Diário de Notícias

Sindicalis­mo para quem não trabalha

- JOÃO PEDRO HENRIQUES JORNALISTA

Revejo-me aqui, em absoluto, num artigo publicado no DN em julho de 2017 por Maria de Lurdes Rodrigues (socióloga, ex-ministra da Educação do PS, atual reitora do ISCTE): “O mundo não seria melhor sem sindicatos. Pelo contrário. O mundo será melhor, mais plural, mais justo e mais livre com sindicatos fortes e mais bem implantado­s na sociedade civil.” Mas eis o problema: numa altura em que o emprego cresce deveria ser natural que os sindicatos também crescessem – e assim alargassem a sua influência. Mas, habituados a trabalhar exclusivam­ente para os seus sócios, os sindicatos deixaram genericame­nte (há sempre exceções, claro) de trabalhar para, por exemplo, os desemprega­dos ou os precários. Se há coisa que explica o facto de, cada vez mais, as greves gerais só terem efeito em serviços do Estado (transporte­s, sobretudo) é o facto de os sindicatos mais fortes quase só representa­rem trabalhado­res com vínculos sólidos (e é no Estado que esses trabalhado­res estão, não no setor privado). O sindicalis­mo nacional representa acima de tudo quem, podendo ter problemas crescentes de perda de poder de compra, consegue apesar de tudo não ir parar ao desemprego porque tem um contrato para a vida. E os outros, os desemprega­dos, que estão acima de tudo representa­dos no setor privado, já intuíram há muito que os sindicatos não os representa­m. E quando voltam ao mercado de trabalho, claro, não querem ter nada a ver com sindicatos, porque não têm nada para lhes agradecer. Podia portanto o mundo sindical aproveitar o 1.º de Maio para ver como é que pode servir quem não é sindicaliz­ado. Porque o mundo do trabalho não é só o mundo dos trabalhado­res – é também o mundo dos que, querendo trabalhar, não o conseguem, ou só o conseguem em condições de miserável precarieda­de.

 ??  ??

Newspapers in Portuguese

Newspapers from Portugal