Visita. Tolerância e direitos humanos deram o mote para as conversas com o presidente egípcio. E, claro, não faltaram muitas selfies Um “dia que valeu por dez”. Marcelo quer voltar para “colher resultados”
De branco vestidas, as Irmãs Combonianas esperavam pacientemente pela selfie com o Presidente da República, quando Marcelo Rebelo de Sousa as envolveu num abraço. “Nem lhe pergunto há quanto tempo está cá porque é há mais de 30 anos”, disse a uma delas, já grisalha. “É mais!”, respondeu-lhe a freira, que logo ouviu um “mais não... porque é muito novinha”. Tirada a selfie, Marcelo deixou um pedido: “Rezem por mim de vez em quando, que isto dá muito trabalho. Ser Presidente dá muito trabalho.”
O dia de ontem, passado no Cairo, até lhe deu razão: o Presidente arrancou a jornada com um encontro com o homólogo egípcio, passou, de raspão, pelo Parlamento e pelo primeiro-ministro, correu para chegar a tempo de encerrar o Fórum Económico com empresários portugueses e egípcios e fechou o dia a cantar o hino junto da comunidade portuguesa, pelo meio de um “efe-erre-á” entoado pelos estudantes egípcios e muitas selfies.
Entusiasmado com o “momento histórico” da relação entre Portugal e o Egito, Marcelo Rebelo de Sousa, por duas vezes, falou em regressar “daqui a um par de anos”, para conhecer os resultados que quis semear com estes três dias de visita de Estado.
O Presidente português fez hoje um apelo aos empresários portugueses e egípcios para que “não percam a oportunidade” de “investir já” em ambos os países e prometeu voltar ao Egito dentro de dois anos para ver os resultados.
“Um empate equivale a uma derrota”, avisou o Presidente, apelando aos cerca de duzentos empresários para que aproveitem “um novo ciclo”, em que o Egito pode provar que “afinal é pacífico e tem condições institucionais” para atrair investimentos, e Portugal “saiu-se muito bem, muito bem” do programa de intervenção externa. “Seria um grande erro falhar esta oportunidade”, salientou Marcelo, que, mais uma vez, se assumiu como “um otimista realista”, com “os pés no chão”.
Em frente a uma plateia de empresários dos dois países, o Presidente foi apresentado como “o professor Marcelo”, assim em português, e depois em inglês a referência ao “comentador que se dirigia às massas, todos os domingos”, “político workaholic que dorme quatro horas e devora dois livros por noite” e a quem o Egito, na impossibilidade de satisfazer “o apreciador de surf e praia”, convida o “amante de ópera” a voltar para assistir à Aida de Verdi, encenada à sombra das pirâmides. “Não vamos mudar a embaixada” Na Universidade de Al-Azhar, a pergunta nem sequer foi direta e pretendia apenas conhecer a posição do Presidente português perante a decisão dos Estados Unidos de transferir a embaixada para Jerusalém, mas Marcelo Rebelo de Sousa quis ser claro: “Tem de ser aceite um Estado Palestiniano com capital em Jerusalém. Tudo o que unilateralmente crie problemas é algo que Portugal não fará. Não mudaremos a nossa embaixada para Jerusalém”, garantiu, pelo meio de um forte aplauso da plateia de estudantes, professores e políticos.
Antes ainda, a sala tinha aplaudido também quando Marcelo defendeu que “o islão faz parte do espírito europeu”, discordando de “algumas lideranças europeias”. Em tom crítico e depois de questionado sobre o crescimento do autoproclamado Estado Islâmico, o Chefe do Estado português assumiu que “quem teve a culpa fomos nós”.“Quando culpam o Estado Islâmico, comecem por culpar-se a si próprios porque criaram condições para o Estado Islâmico existir.” Na leitura de Marcelo, “quando a sociedade não responde às necessidades das pessoas, na política não há vazios, alguém o preenche”.
O apelo à tolerância, ao combate pelos direitos humanos e para a capacidade que “cada cidadão tem de ser político” foi mais expressivo no debate na Universidade de Al-Azhar, mas já tinha sido vincado, ao almoço, ao lado do presidente egípcio, quando Marcelo Rebelo de Sousa lembrou de que cabe aos líderes valorizarem “os direitos das mulheres”, “a liberdade religiosa”, o “diálogo entre igrejas e religiões e diferentes ideologias e doutrinas”.
O Presidente falou, de improviso e em inglês, como fez em todos os eventos, excluindo o encontro com a comunidade portuguesa, mas AlSisi tinha um discurso escrito em que defendeu o reforço das relações comerciais e da troca de investimentos entre os dois países.
Com pompa e circunstância foram assinados dois acordos entre Portugal e o Egito: um memorando de cooperação entre a Agência para o Investimento e Comércio Externo de Portugal (AICEP), a Global Parques e o Porto de Sines com a Zona Económica do Canal do Suez e um acordo entre o Instituto Camões, a Universidade do Porto e a Universidade de Ain Shams para reforçar o ensino do português no Egito. Hoje acontece o momento mais fotográfico da visita: a comitiva visita as pirâmides de Gizé (Keops).
Aos europeus, Marcelo “vendeu” um Egito “seguro, aos egípcios “um Portugal de sucesso” Na visita à Universidade de Al-Azhar, o Presidente foi claro: “Tem de ser aceite um Estado Palestiniano com capital em Jerusalém”