O pontapé-canhão que está disponível para ajudar o Sporting
Delfim foi campeão pelos leões, mas sofreu inúmeras lesões que lhe prejudicaram a carreira. O Marselha quis dá-lo como inválido, mas quase por milagre conseguiu voltar a jogar
ANDRÉ CRUZ MARTINS Era conhecido pelo “pontapé-canhão”, chegou a ser um jogador nuclear no Sporting, onde integrou o plantel que em 1999-2000 quebrou o jejum de 18 anos sem títulos, mas uma grave lesão na coluna vertebral ao serviço do Marselha afastou-o dos relvados dois anos e meio. Delfim esteve muito tempo desaparecido do mapa, até que no ano passado voltou a surgir no espaço mediático, quando integrou a lista às eleições do Sporting do candidato Pedro Madeira Rodrigues, no cargo de team manager.
“Infelizmente, hoje é possível concluir-se que a verdade estava do nosso lado. Tentámos alertar as pessoas para a gestão danosa de Bruno de Carvalho, mas não tivemos sucesso. A situação foi-se degradando e penso que qualquer pessoa no lugar do atual presidente, se estivesse no seu perfeito juízo, colocaria o lugar à disposição. Bruno de Carvalho chegou a uma situação em que é contestado por quase toda a gente, mas o seu egocentrismo impede-o de sair”, diz ao DN.
Delfim, de 41 anos, não coloca de parte a hipótese de voltar a integrar uma lista candidata ao clube leonino no caso de haver eleições a curto prazo. “O Sporting é o clube pelo qual nutro um sentimento especial, depois dos três anos muito intensos que lá passei e pela forma como fui tratado. Estou sempre disponível para ajudar o clube, mais ainda nesta fase de grande tristeza, em que vemos os sportinguistas profundamente divididos, especialmente depois daquele dia terrível das agressões em Alcochete, cuja motivação ainda tem de ser muito bem provada”, realça.
Foi aos 10 anos, no Amarante, que Delfim começou a jogar futebol. “Foi o primeiro ano que o clube teve o escalão de infantis e desse plantel também fazia parte o Nuno Gomes. Estávamos na II Divisão e logo na época de estreia subimos aos Nacionais”, revela, destacando o crescimento ao lado do antigo avançado: “Tive o privilégio de estar com o Nuno até aos meus 13 anos, altura em que ele foi para o Boavista. Juntei-me a ele no Bessa dois anos depois e umas temporadas mais tarde fomos campeões nacionais de juniores pela primeira vez na história do clube.” Depois, Nuno Gomes rumou ao Benfica em 1996 e Delfim ao Sporting um ano depois.
Na primeira das suas três épocas de leão ao peito jogou 32 desafios a titular e mais três como suplente utilizado. E no final da época foi agraciado com o Prémio Stromp. “Tinha chegado na sombra de jogadores como Dusher, Rui Jorge ou Quiroga, pois só tinha 21 anos e nem era indiscutível no Boavista. No entanto, fruto do meu trabalho, fui uma aposta firme do treinador Mirko Jovic”, sublinha, só lamentando o quarto lugar no campeonato, que justifica com questões extrafutebol, “pois foi evidente que o Sporting foi espoliado devido a erros de arbitragem” – foi a época em que os leões fizeram luto pela arbitragem nacional.
A temporada seguinte foi diametralmente oposta, com o Sporting a conseguir o tão desejado título de campeão nacional, 18 anos depois: “Começámos sob o comando de Materazzi, com uma pré-época extremamente exigente fisicamente da qual o treinador italiano não conseguiu tirar dividendos. Depois chegou o Inácio, que aproveitou esse bom trabalho inicial e revelou grande capacidade para gerir o plantel.”
Ironicamente, foi nessa época 1999-2000 que começou o calvário das lesões. “Logo na pré-temporada tive o meu primeiro problema no Delfim está desligado do futebol mas disponível para integrar um novo projeto no Sporting, clube onde foi campeão nacional joelho direito, ao qual fui operado três vezes no Sporting. Depois sofri uma forte rutura muscular na coxa direita. Na altura, fui vítima de um altíssimo grau de exigência e acelerava as recuperações, acabando depois por ter recaídas”, lamenta. O calvário no Marselha Mesmo lesionado, transferiu-se para o Marselha em 2001-02. “A minha cláusula de rescisão era de 14 milhões de dólares [cerca de 12,1 milhões de euros ao câmbio atual], mas devido ao meu estado clínico o negócio fez-se por apenas seis milhões de dólares [cerca de 5,2 milhões de euros]. Estive a recuperar nas primeiras semanas e voltei a jogar no fim de agosto”, lembra. Ao todo, cumpriu 21 jogos, mas o pior estava para vir. “No arranque da minha segunda temporada em Marselha tive um terrível problema nas costas e fiquei totalmente incapacitado, depois de ter sido manipulado de forma negligente pelo fisioterapeuta/osteopata do Marselha. Fiquei quase três anos sem jogar, sem a mínima culpa da minha parte e dei entrada com um processo contra o Marselha. Ainda aguardo a sua conclusão”, refere.
Delfim foi operado à coluna vertebral e o médico-cirurgião praticamente descartou o regresso aos relvados. “Disse-me que iria recuperar 90% como homem, mas que desportivamente só daria para jogar ténis com os amigos. A verdade é que consegui voltar a jogar, graças à competência do médico que me operou e do António Gaspar, o fisioterapeuta e, acima de tudo, grande amigo com quem estive 11 meses a recuperar. O Marselha quis que eu me desse como inválido, mas não aceitei e mostrei que ainda era um ativo valioso”, sublinha.
Voltou ao ativo no Moreirense, clube a que estava emprestado pelo Marselha, e na época seguinte regressou a França, realizando 21 jogos com uma nova direção e um novo treinador. O clube quis renovar-lhe o contrato, mas não aceitou. Depois de uma passagem fracassada pelos suíços doYoung Boys, esteve duas épocas na Naval e mais uma no Trofense, onde pendurou as botas aos 32 anos: “Não dava mais. Tinha o joelho direito permanentemente inflamado e quatro parafusos na coluna vertebral. Em março de 2009, fiz mais uma artoscopia ao joelho direito e decidi terminar a carreira, para não sofrer mais.”
Os que o viram jogar não esquecem a sua extrema correção e o fortíssimo pontapé. “Era uma qualidade que vinha desde os 10 anos, no Amarante, e os treinadores sempre me escolheram para marcar os livres”, diz, elegendo o melhor golo da carreira numa vitória do Sporting ao V. Guimarães, por 3-0, em 1998-99. “Nessa noite, o pontapé-canhão funcionou e a 40 metros da baliza!”, recorda, com saudade.