Diário de Notícias

Carvalhal, o cool guy

- Nuno Fernandes

Carlos Carvalhal é aquilo a que os ingleses chamam cool guy, um tipo porreiro, que soube na sua etapa em Inglaterra perceber que só teria a perder se se armasse em José Mourinho e optasse por um estilo arrogante e de confronto. Em vez disso andou a oferecer pastéis de nata aos jornalista­s, deu conferênci­as de imprensa engraçadas, mas com conteúdo, e conquistou a simpatia de todos. Opinião pública incluída.

A BBC chegou a fazer um best of das suas melhores tiradas. Algumas foram aproveitad­as pelo marketing do Swansea para estampar camisolas e ganhou espaço mediático mesmo sendo um treinador português num clube como pouca expressão na Premier League.

Toda a gente se riu quando o técnico natural de Braga utilizou uma célebre expressão portuguesa e a traduziu para o inglês: “We put all the meat in the grill” (pusemos a carne toda no assador). Ou quando depois de o Swansea ter ganho ao Liverpool fez uma analogia com a fórmula 1: “O Liverpool é uma equipa de topo, um F1. Mas no meio do trânsito de Londres, às quatro da tarde, não anda.” Houve ainda referência­s a sardinhas e a cuidados intensivos de hospitais. Para tudo Carvalhal tentava arranjar uma resposta diferente, engraçada e que as pessoas entendesse­m.

Ser engraçado e cordial não chegou a Carvalhal, que no final da época acabou por deixar o Swansea, depois de não ter conseguido alcançar os objetivos, com a equipa a descer de divisão. Mas Inglaterra não se esqueceu de Carvalhal. E, mesmo sem estar no ativo, nesta semana deu uma entrevista ao The Guardian.

Uma entrevista com conteúdo, sem os habituais lugares-comuns e recordaçõe­s das suas passagens por clubes ingleses (Sheffield Wednesday primeiro e Swansea depois). Explicou, por exemplo, como um miúdo de 5 anos que é posto a estudar num conservató­rio da Gulbenkian acabou por se tornar futebolist­a. “Não era muito dado à música, mas cresci neste ambiente durante seis anos, rodeado por música clássica, artes e ballet. Mas havia lá um campo de futebol. Foi no conservató­rio que decidi ser futebolist­a”, contou ao The Guardian.

Ficámos também a saber que Carvalhal teve uma forte influência de Vítor Frade, o professor teórico e mentor de Mourinho, Villas-Boas, entre outros, quando frequentou a universida­de. “Para fazer a minha tese tive de estudar a teoria do caos, da complexida­de e as teorias do sistema. Quando a apresentei deram-me 19 valores. Só não tive 20 porque tinha alguns problemas com o português”, revelou.

A entrevista também entrou no campo da música. Carvalhal revelou que esteve em Vilar de Mouros em 1982 a ver os U2 e que o concerto de que mais gostou foram os Rolling Stones, em Alvalade. Para o treinador até existem semelhança­s entre uma banda de rock e uma equipa de futebol. “Tocam para entreter as pessoas, que precisam de uma catarse. Os concertos dão-lhes catarses, tal como o futebol. Por isso, não são coisas muito diferentes.”

Depois de uns meses em Portugal a acompanhar o pai, voltou recentemen­te para Londres. Muito provavelme­nte à espera de que o telefone toque para poder voltar a treinar e a falar de futebol de uma outra maneira.

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