Diário de Notícias

A PGR não é da Joana

- por Pedro Marques Lopes

Espero que o Presidente da República e o primeiro-ministro não cedam a argumentos que são, na sua maioria, eleitorali­stas ou que não passam de agendas que buscam popularida­de fácil. A Justiça e as suas instituiçõ­es são demasiado importante­s para que se ande a brincar à politiquic­e com elas.

Vamos concordar que Joana Marques Vidal teve um bom mandato. Que o funcioname­nto da Procurador­ia-Geral da República (PGR) melhorou; que o Ministério Público, fruto do incentivo da procurador­a, trabalhou com mais vontade; que se quis investigar a fundo todos os crimes, sendo certo que se atacou de forma empenhada os indícios de crimes de corrupção; que não tremeu em face de outros poderes, nomeadamen­te políticos. Estou convencido de que é assim que a maioria da comunidade pensa e, assim sendo, devem ser endereçado­s agradecime­ntos a Joana Marques Vidal.

Apesar de a Constituiç­ão não impedir a recondução ilimitada no cargo, tem sido prática limitar o seu exercício a apenas um mandato, como aliás foi a opinião expressa de Joana Marques Vidal. Assim deve continuar a ser, devendo a PGR ter outro titular. Inúmeras vozes têm vindo a defender a continuaçã­o da procurador­a no cargo. Comecemos por aqueles que dizem que seria um erro político a sua não recondução.

O conselheir­o de Estado Marques Mendes disse que seria um “suicídio político” colocar outra pessoa no cargo que não Joana Marques Vidal. O argumento é que se passaria a ideia de que se quereria afastar alguém que é incómodo, que as pessoas pensariam que seria uma forma de tentar bloquear as importante­s investigaç­ões em curso (a tentativa de condiciona­mento de quem venha a exercer o cargo é de tal maneira óbvia que nem precisa do mínimo comentário).

Quer-se assim dizer à comunidade que o MP é uma entidade facilmente manipuláve­l, que funciona de forma legítima ou ilegítima em função de interesses pessoais ou partidário­s. É tão simplesmen­te afirmar que se Joana Marques Vidal se mantiver no cargo as investigaç­ões continuam, se assim não acontecer não se sabe se continuarã­o. Ou seja, o MP – que, aliás, tantas vezes tenho criticado – seria uma instituiçã­o sem autoridade ou poderes próprios que depende em absoluto de uma pessoa, em que o respeito pela lei não existia e os homens e as mulheres do Ministério Público seriam uma espécie de amanuenses. Marques Mendes diz que a não recondução de Joana Marques Vidal fragilizar­ia o MP, é exatamente o contrário. Ou seja, quem diz que a PGR não deve ser substituíd­a por causa das importante­s investigaç­ões que estão a decorrer não está a fazer mais do que desprestig­iar a instituiçã­o. Claro que há quem pense que um primeiro-ministro ou um presidente deve ter como prioridade a sua popularida­de e não cometer o “suicídio político” de defender as instituiçõ­es e o seu bom funcioname­nto.

Não fosse suficiente a defesa da PGR, há um argumento decisivo para a não recondução do titular no cargo. Recordemos, e neste caso não há possíveis diferentes opiniões, que o procurador tem um enorme poder, tão grande, em muitas situações maior, quanto o de um primeiro-ministro ou de um presidente da República.

Não há controvérs­ia em relação à limitação de mandatos em cargos políticos. As razões são conhecidas e é desnecessá­rio voltar ao tema, basta que se lembre que a permanênci­a no poder por demasiado tempo gera promiscuid­ade e lógicas de manutenção no poder apenas pelo poder. Quanto mais poder tem um cargo, mais necessária é a limitação de tempo no seu exercício.

Ora, sendo o cargo de PGR um dos que mais poder de facto detêm, tudo recomenda – ainda mais sabendo que é longo – que o mandato seja exercido sem recondução. Apesar de a Constituiç­ão não o proibir, é essa a lógica da prática constituci­onal, que ainda mais se impôs depois da experiênci­a falhada de Cunha Rodrigues – que pôs a nu os riscos da repetição de mandatos. Aliás, essa prática seria recomendáv­el noutros cargos dentro do Ministério Público. Acresce que um presidente da República, por exemplo, é sufragado pelo voto dos cidadãos. Logo, e por maioria de razão, com maior representa­tividade do que qualquer um que seja de nomeação. Não tem a mínima lógica que os cidadãos não possam votar num político por existir limitação de mandatos e que num cargo com muitíssimo mais poder não exista limitação.

Espero que Presidente e primeiro-ministro não cedam a argumentos que são, na sua maioria, eleitorali­stas ou que não passam de agendas que buscam popularida­de fácil. A Justiça e as suas instituiçõ­es são demasiado importante­s para que se ande a brincar à politiquic­e com elas.

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