Zuckerberg: tensão e desculpas no Parlamento Europeu
Fundador do Facebook voltou a lamentar aproveitamentos de terceiros e deixou respostas para mais tarde, por escrito
“Nos últimos anos não fizemos o suficiente para evitar que as ferramentas que construímos fossem usadas de forma errada”
MARK ZUCKERBERG
FUNDADOR DO FACEBOOK “As poucas respostas foram dececionantes. É incrível que, de todas as empresas, o Facebook não tenha abertura sobre o assunto”
UDO BULLMANN
LÍDER DOS SOCIALISTAS “Talvez nem sequer controle a sua empresa. Teve de se desculpar 15 vezes numa década, três delas neste ano, e estamos apenas em maio”
GUY VERHOFSTADT
LÍDER DOS LIBERAIS
Mark Zuckerberg aceitou ontem a proposta do presidente do Parlamento Europeu para que “durante a próxima semana” possa enviar “por escrito” as respostas às questões dos eurodeputados. A audição – na véspera da entrada em vigor do novo regulamento europeu sobre a proteção de dados pessoais – terminou muito depois da hora prevista, mas revelou-se curta para responder a todas as questões dos eurodeputados, que procuravam explicações sobre o uso indevido de dados de 87 milhões de utilizadores do Facebook (2,7 milhões dos quais de cidadãos europeus).
A pergunta do líder dos Liberais, Guy Verhofstadt, pode ter sido a mais ácida, quando interrogou o fundador do Facebook sobre se este “tem algum controlo da empresa”, tendo em conta o número de vezes que teve de vir a público desculpar-se, desde que arrancou com a rede social.
“Creio que, no total, pediu desculpas umas 15 ou 16 vezes. Todos os anos, o Mark tem uma ou outra transgressão ou problema com o Facebook. Você tem de encarar a realidade”, provocou o eurodeputado, dizendo que não basta “pedir desculpa”, mas também “dizer que vai corrigir”. “No ano passado creio que pediu desculpa duas vezes e neste ano já são três, e ainda só estamos em maio”, ironizou, deixando a questão sobre se Zuckerberg “é capaz de corrigir” os problemas.
Outras questões ficaram por responder, nomeadamente sobre a existência de um monopólio e de outras matérias de âmbito da concorrência. Durante os 28 minutos que durou a segunda intervenção, na qual improvisou, Zuckerberg repetiu as ideias que já tinha apresentado num discurso que trouxe previamente escrito e que, por ironia, também tinha sido alvo de fugas, neste caso para a imprensa.
Nesse discurso, o fundador do Facebook elogiou a Europa, os europeus e os valores que o continente exporta e exportou ao longo da história para o mundo, para depois apresentar um pedido de desculpas, considerando que “se tornou claro, nos últimos dois anos”, que o Facebook “não fez o suficiente para evitar que estes instrumentos tam- bém fossem utilizados de forma perigosa”.
“Isso conduziu às notícias falsas, à interferência estrangeira em eleições e aos casos de programadores que utilizam indevidamente as informações das pessoas”, lamentou, numa referência ao escândalo da Cambridge Analytica. “Não tivemos uma visão alargada das nossas responsabilidades. Isso foi um erro e eu peço desculpa por isso”, assumiu, prometendo que a partir de agora “dará início a um processo de mudança, que levará tempo”.
“Mas estou comprometido em fazer tudo corretamente – e em fazer os investimentos importantes e necessários para manter as pessoas em segurança.” Como exemplo, Zuckerberg anunciou a duplicação do número de pessoas para trabalhar na segurança da rede social. Por escrito? “Yeah!” Mark Zuckerberg, de fato escuro, longe da imagem do rapaz que aparecia em público de chinelos e meias brancas, foi recebido no gabinete do presidente do Parlamento Europeu, Antonio Tajani, antes da audição.
Os deputados fizeram as suas considerações e perguntas, tendo concluído a dez minutos da hora prevista. O fundador do Facebook respondeu de modo seletivo, reiterando a sua “preocupação” dado o risco de “intervenção externa” nas eleições europeias do próximo ano, que prometeu contrariar.
Comparando com a audição no Congresso norte-americano, fica a impressão de que Zuckerberg teve menos controlo sobre as declarações que fez no Parlamento Europeu. Já passava da hora e, uma vez por outra, Zuckerberg lançava um olhar para Tajani, parecendo buscar aprovação, por exemplo, quando prometeu reagir aos discursos de ódio e à apologia do terrorismo, da mesma forma que fazia “no dormitório do campus universitário”, quando ele e os seus companheiros se dedicavam a “apagar comentários impróprios”.
Mas o presidente do Parlamento Europeu desviava o olhar, socorrendo-se do telemóvel, e a audição prolongava-se, já com Zuckerberg a fazer referências à hora adiantada. “Por mim continuamos”, disse a certa altura Tajani, advertindo os deputados de que havia, no entanto, “um avião para apanhar”. O líder do Facebook já estava visivelmente contrariado, durante uma troca de palavras em que Verhofstadt sugere o pedido para que as questões sejam respondidas por escrito.
“Concorda, senhor Zuckerberg, em escrever as respostas, nos próximos dias, questão a questão? É possível?”, questionou então Tajani. A resposta, sussurrada, “yeah!”, compromete o fundador do Facebook a justificar-se por escrito perante a câmara europeia.