“O edifício está a fazer o seu papel ao tornar-se invisível”
Peter Chermayeff regressou ao Oceanário de Lisboa, o seu sexto grande projeto do género, vinte anos após a sua inauguração. Aos 82, o arquiteto americano continua a pensar num e no outro lado do aquário
Aconversa foi permanentemente acompanhada pela visita dos animais que se iam aproximando do vidro. E o arquiteto ainda se maravilha com eles. “Ainda não vi a manta”, comentava no início. Como é que a atual situação periclitante dos oceanos interage com o seu trabalho? O propósito dos aquários é a capacidade de criar uma ligação emocional com as pessoas. Alguns dizem que se trata de aprender. Eu digo que começa pela emoção. Seja uma criança ou um adulto, se achar aquilo misteriosamente comovente ou poderoso, emociona-se, lembra-se daquilo e regressa aqui. E talvez isto o faça ler um livro, ou ver um programa de televisão e ter uma vontade de compreender a vida para lá de si mesmo. E então começa a preocupar-se? Sim. As coisas mudam. E quando toda uma geração sente o impacto dessa experiência, então temos a possibilidade daquilo a que podemos chamar uma ética do ambiente. Se estes edifícios puderem encorajá-la, estão a marcar a diferença, a contribuir para o planeta. Porque se não cuidarmos do planeta estamos todos feitos. Não sou daqueles que acreditam na arquitetura por si mesma. É muito entusiasmante que o meu nicho especializado encontre um grande público ao longo dos anos. Então não se importa que o seu edifício se torne invisível? Não, ele está a fazer o seu trabalho ao tornar-se invisível. O oceano continua fascinante? Esse sentimento é intemporal. Sempre que venho aqui vejo coisas que me deixam muito contente por termos feito o Oceanário. O grande biólogo Edward Wilson, uma grande figura na minha vida, falava de biofilia: dizia que a raça humana tem amor à vida, somos atraídos a outras formas de vida, como as traças à luz do alpendre. Consegue entender porquê? Acho que tem que ver com as nossas raízes mais profundas. Sabe que me disseram que o animal mais procurado agora é a medusa? Comovem-se com a complexidade do seu mistério, como é que algo vivo pode ser tão leve, gelatinoso, belo nos seus movimentos. Muitas pessoas ficam hipnotizadas, como se tivessem lido o seu primeiro poema. Quem vai a museus de arte tende a ser uma elite mais educada. Os aquários para mim sempre foram um lugar de mistura de todos os membros da raça humana: ricos, pobres, velhos, novos, com ou sem educação. Em Chattanooga há um grande contraste entre ricos e pobres, mas no aquário eles misturam-se; perdem essa consciência de divisão quando estão perante uma tartaruga. M.P.