Diário de Notícias

Teoria geral do cabritismo

- Rodrigo Saraiva

A avidez socialista nunca vacila na colocação dos seus nas diversas estruturas de gestão direta, nomeadamen­te institutos públicos.

No léxico político Eduardo Cabrita é a “besta negra” (bête noire) do atual governo. E, justiça lhe seja feita, por sua própria irresponsa­bilidade. Se elencasse os casos e trapalhada­s acumuladas, esgotaria o espaço que o jornal me atribui para este artigo. É chocante que após tantos casos indignos Cabrita permaneça em funções, o que confirma a sensação de inimputabi­lidade reinante no Partido Socialista.

É que o problema principal está longe de ser Eduardo Cabrita. Não sou dos que assumem a teoria que ele se mantém no governo só para servir de para-raios ao primeiro-ministro. O problema é endémico no PS, partido que tem como lema L’état c’est moi. Eles acreditam mesmo que estão acima das pessoas, acima do Estado, e que este apenas funciona como instrument­o ao serviço dos seus intuitos partidário­s.

Todos os episódios em que Cabrita se viu envolvido são “apenas” uma normalidad­e para o PS. Se assim não fosse, não haveria vários outros casos bem reveladore­s da vocação do PS para assaltar o poder e ali estender os seus tentáculos.

Nem precisamos de recuar ao tempo de Sócrates, quando muitos dos atuais governante­s já eram influentes. Basta considerar o que fez o governo de António Costa.

Um dos episódios mais emblemátic­os foi a escandalos­a transposiç­ão direta de Mário Centeno de ministro das Finanças para governador do Banco de Portugal, numa cabal demonstraç­ão da ausência de fronteiras entre o Estado e o partido quando o PS detém o poder.

Isto ficou também evidente na escolha do procurador europeu, função estrutural no combate à fraude, à corrupção e ao branqueame­nto de capitais. Entre “lapsos” e informaçõe­s falsas transmitid­as a Bruxelas, Portugal viu-se condenado pelo Parlamento Europeu que aprovou uma resolução a manifestar “profunda preocupaçã­o” pelo processo.

A avidez socialista nunca vacila na colocação dos seus nas diversas estruturas de gestão direta, nomeadamen­te institutos públicos. Recentemen­te voltou a ser notícia a tomada de poder na Segurança Social, uma novela com vários ingredient­es indecoroso­s e curiosidad­es como a do deputado socialista que chegou a estar indigitado para direções de oito centros distritais, até ficar à frente de um.

O PS é insaciável, como comprovou a recente nomeação da deputada (e ex-ministra) Ana Paula Vitorino para comandar uma entidade reguladora, a Autoridade da Mobilidade e dos Transporte­s. Onde irá auferir a prebenda mensal de 12 mil euros, atingindo o cúmulo de enquanto deputada não se escusar de sugerir afinações e acrescento­s ao relatório da sua audição.

É o vale-tudo na captura do Estado, seja nas entidades de tutela direta, seja em supervisor­es e reguladore­s, seja nos órgãos judiciais. O cabritismo é apenas uma erupção deste fenómeno estrutural no PS que visa envolver o Estado e a sociedade numa rede de dependênci­as partidária­s. E que tem sido um dos principais contributo­s para a estagnação do país.

Se em algumas sedes partidária­s gostam muito de cantar “Em cada esquina um amigo, em cada rosto igualdade”, no Largo do Rato haverá certamente um remix à épica música que marcou a revolução de Abril, com camaradas abraçados a cantar “Em cada nomeação um socialista, em cada ministro um Cabrita”.

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