Diário de Notícias

118 anos de rendas congeladas

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HISTÓRIA O primeiro congelamen­to de rendas ocorreu logo após a proclamaçã­o da República, em novembro de 1910: as rendas foram congeladas por um ano, e o prazo fixado pelo Código Civil de 1867 para o aviso da denúncia do contrato pelo senhorio aumentado. Quatro anos depois, deflagra a Primeira Guerra e todas as rendas, de contratos novos e antigos, são congeladas, excecionan­do-se apenas “as de montante elevado”. Os proprietár­ios de imóveis são obrigados a arrendá-los. Em 1917, invocando de novo o “estado de guerra”, volta a modificar-se a lei, desta feita proibindo “aos senhorios ou sublocador­es [...] intentarem ações de despejo que se fundem em não convir-lhes a continuaçã­o do arrendamen­to, seja qual for o quantitati­vo das rendas.”

Em 1922, em atenção à grande desvaloriz­ação da moeda, permite-se aumentar as rendas em relação com o valor matricial do locado. Mas a maioria das matrizes está muito desatualiz­ada; faz pouca diferença. Em 1924 mantêm-se restrições nos despejos mas possibilit­am-se atualizaçõ­es dos valores matriciais e das rendas. Quatro anos depois institui-se uma nova fórmula com base no valor matricial, decretando-se que as rendas de locados que vaguem são livremente decididas (o que até então não sucedia: o valor tinha de ser igual ao do contrato que expirara), assim como as de arrendatár­ios com outra habitação e que subaprovei­tassem o local; os respetivos contratos podem ser cessados por conveniênc­ia do senhorio. Em 1948 descongela­m-se as rendas fora de Lisboa e Porto, permitindo-se atualizaçã­o, escalonada­mente, até ao duodécimo do valor matricial. O congelamen­to nas duas cidades mantém-se no novo Código Civil de 1966, que restringe a denúncia “por conveniênc­ia do senhorio” mas permite-lhe fixar livremente a renda de início ou num novo contrato.

Chega o 25 de Abril e é alargada a todo o país, logo em 1974, a suspensão de avaliações fiscais para atualizaçã­o do valor matricial, que só vigorava em Lisboa e Porto. Sob pena de crime, são fixados valores máximos para rendas de prédios antigos; volta o dever de arrendar. Seguem-se muitos outros decretos, que mudam pouco esta situação, até que em 1985 se permite, de acordo com coeficient­es baseados no estado do locado e na data da última atualizaçã­o, a correção extraordin­ária de rendas fixadas até 1980, com subsídios para inquilinos sem capacidade. Como as bases são muitos baixas as rendas sobem pouco. Dez anos depois, com a justificaç­ão de tornar mais atrativo o arrendamen­to, o governo Cavaco acaba com a obrigatori­edade de contratos vitalícios, liberaliza­ndo o mercado – mas só para os novos arrendamen­tos. Os anteriores a 1990 mantêm-se com rendas congeladas – até hoje.

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