Diário de Notícias

“Não se deve ter uma perspetiva lucrativa da exploração do negócio da TAP”

O secretário-geral adjunto do PS afirma que a TAP pode não ter lucros já que o principal é servir “o interesse estratégic­o do Estado”. Sobre o Plano de Estabiliza­ção aprovado pelo Governo deixa um aviso: “Não pode falhar.”

- JOÃO PEDRO HENRIQUES

Após as últimas eleições legislativ­as, José Luís Carneiro, 48 anos, foi convidado por António Costa para substituir Ana Catarina Mendes no cargo de secretário-geral adjunto do PS. É assim, desde outubro de 2019, o chefe operaciona­l máximo da máquina organizati­va do PS. Licenciado em Relações Internacio­nais e natural de Baião, foi presidente da respetiva câmara municipal de 2005 a 2017. Passou também pelo Parlamento como deputado e no Governo da geringonça foi secretário de Estado das Comunidade­s. Entrevista­do pelo DN, percorre o essencial da atualidade política nacional: Centeno – de quem já fala no passado –, presidenci­ais, a TAP, o que o PS espera do PSD no Orçamento suplementa­r e até das suas ambições pessoais. “No momento” não pensa em ser candidato ao Porto. Se dependesse dele, Costa seria recandidat­o em 2023 a um terceiro mandato como primeiro-ministro.

Não era dispensáve­l todo este folhetim à volta de Mário Centeno?

Teria sido dispensáve­l se a oposição tivesse querido criar uma linha comunicaci­onal a partir desse assunto. O assunto não deveria ter merecido o relevo que a oposição lhe deu.

Centeno é um ministro popular. É difícil substituí-lo? Fragiliza o Governo?

Como o primeiro-ministro disse, há dinâmicas de natureza política e dinâmicas de natureza pessoal. Sobre as questões pessoais só os próprios podem responder. Sobre dinâmicas políticas e de Governo, é o primeiro-ministro que responde por elas. Centeno tem sido um ministro das Finanças que deu um contributo – e tem dado um contributo – muito relevante não só ao país como a nível europeu, no Eurogrupo. Os resultados alcançados são do ministro das Finanças mas não deixam de ser do primeiro-ministro. Num exercício orçamental, o primeiro-ministro é o primeiro e mais importante responsáve­l tanto pela elaboração das propostas como pelos resultados da execução desse orçamento. O mais importante a fazer é cuidar de garantir que os eixos essenciais da política económica e social serão reiniciado­s no período pós-crise. Essa garantia só pode estar numa personalid­ade: a do primeiro-ministro.

Presidenci­ais. Carlos César, presidente do PS, já disse que o partido não deveria apoiar ninguém, como fez em 2016. Qual a sua opinião pessoal?

“Os parceiros que aprovaram os orçamentos da anterior legislatur­a continuam a ser os parceiros preferenci­ais do PS.”

Haverá um momento oportuno para que o PS possa apreciar nos seus órgãos os méritos e os deméritos dos candidatos, conhecer os seus pontos de vista sobre o país, ponderar as opções e decidir. Mas essa fase ainda não chegou. É prematuro condiciona­r o debate à partida. Como secretário-geral adjunto do PS, tenho o dever de dar o meu contributo para que o assunto eleições presidenci­ais seja discutido no PS em sede própria. E no PS tem sido discutido na Comissão Política – só por erro histórico se pode falar do congresso do PS como o local onde se discutem as eleições presidenci­ais. Em regra, tem sido na Comissão Política.

Haverá um momento apropriado para que essa discussão se faça e aí cada um de nós poderá dizer o que pensa – e é quando pretendo fazê-lo.

Orçamento suplementa­r. O PSD já indicou que é possível abster-se. Portanto, esse Orçamento está aprovado. É um sinal de que o sistema está a encaminhar-se para o centro? É um sinal do fim definitivo da geringonça?

O Orçamento suplementa­r será instrument­al para cumprir o Plano de Estabiliza­ção Económica e Social (PEES). A crise económica e social aprofundar-se-á nos próximos meses. Mas há um esforço que está a ser feito para suster os efeitos desta crise até que o país retome o cresciment­o, através do PEES. E depois haverá um plano de recuperaçã­o. Estimamos que a partir da primavera de 2021 o país comece a recuperar. Os parceiros políticos que aprovaram os orçamentos da anterior legislatur­a e desta continuam a ser os parceiros preferenci­ais do PS: o PCP, o BE, o PEV e o PAN e também a deputada única Joacine Katar Moreira. Contudo, dadas as circunstân­cias pelas quais está a passar o país, todos os contributo­s são essenciais. Na elaboração da resposta, recolheu os melhores contributo­s das forças políticas e sociais e demonstrou abertura para a sua concretiza­ção. Isto faz que partidos como o PSD se sintam também obrigados a viabilizar esse orçamento instrument­al e o PEES, na medida em que correspond­e a contributo­s que fizeram chegar.

Mas o que espera do PSD?

O PSD, pela voz de Joaquim Sarmento [o “ministro das Finanças” de Rui Rio], teve uma afirmação que nos causou estranheza. Foi a de que o mercado laboral português é demasiado rígido e dual [entre privado e público]. Se essas palavras nos causaram surpresa, porque tinha vindo a ocorrer um alinhament­o ao centro do PSD, verificamo­s que na apresentaç­ão do programa económico do PSD se propunha uma estrutura de resposta à crise como a do tempo da troika. É muito importante que o PSD esclareça o que quer dizer. Se o PSD pretende adotar opções de políticas austeritár­ias, naturalmen­te que isso significa uma clivagem que se aprofundar­á. São questões que carecem de esclarecim­ento, vamos aguardar.

O Conselho de Ministros aprovou o Plano de Estabiliza­ção Económica e Social. Ouvimos falar do banco de fomento há alguns anos e agora volta. Desta vez não se pode mesmo falhar? É um teste importante ao ministro da Economia?

O projeto é de tal modo relevante que não pode falhar. Sabemos bem que um dos graves problemas das pequenas e médias empresas para empreender­em está na garantia de acesso ao crédito em condições que lhes permita ter liquidez e uma conta-corrente para trabalhare­m no médio prazo. O compromiss­o do primeiro-ministro com a estabiliza­ção e a recuperaçã­o da economia e a competênci­a dos ministros da Economia e das Finanças são garantias essenciais.

O regime de lay-off ficou, no mínimo, confuso... Receia uma burocratiz­ação do sistema que provoque perda de eficácia?

A decisão política é o mais relevante: prolongar o regime simplifica­do para as circunstân­cias justificad­as e promover o regresso à regularida­de laboral em todas as outras circunstân­cias. Os custos são repartidos entre o Estado e as empresas e com uma garantia: a proteção dos trabalhado­res. No plano administra­tivo, tudo deve ser feito para simplifica­r os procedimen­tos.

TAP. À transporta­dora aérea exige-se serviço público – que não esqueça o Porto, por exemplo – e ao mesmo tempo rentabilid­ade. Como se concilia serviço público com rentabilid­ade?

A TAP deve dar garantias de unidade nacional – dentro do continente mas também com as regiões. Deve ser um fator de ligação de Portugal com a sua diáspora. Deve ser um fator de coesão nacional – e o turismo tem sido um fator vital de desenvolvi­mento do país. E deve ser também um fator de inserção do país nas rotas aéreas interconti­nentais. A TAP é uma companhia de bandeira e que está ao serviço do interesse estratégic­o do Estado.

O país deve aceitar a ideia de que a TAP não tem, necessaria­mente, de ser rentável?

Isso significa que os investidor­es privados têm de alinhar as suas opções estratégic­as com as opções estratégic­as do Estado.

Mas são os contribuin­tes quem paga...

E, como disse o primeiro-ministro, isso vai ter consequênc­ias na governação da empresa. A companhia é instrument­al na afirmação estratégic­a do Estado. O facto de sermos periférico­s no contexto europeu acrescenta-lhe essa importânci­a estratégic­a. Por causa disso, dificilmen­te teremos uma companhia aérea atraente para o investimen­to estrangeir­o para a tornar viável, no plano das opções estritamen­te de natureza privada.

Mesmo que não seja uma empresa rentável, que dê lucro?

Nem sempre o investimen­to público tem em vista o lucro. A função estratégic­a da TAP é uma função estratégic­a nacional, pelo que não se deve ter uma expectativ­a ou uma perspetiva lucrativa da exploração do negócio da TAP.

Sente-se preparado para ser candidato à Câmara do Porto em 2021?

Estas atuais funções são a maior honra que me foi confiada desde que desempenho funções políticas. Não estou de olhos postos neste momento noutros objetivos.

Incentivar­á o primeiro-ministro a recandidat­ar-se a um terceiro mandato?

O atual primeiro-ministro apresentou-se, em 2015, com um plano para a década. Os portuguese­s têm vindo a reconhecer que possui uma visão estratégic­a para o país. Esse reconhecim­ento e a confiança no primeiro-ministro reforçaram-se na gestão e na liderança da resposta à crise. No meu entender, o seu projeto para o país e o seu prestígio na Europa habilitam-no à execução de uma visão reformista para Portugal para além de 2023. Se essa for a sua vontade, contará com todo o meu apoio. E há um compromiss­o para a década que vai para além de 2023.

“Se o PSD pretende [na resposta à crise] adotar opções de políticas austeritár­ias, naturalmen­te que isso significa uma clivagem que se aprofundar­á.”

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