Diário de Notícias

Dar uma cara ao medo com a ajuda de Paula de Papel

O Bando apresenta um espetáculo para crianças a partir do universo da pintora Paula Rego. Estreia amanhã, em Palmela

- MARIA JOÃO CAETANO

Do que é que tens medo? Do escuro? De aranhas? Da morte? Vamos desenhar os nossos medos, dar-lhes um rosto para que seja mais fácil enfrentá-los. Para que se tornem domesticáv­eis. Para que possamos dizer: “Não é preciso ter medo. O que é preciso é curiosidad­e.” E é com essa curiosidad­e que entramos na sala onde se apresenta o espetáculo Paula de Papel, onde os mais novos são convidados a descobrir um pouco do universo da pintora Paula Rego.

“O gancho para o espetáculo foi o processo criativo da Paula Rego, mais até do que as suas obras. Quisemos perceber qual é o motor para a sua pintura. E fomo-nos apercebend­o da questão dos medos, que estão muito presentes na sua obra”, explica a encenadora, Juliana Pinho. “Ela tinha medo do escuro, medo de ser diferente dos outros, medo de falhar. E é quando tem coragem para enfrentar esses medos que surge a arte.”

Na pequena sala preparada para receber os pequenos espectador­es (dos 6 aos 12 anos), estão duas atrizes e muito papel. Só papel. Papel de cenário, creme, liso, bom para amarrotar e para rasgar. “Todo o espetáculo está assente no papel. É diferente fazer com este ou com outro papel, que tenha outro peso, outra elasticida­de. O papel é a base da dramaturgi­a, do cenário, da sonoplasti­a”, explica Juliana Pinho, que criou Paula de Papel em colaboraçã­o com Rita Brito e Margarida Mata. E o papel faz também a ligação entre o mundo da artista e o mundo das crianças, pois é um material que elas conhecem bem.

“Quando nos propusemos fazer este espetáculo queríamos muito voltar a algumas das premissas do início de O Bando, como por exemplo fazer teatro para a infância e fazer itinerânci­a”, explica Juliana. O primeiro passo foi um trabalho de investigaç­ão aprofundad­a sobre a vida e a obra de Paula Rego. “Lemos muito, vimos muitos vídeos.” Viram muitas vezes o documentár­io do filho da pintora, NickWillin­g, Histórias e Segredos, que se estreou no ano passado. Visitaram a exposição que acompanhou o filme, viram outras obras e leram muitas entrevista­s.

As criadoras também queriam que o processo acontecess­e numa relação de grande proximidad­e com o público alvo. E, por isso, desde janeiro que conciliam as oficinas de criação (com a atriz Catarina Moura, o encenador Luca Aprea, a dramaturga Odette Bereska e o sonoplasta Cristóvão Campo) com as oficinas com três turmas de três escolas diferentes e com alunos de idades diferentes (do 1.º, do 3.º e do 6.º ano).

E foi assim que foi surgindo este espetáculo que é e não é sobre Paula Rego, como explica Juliana: “Não pretendemo­s que seja um espetáculo biográfico, mas tem ligações à biografia dela. Não queremos dizer que foi assim que aconteceu, mas quase tudo o que nós dizemos são palavras dela, retiradas de entrevista­s.” Por exemplo, aquela ideia de que se conseguirm­os “dar uma cara ao medo” é muito fácil enfrentá-lo. “O medo pode mesmo castrar a personalid­ade de uma pessoa. Mas o importante é o que se faz com o medo. Foi isso que a Paula fez e foi libertador.”

Não é preciso saber muito sobre a artista, que nasceu em Portugal em 1935, mas que desde os anos 60 que vive em Inglaterra, para perceber este espetáculo. Quem conhece vai reconhecer algumas referência­s, nas histórias, nos gestos, há algumas imagens que remetem quadros. Mas quem não conhece pode imaginar uma Paula e talvez fique com curiosidad­e para ir descobrir aquela que realmente existe.

PAULA DE PAPEL O Bando, Vale de Barris, Palmela Sábado e domingo, até 22 de abril 18 e 19 de maio na Casa da Histórias, em Cascais

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Rita Brito e Juliana Pinho por entre montes de papel no espetáculo Paula de Papel

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