Diário de Notícias

Tecnologia­s médicas: pagar segundo o resultado clínico

- LUÍS LOPES PEREIRA DIRETOR-GERAL DA MEDTRONIC PORTUGAL

Atransform­ação (urgente) do setor da saúde passa também por uma transforma­ção dos modelos de negócio. O mercado dos dispositiv­os e tecnologia­s médicas poderá ajudar nesta transforma­ção com modelos de negócio em que os preços são ajustados aos resultados clínicos em oposição aos tradiciona­is modelos de fornecimen­to simples. Trata-se de uma estratégia verdadeira­mente de partilha de risco das empresas de tecnologia médica com os seus clientes, o que, tratando-se de saúde, torna-se, de facto, inovador.

Esta estratégia segue o conceito já conhecido do Value Base Health Care, preconizad­o por Michael Porter, para intermedia­r os que prestam cuidados de saú- de e os que os pagam. A novidade, neste caso das tecnologia­s médicas, prende-se ao facto de o contrato ser entre o fornecedor de tecnologia­s de saúde e o prestador de cuidados de saúde.

Embora já existam alguns contratos deste tipo em Portugal, esta abordagem tem sido complexa pois altera a lógica dos atuais concursos públicos, a grande fatia do mercado hospitalar que correspond­e aos hospitais públicos.

Na verdade, haverá mais razões para que seja mais morosa esta mudança nos modelos de negócio em Portugal. A necessidad­e de registar e medir os resultados clínicos consiste num processo que, em muitos casos, precisa de ser implementa­do. O problema de os departamen­tos médicos não medirem os seus resultados permanece não apenas por poder constituir um acréscimo de trabalho, mas porque em Portugal não existe uma cultura de partilha e exposição dos resultados do nosso trabalho ou atividade.

Mas existe já algum trabalho na área de gestão clínica nos hospitais públicos, onde é feito algum benchmarki­ng. Esta prática de comparação permite uma orientação estratégic­a de melhoria na atividade clínica, focando a atenção nos pontos onde um departamen­to apresenta indicadore­s abaixo da média. Este espírito de melhoria de resultados poderá ser útil no futuro para haver contratos como os que a indústria dos dispositiv­os médicos propõe. Há que apostar na parceria com os hospitais de forma a preparar esse futuro, ajudando a instalar processos de medição de resultados clínicos como bases de dados, avaliação retrospeti­va quando os dados não estão organizado­s ou melhorias nos fluxos de doentes de forma a facilitar essa medição.

Mas este processo não é assim tão simples como pode parecer. A principal questão é decidir sobre o que se deve medir. O objetivo que o departamen­to clínico quer alcançar deve ser mensurável e haver uma ligação direta à tecnologia contratada ou a contratar. Por outro lado, os resultados a medir deverão ter objetivos, focados em procedimen­tos clínicos onde existe já uma experiênci­a comprovada por parte do corpo clínico. A experiênci­a tem sido começar por áreas mais maduras, como os implantes cardíacos, ou áreas com poucas variáveis, em que os resultados clínicos sejam mais objetivos, como tecnologia­s que possam reduzir a infeção ou o reinternam­ento hospitalar.

Estes modelos de negócio, baseados no valor, são muito ajustáveis ao funcioname­nto dos dispositiv­os e tecnologia­s médicas pois a indústria cria soluções de engenharia com objetivos terapêutic­os claramente definidos, em oposição a outros produtos de saúde onde os resultados são um pouco mais difíceis de medir e prever.

A grande barreira que existe na entrada de tecnologia­s inovadoras é o preço. Uma empresa investe num novo dispositiv­o, melhor do que os existentes, e espera ser recompensa­da com um preço mais alto, que suporte a investigaç­ão e desenvolvi­mento. No entanto, na maior parte dos casos, não existe qualquer medição objetiva do valor que essa nova tecnologia está a criar.

Embora esta estratégia tenha sido pensada para se negociar com os prestadore­s de cuidados de saúde, como os hospitais, também poderão ser envolvidos os pagadores de saúde, ou seja, os subsistema­s e as seguradora­s de saúde.

O objetivo que o departamen­to clínico quer alcançar deve ser mensurável e haver uma ligação direta à tecnologia contratada ou a contratar

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