O melhor gelado português leva alfarroba, amêndoa, figo e avelã
Festival. Manuela Carabina conquistou, na Batalha, um lugar na final europeia. Graças ao crescimento do turismo, o mercado dos gelados está em franca expansão por todo o país
Gelado de morango, baunilha ou chocolate? Agora é alfarroba, amêndoa, figo e avelã. Chama-se “gelado mediterrânico” e foi o mais apreciado pelo júri do Festival do Gelado, ontem à tarde, na Exposalão (Batalha). O melhor gelado nasceu das mãos de Manuela Carabina, da geladaria Fragoleto, onde há seis anos a chef vai experimentando todos os dias surpreender os clientes. De resto, foi um deles, algarvio de gema, que um dia lhe sugeriu aquela possibilidade. “Eu nunca tinha provado alfarroba e achava um pouco estranho, mas agradou-me a ideia de juntar os melhores sabores do Mediterrâneo num único gelado. Então o senhor trouxe-me um saco de alfarrobas, lá da terra, para que pudesse experimentar”, contou Manuela, depois de ser anunciada como vencedora do festival.
A transbordar de alegria, ligou de imediato para a equipa da Fragoleto, em Lisboa: “Ganhámos!” Agora vai preparar-se para desempenhar “esta grande responsabilidade que é representar Portugal num concurso europeu”. Na verdade, o festival realizado ontem no decorrer de mais uma edição da Tecnipão – feira profissional de máquinas, equipamentos e matérias-primas para a panificação, pastelaria, confeitaria, chocolataria e geladaria – é apenas uma das etapas do Grande Prémio do Gelado, que se desenrola em diferentes momentos, ao longo de três anos.
Agora que venceu em Portugal, Manuela representará num evento agendado para Bolonha, em Itália, onde está sediada a Carpigiani, marca que equipa a esmagadora maioria das geladarias em Portugal, responsável pela organização do evento. De resto, é lá que funciona a universidade que forma todos os chefs, nomeadamente aqueles que ontem estavam a concurso, e que contaram com o apoio do professor Luciano Ferrari.
Entretanto, os finalistas dessa segunda etapa irão disputar a final do Gelato Festival World Master, em 2021. Antes, ainda, em 2019, também a Arábia Saudita vai receber a competição do resto do mundo, apurando aí aqueles que se juntam aos finalistas europeus. “É a democratização do gelado por toda a Europa e por todo o mundo”, disse ao DN Fábio Zucchini, um dos responsáveis da Carpigiani, que ontem também esteve presente no Festival do Gelado. É ele o primeiro a desmistificar a ideia antiga de que o gelado bom só existia em Itália.
Crescimento exponencial
Lembra que muitos geladeiros italianos partiram para diversos países da Europa nos últimos anos, e Portugal foi um dos destinos mais escolhidos. Com o crescimento exponencial do turismo e a consequente procura dos gelados, o mercado expandiu-se de forma impressionante nos últimos anos. E não se pense que estamos só a falar de Lisboa.
Ontem, na Batalha, o festival contou com a participação de chefs vindos de Cascais, Tavira, Póvoa de Varzim, Porto, Sagres, Alhandra, Alcobaça e Leiria. Foi desta última cidade que veio um outro vencedor, na categoria para chef com menos de 30 anos: Rui Sousa, das Pastelarias Brisanorte. O júri – composto pelos chefs Nelson Félix e Filipe Manhita, da Escola de Hotelaria e Turismo do Estoril, Graça Calisto, da ACIP, e Silvino Galvão, do Centro de Formação Profissional para o Setor Alimentar – elegeu nessa categoria o gelado de biscoito e caramelo, concebido pelo jovem Rui Sousa. Além dele, havia apenas outro jovem chef a concurso: Nélson Dias, da Aldeia dos Sabores, também de Leiria. De arroz-doce ou sem açúcar Longe dos tempos do fruta-ou-chocolate, hoje os gelados podem ser de pastel de natal, ginja de Óbidos, arroz-doce ou vinho do porto. É assim pelo menos na Gelataria Portuguesa, de porta aberta junto ao Castelo de São Jorge, em Lisboa, e cujo chef, Pedro Ramos, foi um dos 15 que ontem à tarde disputaram o Festival do Gelado. Apresentou-se a concurso com uma criação de figo e noz, certo de que “não podia ser de outra maneira”. Afinal, interessava-lhe mostrar um pouco do que faz todos os dias na sua geladaria: “Promover a cultura e os produtos portugueses.” Pedro Ramos, 52 anos, começou esta aventura em 2013, aproveitando esse “advento da explosão do turismo”.
“Naquela altura não havia nenhuma geladaria naquela zona de Lisboa. Hoje temos umas 10 ou 15”, contou ao DN, depois de terminar a sua obra. “Isto no fundo é uma arte”, conclui. E é. Desta vez, não foi a mais apreciada, mas Pedro concebeu-a com o mesmo empenho. O mesmo aconteceu com Susana Branco, da Oficina do Gelado, com sede no Parque das Nações, em Lisboa. Dedicou-se a esta arte de fazer gelados artesanais há cinco anos, quando a crise a fez repensar a profissão de engenheira civil, formação de base. Susana, agora com 41 anos, foi para a universidade da Carpigiani e especializou-se nos gelados artesanais. O negócio tem vindo a crescer, permitindo-lhe ao mesmo tempo acompanhar de perto as três filhas.
No Festival do Gelado, a chef apresentou-se com um gelado de chocolate apimentado, com um dos ingredientes que mais gosta de utilizar: jindungo. Na loja do Parque das Nações já tem por hábito surpreender os clientes com essa iguaria no gelado, embora o mais apreciado lá seja um de chocolate preto com laranja, ou ainda o de caramelo com flor de sal, ou açaí com banana.
Longe dali, no Castelo de São Jorge, está no entanto a nascer uma outra inovação: o gelado sem açúcar. Pedro Ramos já comprou a máquina que em breve vai estar na Gelataria Portuguesa, mas por estes dias emprestou-a ao fornecedor, para que possa ser apreciada na Exposalão, até amanhã. “Será a primeira fórmula que não substitui o açúcar por outros ingredientes que aceleram a função renal.”