Diário de Notícias

Brasil Do juiz ao general, passando pelo astronauta, conheça os primeiros ministros do presidente Bolsonaro.

O presidente eleito já confirmou cinco nomes, entre os quais o do magistrado estrela da Lava-Jato Sérgio Moro. E deve ter um criacionis­ta na Educação e um veterinári­o a mediar a relação com o Congresso. No Ambiente, não quer radicais.

- JOÃO ALMEIDA MOREIRA em São Paulo

Anomeação de Sérgio Moro para o governo do presidente eleito Jair Bolsonaro ofuscou todos os demais ministros confirmado­s, quase confirmado­s ou muito especulado­s ao longo dos últimos dias. Um grupo heterogéne­o que, além do juiz estrela da Operação Lava-Jato, inclui o mais liberal dos economista­s do Brasil, o primeiro sul-americano a voar pelo espaço, um veterinári­o veterano da política, um pastor evangélico vocalista de banda gospel e um punhado de generais.

Moro assume a pasta da Justiça – ou superpasta, porque inclui a Segurança Pública, a Polícia Federal e os órgãos de controlo de atividades financeira­s – e ganha, por inerência, o foro privilegia­do que lhe permite ser julgado apenas pelo Supremo.

A escolha, atacada pelo PT, que viu nela “a fraude do século”, por Moro ter condenado Lula da Silva, líder das sondagens ao longo de meses à frente de Bolsonaro, desautoriz­ado um juiz de instância superior que quis libertar o antigo presidente e soltado para a imprensa a delação do seu ministro das Finanças na última semana de campanha, foi elogiada pelos eleitores do ex-capitão do exército. Defendem que, ao chamar para perto de si o juiz que é o símbolo de combate à corrupção, Bolsonaro sinaliza o seu compromiss­o com a causa. Mas alertam para os perigos da decisão: “Nunca nomeies alguém que não possas demitir”, regra de ouro da política, foi repetida nos bastidores.

Outro “superminis­tro” é Paulo Guedes, guru económico de Bolsonaro e responsáve­l pela metamorfos­e do novo presidente de estatizant­e, à moda da ditadura militar, em liberal. Bolsonaro chama-lhe “o meu Posto Ipiranga”, numa alusão a um anúncio a uma marca de postos de combustíve­l cujo slogan é não importa o que precisar, “o melhor é perguntar lá no Posto Ipiranga”.

Formado na famosa Escola de Chicago, o berço dos economista­s ortodoxos ultraliber­ais, convenceu o presidente eleito de que seria a pessoa certa para assumir a gigantesca pasta da Economia, do Planeament­o, do Comércio e da Indústria num hotel na Barra da Tijuca, zona oeste do Rio de Janeiro, em reunião de quatro horas.

“Se privatizar tudo, a dívida passa a zero, se privatizar metade, a dívida passa a metade”, disse Guedes, em forma de mantra, numa entrevista ao site de direita O Antagonist­a.

Já confirmado no Ministério da Articulaçã­o Política, o novo ministro da Casa Civil será Onyx Lorenzoni, veterinári­o de profissão com muitos anos de Congresso. Ao ponto de ter lutado, e perdido, lado a lado com Bolsonaro, contra o estatuto que dificultav­a a compra de armas de fogo, decidida logo no início da era Lula. Juntos no poder, o Gauchão (Onyx) e o Cavalão ( Jair), como se chamam entre si, têm como prioridade revogar esse estatuto e tentar definir uma agenda parlamenta­r liberal na economia e conservado­ra nos costumes.

Também garantido por Bolsonaro, o general Augusto Heleno vai liderar a área da defesa. Defensor intransige­nte da máxima muito difundida pela direita brasileira – “direitos humanos só para humanos direitos” –, foi chefe da missão brasileira no Haiti e é amigo, e mentor, do novo presidente.

Não é o único general na lista. Ribeiro Souto deve ser confirmado como ministro da Educação. Defende “rever currículos e bibliograf­ias nas escolas”, entre outras coisas, “para expor a verdade sobre o regime de 1964” – Bolsonaro e Souto negam que tenha havido ditadura militar de 1964 a 1985 – e para retirar livros que “deixam as mães estupefact­as” – não especifico­u quais. Souto defende ainda que não se ensine apenas o darwinismo mas também o criacionis­mo.

O tenente-coronel Marcos Pontes, confirmado ministro da Ciência e da Tecnologia, é o primeiro astronauta brasileiro, sul-americano e lusófono. Participou na missão Soyuz TMA-8 à Estação Espacial Internacio­nal, ao lado de dois colegas, um russo e um americano, em 2006.

O general Oswaldo Ferreira deverá ser entretanto confirmado como ministro dos Transporte­s e Infraestru­tura. “Fui feliz da vida, construind­o estradas”, disse, lembrando o período na ditadura militar. “Naquele tempo não havia nem Ministério Público nem Ibama [instituto governamen­tal de apoio ao meio ambiente] para encher o saco”. Agências estatais ligadas a temas ambientais, acrescento­u, só servem para “foder a paciência”.

Não serão fundidos, ao contrário do que chegou a ser anunciado duas vezes e desmentido outras tantas, Agricultur­a e Ambiente, após pesadas críticas nacionais e internacio­nais de ambientali­stas e reparos até do setor agrícola, indefetíve­l de Bolsonaro. O presidente disse, porém, que quem vai escolher os dois ministros é ele. “E no ambiente não vai estar de certeza alguém por pressões de ONG nem com ideias xiitas sobre a área”.

Entretanto, o executivo deve ter espaço para aliados antigos de Bolsonaro, como Magno Malta, autor da oração difundida para o mundo logo após a eleição do presidente. Cinturão preto de jiu-jitsu, fã e amigo do ator Steven Seagal, vocalista da banda gospel Tempero do Mundo, Malta é contrário à “ideologia de género”.

Como perdeu a reeleição para o Senado no dia 7 – para Fabiano Contarato, um gay assumido, casado com um homem e pai adotivo de um rapaz – e acabou sem a vaga de vice ocupada pelo general Mourão, pode vir a ganhar o Ministério da Família.

Mourão é que não aprecia a influência do pastor sobre Bolsonaro. “Ele desistiu de ser vice porque disse que ia ganhar vaga de senador, como perdeu, agora tornou-se um elefante no meio da sala, um camelo, e tem de se arranjar um deserto para esse camelo.”

Outro íntimo de Bolsonaro, o deputado Alberto Fraga, autor de um criticado tweet, por reunir no mínimo quatro falsidades, logo após a execução da vereadora Marielle Franco – “engravidou aos 16 anos, ex-esposa do [traficante] Marcinho VP, usuária de maconha, eleita pelo [grupo criminoso] Comando Vermelho, exonerou recentemen­te seis funcionári­os mas quem a matou foi a polícia militar...” – foi falado para um ministério.

Mas como o tema gerou repercussã­o negativa, pois Fraga cumpre regime semiaberto de prisão por corrupção, tanto o presidente como o deputado negaram o convite.

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