Atlantismo
Não faltam excelentes livros sobre as relações entre Portugal e os Estados Unidos. Relembro aqui, entre os relativamente recentes, História das Relações Portugal – EUA (1776-2015), de Tiago Moreira de Sá, pela mestria da síntese, do mesmo autor o esclarecedor Os Americanos na Revolução Portuguesa e ainda, na mesma linha, Kennedy-Salazar: A Crise de Uma Aliança. As Relações Luso-Americanas entre 1961 e 1963, de Luís Nuno Rodrigues.
Mas não posso deixar de referir, nas minhas leituras, toda uma extensíssima obra – entre ensaios, livros crónicas e muito mais – de Onésimo Almeida, que ao longo das décadas tanto tem feito para dar a conhecer Portugal aos americanos e a América aos portugueses. Por entre uma visita guiada a Brown, que saiu como reportagem no DN e depois incluída no livro Na América do Tio Silva (edição DN/FLAD), o académico luso-americano ajudou-me a perceber como a relação entre os dois países vai muito além do vinho Madeira a celebrar a Declaração de Independência americana, do reconhecimento precoce por D. Maria I, da amizade do Abade Correia da Serra com Thomas Jefferson, da cedência da base das Lajes ou da cofundação da NATO. Falou-me, claro, dos nossos emigrantes, apresentando-me Manuel Pedroso, na época quase centenário já, na sua mercearia em Providence, mas também Daniel da Ponte, então senador estadual de Rhode Island. Alertando-me igualmente para os muitos americanos que partem à descoberta de Portugal, até para estudar (recordes sucessivos até à chegada da pandemia, segundo a Comissão Fulbright), das relações entre empresas dos dois lados do Atlântico, etc., etc. Não por acaso, em entrevista ao DN há um ano, a então Encarregada de Negócios em Lisboa, Kristin Kane, afirmava que “hoje a relação entre Portugal e os EUA vai muito além dos livros de História, além das Lajes”.
A invasão em curso da Ucrânia pela Rússia e o choque que gera entre o Ocidente e Moscovo abriu, sem dúvida, um novo capítulo nas velhas relações entre Portugal e os Estados Unidos. A tradicional vocação atlantista portuguesa veio ao de cima como costuma acontecer nas grandes crises. Entre aliados sólidos e potenciais parceiros a escolha por vezes tem de ser feita sem hesitações. E na situação atual, é muito aquilo que contribui para reforçar a aliança luso-americana, desde o recuperar de valor estratégico pelos Açores até ao significado do porto de Sines, quando o GNL americano se assume como alternativa geopolítica ao gás russo.
Hoje, no auditório da FLAD em Lisboa, na presença de vários políticos americanos de origem portuguesa, acredito que se vai perceber com mais nitidez esta fase de relacionamento bilateral, até porque entre os oradores estão a nova embaixadora americana, Randi Charno Levine, e o também novo ministro dos Negócios Estrangeiros português, João Gomes Cravinho. Tenho a certeza de um aspeto dos discursos: a defesa do valor enorme do atlantismo por ambos.