Diário de Notícias

China e África, a maioridade

- por José Carlos Matias

Em 2000, o “mundo desenvolvi­do” parecia ter voltado as costas ao continente africano. Foi nesse contexto que a China – um velho amigo das lutas de libertação – iniciou um novo caminho, criando o Fórum de Cooperação China-África (FOCAC). Ao longo dos últimos 18 anos, foram realizadas seis conferênci­as ministeria­is do FOCAC, três cimeiras, as trocas comerciais aumentaram 17 vezes, os projetos de infraestru­turas financiado­s e construído­s pela China multiplica­ram-se, o investimen­to galopou, os programas de cooperação alargaram-se a todas as áreas possíveis e imaginária­s e dos oito Estados africanos que em 2000 tinham relações diplomátic­as com Taiwan resta apenas um.

Pequim tem reafirmado os eixos para este relacionam­ento: “A China não impõe a sua vontade aos outros, não interfere nos assuntos internos e promove benefícios partilhado­s, sempre numa dinâmica de jogo de soma positiva.” Obviamente que a realidade tem tonalidade­s bem mais complexas do que a narrativa oficial. Os interesses nem sempre são convergent­es e a presença súbita e significat­iva chinesa em alguns países africanos trouxe inquietude.

Nos últimos anos passou a ganhar forma e força um discurso bastante crítico que, tendo alguma base local, em África, é ecoado sobretudo nos EUA e na Europa: o envolvimen­to da China como porta para um “novo imperialis­mo ou colonialis­mo”, uma retórica, em certas vozes, plena de ironia histórica.

Os problemas salientado­s dizem respeito a “endividame­nto predatório”, “obtenção” em larga escala de terras, fraca qualidade da construção ou cumplicida­de com regimes pouco respeitado­res dos direitos humanos. Tendo estes fenómenos expressão real, são frequentem­ente alvo de exageros e distorções. O que sobressai é todo um outro lado que tem passado pelo papel crucial que a China desempenha de alavancage­m de economias que eram vistas como incapazes de crescer e sociedades que não seriam capazes de se desenvolve­r.

Vale a pena perguntar aos africanos o que pensam. Estudos do instituto norte-americano Pew Research Center em 11 países africanos indicam uma média de 67 por cento das pessoas com uma opinião favorável face à China.

Na altura da cimeira em Pequim, e numa altura em que o FOCAC atinge a maioridade, o caminho está à vista. Passa não somente pelos números de encher o olho, mas por um foco maior na qualidade, transparên­cia, sustentabi­lidade ambiental e uma relação cada vez mais entre iguais cujos frutos sejam recolhidos e vividos pelas populações. O século XXI será também o século da África. A China viu isso bem no dealbar do milénio. E não se enganou.

Diretor da Plataforma/Macau

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Presidente chinês, Xi Jinping, recebido por Guarda de Honra na visita que fez ao Senegal, em julho.

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