e os 0,7% previstos no Programa de Estabilida­de, cerca de 800 milhões de euros – daria para umas quantas unidades de pediatria no São João ou para recuperar um número significat­ivo de escolas. A questão é saber se um país ainda com perto de 120% do PIB em dívida pública pode dar-se ao luxo de não a tentar abater sempre que puder. Só em juros, estes 800 milhões custam, mais cêntimo menos cêntimo, 24 milhões/ano e, já agora, dois milhões a cada mês.

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