Diário de Notícias

FIFA 19. Gonçalo joga quatro horas por dia, não faz mais nada e é o 11.º do mundo

- CARLOS FERRO

Aos 19 anos, Gonçalo “Raastatur” Pinto é o melhor atleta individual de FIFA em Portugal. O Sporting contratou-o, tornou-o profission­al e já é o 11.º de um ranking que apura 60 jogadores para o Mundial do próximo ano. Nos torneios internacio­nais os prémios são de milhares de euros.

Gonçalo “Rastaartur” Pinto tem 19 anos e um trabalho que na maioria das casas portuguesa­s dá direito a discussões entre pais e filhos: passar parte do dia a jogar PlayStatio­n. A explicação é simples: Rastaartur é profission­al de eSports. E não é um profission­al qualquer. Atualmente é o 11.º melhor jogador do mundo de FIFA 19, ou seja, faz parte da elite de praticante­s de jogos online na vertente de futebol. Representa o Sporting e é um ídolo para os jovens que seguem os jogos online . E são milhares aqueles que passam horas ao computador a ver como se ganha um jogo de futebol – seja na vertente de 1x1 ou na de 11x11 – ou quais as estratégia­s para se vencer noutro tipo de games.

É o mundo dos desportos eletrónico­s que tem milhões de adeptos que seguem em tempo real – no Facebook, no Twitter ou no Twitch – os resultados, os confrontos, as vitórias e as derrotas dos seus ídolos. É um mundo altamente profission­al no qual Portugal marca cada vez mais presença como prova o facto de neste sábado ter-se realizado na Altice Arena a Blast Pro Series, uma competição que envolveu diversos tipos de jogos e na qual a empresa dinamarque­sa RFRSH investiu 1,5 milhões de euros.

Neste ambiente onde o real e o virtual se cruzam, Gonçalo “Rastaartur” Pinto é um dos nomes de topo. O atleta – sim, são atletas – do Sporting tem como um dos seus objetivos, além das vitórias nos torneios que garantem prémios monetários, a participaç­ão no Mundial do próximo ano, competição em que só terão lugar os 60 melhores classifica­dos do ranking do FIFA 19.

Voltemos então ao sonho deste jovem de 19 anos que todos os dias joga “três ou quatro horas. Depende do estado de espírito. Se me apetecer jogar muito, jogo”. Para Gonçalo estar em frente a um ecrã com um comando de PlayStatio­n na mão é “um trabalho como outro qualquer, mas claro que não deixa de ser um jogo”.

Além de fazer parte do plantel do clube – “estou pelo primeiro ano no Sporting, que me deu todas as condições para ser 100% profission­al” –, Gonçalo representa Portugal e a agremiação de Alvalade em competiçõe­s internacio­nais.

Vinte mil euros num ano Gonçalo diz que não se sente “uma estrela”, mas reconhece que há muitos jovens que lhe dizem “que gostavam de conquistar o que já conquistei. Não é difícil, mas requer muito trabalho, muito treino, dedicação e esforço. Mas ainda estamos numa dimensão diferente da do futebol”.

A dedicação ao jogo – “que não considero um vício”, frisa – levou-o a deixar de estudar depois de frequentar o primeiro ano da universida­de. “Fiz o primeiro ano de Ciências da Comunicaçã­o, mas neste ano parei pois o Sporting deu-me condições para ser profission­al”, ou seja, paga-lhe um salário a que Rastaartur junta os prémios que vai ganhando durante a época pois todos os torneios têm verbas monetárias para os primeiros classifica­dos. Por exemplo, no ano passado, já ao serviço do clube de Alvalade, amealhou cerca de 20 mil euros.

A grande aposta são, todavia, os torneios internacio­nais, pois é aqui que se consegue os prémios, que permitem ter “uma vida estável a nível pessoal e profission­al”, conta.

Com uma carreira de três anos, Gonçalo via os jogos no computador por streaming, depois começou a praticar e quando a Federação Portuguesa de Futebol surgiu a apostar na modalidade foi o primeiro vencedor num 1x1. Foi na época passada, ainda como individual, que ganhou dez mil euros numa competição que terminou na Altice Arena (Lisboa) e com quatro mil pessoas a assistir às várias demonstraç­ões de eSports que ali tiveram lugar.

Agora, participa em torneios onde está ao lado de alguns dos seus ídolos. “Sempre segui o Agge Rosenmeier e no fim de semana [durante o torneio em Bucareste] encontrei-me com ele e ganhei-lhe nos penáltis. Foi muito interessan­te. E depois há o Gorilla [Spencer ‘Gorilla’ Ealing], que para mim é um dos melhores jogadores de sempre do FIFA. Foi a vê-lo jogar que evolui o meu jogo. Foi muito especial estar ao pé deles naquele fim de semana.”

E como é usar a camisola do Sporting: “Obviamente que pesa.”

Divulgar a marca e ganhar a geração Z As vitórias de Rastaartur – um cognome que não tem nenhuma explicação, garante: “Toda a gen-

te pergunta isso, mas calhou, não foi por nada de especial.” – são parte de uma estratégia onde a divulgação da marca Sporting é o ponto central. “A aposta nos eSports, no nosso caso desde julho de 2016, pode ter retorno através de merchandis­ing, prémios, transmissõ­es e eventos”, explica ao DN Miguel Albuquerqu­e, diretor-geral das modalidade­s do clube.

A opção pela entrada no mundo do eSports também tem como objetivo conquistar adeptos entre a chamada “geração Z [como são conhecidas as pessoas nascidas entre 1995 e 2005]. Neste caso, o retorno não é tão direto e acontece a longo prazo, mas necessário nos dias de hoje, uma vez que está comprovado que as gerações mais novas estão a afastar-se do futebol/desporto e que, mesmo que estejam presentes num estádio de futebol, não conseguem estar 90 minutos a assistir à partida sem a distração de um jogo de telemóvel, etc. Ora, consideram­os que a aposta nos eSports nos ajudará também a fidelizar ainda mais este público-alvo”.

Grow uP. Os craques do 11x11 Se Gonçalo Pinto é o mais conceituad­o jogador de FIFA no 1x1, a equipa que mais palmarés tem é a Grow uP, vencedora das taças da Liga e de Portugal na época passada, sempre com o Sporting, com quem também jogaram no playoff do campeonato.

Já com uma filial em Macau, este clube de eSports tem vários departamen­tos de jogos, e o FIFA é um deles. Rui Costa é o treinador de um plantel com 31 elementos – “temos uma equipa B também que joga na terceira divisão” – que treinam, cada um em sua casa, cinco vezes por semana. A presença só é obrigatóri­a em quatro.

“No nosso caso treinamos duas horas a duas horas e meia por noite. Temos de ter tudo afinado”, explica o responsáve­l pela estratégia da Grow uP. Jogar em equipa obriga a que cada jogador saiba a sua posição no campo – é exatamente igual ao futebol de 11, com um jogador para o guarda-redes, outro para o central etc. – e o treino faz-se com todos conectados entre si.

O jogo tem 16/17 minutos no total (90 virtuais) e obriga a uma preparação profission­al. “Fazemos um trabalho real de pesquisa do adversário, temos observador­es das outras equipas e os jogadores quando entram em campo sabem bem o que têm de fazer”, frisa Rui Costa. Profission­ais ainda não são – “só o Gouvy [Gouveia], o nosso jogador de 1x1” – mas acredita que se está a caminhar nesse sentido também em Portugal. Para já o clube paga as licenças do FIFA, ajuda nas deslocaçõe­s quando têm de ir torneio, o que acontece por norma nas fases finais, pois as qualificaç­ões são jogadas online cada um no seu computador em casa. “Temos um contrato por objetivos e recebemos prémios de acordo com as vitórias nas competiçõe­s que depois reinvestim­os no plantel”, adianta o responsáve­l por uma equipa “de amigos” cujo jogador mais novo tem 18 anos e o mais velho 38.

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A equipa Grow uP, que na época passada conquistou a Taça da Liga e a Taça de Portugal no dia em que foi à Cidade do Futebol receber o troféu.

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