Tecnologias médicas: pagar segundo o resultado clínico
Atransformação (urgente) do setor da saúde passa também por uma transformação dos modelos de negócio. O mercado dos dispositivos e tecnologias médicas poderá ajudar nesta transformação com modelos de negócio em que os preços são ajustados aos resultados clínicos em oposição aos tradicionais modelos de fornecimento simples. Trata-se de uma estratégia verdadeiramente de partilha de risco das empresas de tecnologia médica com os seus clientes, o que, tratando-se de saúde, torna-se, de facto, inovador.
Esta estratégia segue o conceito já conhecido do Value Base Health Care, preconizado por Michael Porter, para intermediar os que prestam cuidados de saú- de e os que os pagam. A novidade, neste caso das tecnologias médicas, prende-se ao facto de o contrato ser entre o fornecedor de tecnologias de saúde e o prestador de cuidados de saúde.
Embora já existam alguns contratos deste tipo em Portugal, esta abordagem tem sido complexa pois altera a lógica dos atuais concursos públicos, a grande fatia do mercado hospitalar que corresponde aos hospitais públicos.
Na verdade, haverá mais razões para que seja mais morosa esta mudança nos modelos de negócio em Portugal. A necessidade de registar e medir os resultados clínicos consiste num processo que, em muitos casos, precisa de ser implementado. O problema de os departamentos médicos não medirem os seus resultados permanece não apenas por poder constituir um acréscimo de trabalho, mas porque em Portugal não existe uma cultura de partilha e exposição dos resultados do nosso trabalho ou atividade.
Mas existe já algum trabalho na área de gestão clínica nos hospitais públicos, onde é feito algum benchmarking. Esta prática de comparação permite uma orientação estratégica de melhoria na atividade clínica, focando a atenção nos pontos onde um departamento apresenta indicadores abaixo da média. Este espírito de melhoria de resultados poderá ser útil no futuro para haver contratos como os que a indústria dos dispositivos médicos propõe. Há que apostar na parceria com os hospitais de forma a preparar esse futuro, ajudando a instalar processos de medição de resultados clínicos como bases de dados, avaliação retrospetiva quando os dados não estão organizados ou melhorias nos fluxos de doentes de forma a facilitar essa medição.
Mas este processo não é assim tão simples como pode parecer. A principal questão é decidir sobre o que se deve medir. O objetivo que o departamento clínico quer alcançar deve ser mensurável e haver uma ligação direta à tecnologia contratada ou a contratar. Por outro lado, os resultados a medir deverão ter objetivos, focados em procedimentos clínicos onde existe já uma experiência comprovada por parte do corpo clínico. A experiência tem sido começar por áreas mais maduras, como os implantes cardíacos, ou áreas com poucas variáveis, em que os resultados clínicos sejam mais objetivos, como tecnologias que possam reduzir a infeção ou o reinternamento hospitalar.
Estes modelos de negócio, baseados no valor, são muito ajustáveis ao funcionamento dos dispositivos e tecnologias médicas pois a indústria cria soluções de engenharia com objetivos terapêuticos claramente definidos, em oposição a outros produtos de saúde onde os resultados são um pouco mais difíceis de medir e prever.
A grande barreira que existe na entrada de tecnologias inovadoras é o preço. Uma empresa investe num novo dispositivo, melhor do que os existentes, e espera ser recompensada com um preço mais alto, que suporte a investigação e desenvolvimento. No entanto, na maior parte dos casos, não existe qualquer medição objetiva do valor que essa nova tecnologia está a criar.
Embora esta estratégia tenha sido pensada para se negociar com os prestadores de cuidados de saúde, como os hospitais, também poderão ser envolvidos os pagadores de saúde, ou seja, os subsistemas e as seguradoras de saúde.
O objetivo que o departamento clínico quer alcançar deve ser mensurável e haver uma ligação direta à tecnologia contratada ou a contratar