O regresso dos candidatos do PSD “federador” e aberto às tendências
Rui Rio amarrou o partido ao centro e não teve sucesso eleitoral. Deixou margem para os partidos à direita, IL e Chega, se afirmarem. Os dois candidatos à sua sucessão querem que o PSD volte a abrir as portas a todas as tendências.
Rui Rio foi obstinadamente defensor de um PSD rigorosamente ao centro, sem deslizar para a esquerda ou para a direita. O ainda líder do PSD sempre insistiu que era ao centro que se ganhavam eleições, mas essa estratégia acabou por favorecer o PS, partido também do centro, embora a pender para a esquerda, que saiu das legislativas com uma maioria absoluta.
Os dois candidatos à sua sucessão, Luís Montenegro e Jorge Moreira da Silva, não perfilham essa visão tão redutora do espaço do partido. O que para Miguel Morgado, antigo assessor político de Passos Coelho, é muito positivo. “Qualquer deles ganha por ter um posicionamento muito diferente do de Rui Rio”, afirma o também antigo deputado social-democrata. “Não me parece que qualquer deles tenha a obsessão da depuração do PSD como um partido rigorosamente ao centro”, acrescenta, recordando que Rio disque pensou os “votos que caíram no bolso do Iniciativa Liberal e do Chega”. “Os resultados foram os que se viram (uma derrota nas urnas) e todos aprenderam a lição”, frisa.
Para Miguel Morgado – que se bateu pela federação da direita e até criou o Movimento 5 de Maio com esse fim –, tanto Luís Montenegro como Jorge Moreira da Silva têm defendido um PSD “federativo”, que reúna as várias famílias políticas que sempre o integraram, e com entendimento com outras forças partidárias.
Mas o antigo deputado considera “um erro estratégico” que Jorge Moreira da Silva use a ideia de um cordão sanitário em relação ao Chega, rejeitando qualquer diálogo com o partido de André Ventura, como fator de diferenciação em relação a Luís Montenegro, acusando o adversário de ambiguidade.
Ambiguidade que Miguel Morgado não encontra no posicionamento de Montenegro. “Já disse o PSD não abdica dos seus valores e princípios e tem as portas abertas (a casa comum de todos os não-socialistas) para os que se revejam nesses princípios.”
Largo espetro de atração
Em entrevista ao DN, Luís Montenegro definiu o seu pensamento sobre a abrangência ideológica do partido. “O PSD foi sempre um partido com um largo espetro de atração. Não é um partido fechado numa ideologia muito ortodoxa e muito dogmática, é um partido que defende a iniciativa privada como motor da economia, defende – e bem – o papel do Estado na regulação da atividade económica e também no cumprimento das funções soberanas e das funções sociais. Dentro deste espetro, o professor Marcelo Rebelo de Sousa, quando era líder do PSD, costumava dizer que o PSD ia do centro-esquerda até ao centro-direita.”
E quanto ao Chega afirmou que, se for eleito líder do PSD, irá falar “para todos os portugueses e tentar colher o apoio de todos aqueles que não se reveem nesta política socialista”. Pelo que, “obviamente”, apelará “a todos aqueles que não votaram no PS, que votaram no PSD, para que se continuem a fidelizar na nossa proposta política, assim como aos que votaram noutras forças políticas, no Chega, no Iniciativa Liberal, no CDS”.
Luís Montenegro recordou ainda que só no Iniciativa Liberal e no Chega votaram nas últimas eleições legislativas 635 mil portugueses. “E devo dizer que quando me refiro ao PSD como casa-mãe do espetro político não-socialista, refiro-me a todos aqueles que querem mudar de governo e querem uma política diferente, e, sinceramente, esses não são propriedade de ninguém. Os eleitores, é bom que se diga, não são propriedade de nenhum partido. Os eleitores tomam a sua decisão mediante as alternativas que são colocadas nos momentos eleitorais, e lutarei por todos os eleitores”, rematou.
É o deputado Joaquim Sarmento, que preside ao Conselho de Estratégia Nacional (CEN), criado por Rui Rio e com vasto trabalho em várias áreas da governação, que tem entre mãos a coordenação da moção de Montenegro, onde o perfil do partido também será plasmado.
Partido reformista
O opositor, Jorge Moreira da Silva, também em entrevista ao DN, defendeu um “reposicionamento ideológico” do PSD, um partido “que tem de abandonar a conversa do centro, da esquerda e da direita”. “Esses pontos cardeais estão completamente ultrapassados. O PSD tem de ser um partido à frente, não tem de ser um partido que se posicione como centro, centro-esquerda ou como direita, essa é uma conversa datada”, sublinhou.
Para o antigo ministro do Ambiente, o PSD “tem de ser o partido que agrega os reformistas, essa é a sua marca identitária: capacidade de reformar, de ousar, de ultrapassar obstáculos. O partido que integra os sociais-democratas mas também os liberais-sociais”. E estabeleceu mesmo as diferenças entre a vocação do PSD e do Iniciativa Liberal: “Há muita gente liberal que não é liberal, é social-liberal. Isto é, os sociais-liberais não estão no Iniciativa Liberal, têm de estar no PSD, porque o Iniciativa Liberal não tem um programa que ofereça, por exemplo, garantias da provisão dos serviços na saúde e na educação. O Iniciativa Liberal não acredita que o Estado tenha uma função de provisão de serviços na saúde e na educação. O Iniciativa Liberal não acredita nas alterações climáticas.”
Já sobre o tal cordão sanitário em torno do partido de André Ventura explicou que, caso seja eleito presidente do PSD, não fará “qualquer acordo com o Chega”, sublinhando, no entanto, que quer “os eleitores do Chega que votaram num partido de protesto e que podem regressar ao PSD”. “Não confundo os eleitores do Chega com o Chega, porque os eleitores do Chega – aqueles que são moderados, como é evidente –, no dia em que perceberem que existem partidos com capacidade para resolver os seus problemas, entenderão que têm de dar o seu contributo apostando nos que estão em melhores condições para transformar e mudar. E espero que esse partido seja o PSD.”
Jorge Moreira da Silva chamou a si a elaboração da moção de estratégia sem delegar essa competência, como fez Montenegro.
A direita de “quatro patas”
Miguel Morgado insiste que neste momento “o PSD tem um grande trabalho pela frente de reconstrução” e deve estar menos focado nos outros partidos. “Tem de se concentrar em si próprio e no seu programa, no modelo de sociedade e nas propostas que terá para o aumento dos salários dos portugueses e as reformas da educação e da saúde, entre outras.”
O antigo assessor político de Pedro Passos Coelho insiste que “a ambição do PSD tem de ser a de preparar uma alternativa ao PS e não ser a sombra do PS, como Rio sempre sugeriu”.
O politólogo José Adelino Maltez também defende que “um futuro líder do PSD” – que não sabe se será algum dos que está na corrida – “tem de ter um perfil capaz de federar a direita, que “neste momento tem quatro patas”. Refere-se ao PSD, CDS, IL e Chega. E adverte: “Só se poderá federar se se tiver um projeto, porque o ‘inimigo’ socialista tem 80% de pontos comuns com a social-democracia.”
“Qualquer deles ganha por ter um posicionamento muito diferente de Rio. Não me parece que qualquer deles tenha a obsessão da depuração do PSD como um partido rigorosamente ao centro.” Miguel Morgado Antigo deputado do PSD “Um futuro líder do PSD tem de ter um perfil capaz de federar a direita, que neste momento tem quatro patas [PSD, CDS, IL e Chega].” José Adelino Maltez Politólogo