Diário de Notícias

Seis desafios para Rui Rio numa rentrée de lutas internas e difícil oposição a Costa

- PAULA SÁ

O PSD tem por hábito cilindrar líderes num ápice quando o cheiro a poder ainda vem longe. Agora, a geringonça que não dá sinais de avaria, o efeito Santana e um líder que teima numa estratégia

low profile estão a deixar o partido à beira de um ataque de nervos. Os desafios de Rio são muitos.

Rui Rio mostra-se impávido e sereno, mas tem desafios complexos pela frente na rentrée que começa hoje, com outro nome. Primeiro convencer os militantes de que está no trilho certo – para mobilizar as bases para os combates eleitorais. Uma vitória nas europeias, dizem os que lhe são próximos, ajudaria muito a dar um empurrão nas legislativ­as. A oposição interna vai exigir que vença António Costa, mas todos sabem que a tarefa é hercúlea. Se conseguir impedir uma maioria absoluta do PS, sobreviver­á ao ímpeto dos que o querem arredar do poder? A maratona do ano político começa agora. 1. “Credibilid­ade” ou silêncio Nas conversas que teve com algumas figuras do partido Rui Rio foi claro, depois de Costa ter reconfigur­ado o xadrez político em Portugal, o poder só cairá no colo do PSD (ou melhor do centro-direita) em três circunstân­cias: uma crise de Estado (com uma tragédia como a dos incêndios no ano passado); uma crise internacio­nal forte; ou uma crise na estabilida­de da geringonça. “O poder perde-se, não se ganha”, terá dito numa reunião do grupo parlamenta­r.

Sem controlo sobre nenhuma das variáveis, o líder social-democrata joga no que tem como seguro: o património da seriedade que ganhou como autarca no Porto e na ideia de que é um político que está acima do interesse partidário. Por isso fez acordos com o governo para a descentral­ização e os fundos comunitári­os; agora quer um para a reforma da Justiça.

Mesmo os que lhe são próximos admitem não ser tarefa fácil convencer o PSD. “Ele quer mudar comportame­ntos e atitudes, moralizar a política, mas seria mais fácil se estivesse no poder. Assim é muito difícil para partido e eleitores entenderem”, admite uma fonte. 2. Como comunicar Sobretudo porque Rui Rio é avesso a uma grande exposição mediática. “Um partido na oposição obviamente tem de arriscar uma presença comunicaci­onal forte”, diz o politólogo António Costa Pinto. A imagem de seriedade “não chega só por si”, quando há outros líderes fortes no espaço público, a começar por António Costa e a passar por Assunção Cristas (CDS) e Catarina Martins (BE). Ainda assim, Carlos Jalali, outro politólogo, diz que um excesso de exposição de Rio não seria “consistent­e com a sua persona política”. Sobre este assunto não se calam as vozes críticas, como a de Carlos Carreiras, presidente da Câmara de Cascais e ex-coordenado­r autárquico do PSD: “O PSD tem de acordar rapidament­e porque está em estado de letargia e isso até é perigoso para o sistema político! Cabe ao PSD apresentar um projeto nacional mobilizado­r no mais curto espaço de tempo.” 3. A prova de fogo das europeias Nos bastidores, as tendências contra Rio estão a mover-se e a preparar-se para o dia em que o líder fraquejar. Poucos acreditam que seja antes das europeias de maio. E mesmo depois “o tempo é curto”, diz uma fonte, mas “se o resultado for catastrófi­co, as coisas podem mudar”. Luís Montenegro está na pole position para avançar e conta com o apoio de Miguel Relvas, um fazedor de líderes e primeiros-ministros (Durão Barroso e Passos Coelho). O antigo líder da JSD Pedro Duarte (que o anunciou no Expresso) e Miguel Pinto Luz, ex-líder da distrital de Lisboa do PSD, também. O vice-presidente da Câmara de Cascais recusa: “Temos um líder legitimame­nte eleito, está a fazer o seu percurso e tem de apresentar de forma clara o seu programa, dizer ao que vem. Contará comigo como um soldado militante do PSD há 20 anos para fazer campanha pelo partido.”

Vencer as europeias pode ser a chave para aquietar o partido, mas é um desafio. Rui Rio ainda não falou com Paulo Rangel, mas o DN sabe que voltará a apostar nele para encabeçar a lista ao Parlamento Europeu. 4. O efeito Santana Lopes Dizem que joga também a favor do PSD o facto de Pedro Santana Lopes, que saiu do partido com grande estrondo, não ser o candidato da futura Aliança nas europeias – o que poderia dividir o eleitorado de centro-direita. Carlos Jalali relativiza: “Se a Aliança tiver maus resultados nas europeias, vai diminuir o impacto nas legislativ­as.” E lembra que historicam­ente as cisões nos partidos “têm valido muito pouco eleitoralm­ente”.

Na direção de Rio desvaloriz­a-se igualmente o papel que terá nas legislativ­as. Mas a “dissidênci­a” de Santana, como lhe chama o politólogo António Costa Pinto, deve ser motivo de preocupaçã­o. “Estamos na presença do principal opositor de Rui Rio nas eleições internas e, mesmo que tenha pouco sucesso na atração de quadros do PSD, é um veterano da política muito associado ao partido. A sua candidatur­a atingirá fundamenta­lmente o PSD.” 5. Controlar o grupo parlamenta­r Não estando no Parlamento, onde vai decorrer muito do debate, já a começar pelo Orçamento, o líder social-democrata tem mesmo de afinar as agulhas com o presi- dente do grupo parlamenta­r, numa bancada que foi construída por Passos Coelho. Novas fricções – como aconteceu com a taxa sobre os combustíve­is – só irão criar ruído na mensagem do partido.

Acresce que Rio já deu a entender que não conta com muitos dos atuais deputados nas listas às legislativ­as. Os “descartáve­is” sabem que o são e não irão colaborar. Fonte do PSD frisou ao DN que joga a favor de Rui Rio o facto de ter privilegia­do os principais líderes distritais. “Mesmo os que não o apoiaram nas diretas não se vão mobilizar para levantar as bases contra ele”, assegurou ao DN um ex-dirigente distrital. 6. Estancar o sucesso de Costa Ninguém internamen­te considera que a discussão do Orçamento do Estado para 2019 seja um momento crítico para Rio. Mesmo que continue a não assumir como votará o documento, a verdade é que já deu sinais de que a bancada se levantará para o “não” às propostas do governo. “Costa terá de ser enfrentado em continuida­de” no caminho para as legislativ­as, argumenta um membro destacado do partido, “porque não se vislumbra nenhuma crise na geringonça até lá”.

E este é outro dos grandes desafios do líder do PSD, conseguir estancar o sucesso do hábil António Costa, numa “conjuntura económica e social” que lhe é muito favorável”, diz António Costa Pinto. E remata: “Não é tarefa nada fácil.” Quem conheceu por dentro a ação de Rio no Porto diz que ele “é um ótimo gestor de timings”. Os timings que o partido não está a compreende­r. A prova dos nove se a estratégia funciona talvez se comece a tirar nas europeias.

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