Diário de Notícias

Portugal tem tardado a reconhecer a Palestina. É agora o momento de o fazer e de, com Espanha, puxar a União Europeia para que também o faça.” Cessar-fogo definitivo. E reconhecer a Palestina

- N.º 2 da lista de candidatos a deputados pelo Livre em Lisboa

De uma prisão a céu aberto, Gaza passou a um inferno a céu aberto. Nas últimas sete semanas, o Governo de Netanyahu tem estado, à vista de todo o mundo, a cometer um massacre ao bombardear campos de refugiados, hospitais, ambulância­s, escolas das Nações Unidas, onde estão refugiadas milhares de pessoas. Impediu a entrada de mantimento­s, água, combustíve­l em Gaza, deixando as pessoas – incluindo crianças – sem ter o que comer ou beber e os feridos sem possibilid­ade de tratamento. Assistimos a uma deslocação forçada de milhares de pessoas para sul, sem nada nas mãos, nem local para onde ir e deixando para trás o que resta das suas casas, no que é o maior êxodo de palestinia­nos desde a Nakba de 1948, segundo Philippe Lazzarini, Alto-Comissário da Agência da ONU para Refugiados Palestinia­nos. E a destruição está a ser tão intensa, que não terão para onde voltar.

A pausa de quatro dias acordada para troca de reféns e prisioneir­os é um alívio momentâneo e Yoav Gallant, ministro da Defesa israelita, já avisou que os ataques a Gaza continuarã­o por, pelo menos, mais dois meses. O que o Exército de Israel e o Gverno de Israel estão a fazer vai muito para lá do “direito a defender-se”. O ataque hediondo que o Hamas fez no dia 7 de outubro é imperdoáve­l e um ato de puro terrorismo. Mas não existe culpa coletiva de um povo e até as guerras têm regras. Aquilo a que estamos a assistir desde 7 de outubro são crimes de guerra.

Não sabemos como Gaza vai recuperar destas últimas semanas. Mas sabemos qual é o primeiro passo: um cessar-fogo definitivo, acompanhad­o da entrada de ajuda humanitári­a e da libertação de reféns. Exigem-no milhões por todo o mundo, incluindo judeus e árabes.

O ódio só alimenta o ódio, numa espiral que só serve quem usa o ódio para ganhar poder em proveito próprio. E é isso que está a acontecer: os extremista­s de ambos os lados alimentam-se, afastando qualquer hipótese de paz naquela região. Por isso, o Governo de Israel ignora há anos as resoluções da ONU sobre o cerco a Gaza e a ocupação dos colonatos na Cisjordâni­a e, por isso, foi tão rápido a tentar enfraquece­r António Guterres quando lembrou a história trágica daquela região. É preciso parar a espiral do ódio, fortalecer a ONU e garantir uma solução política, que permita a israelitas e palestinia­nos viverem em paz e sem muros, numa solução de dois Estados.

Mas, para uma solução de dois estados, é preciso que ambos sejam reconhecid­os. Portugal tem tardado a reconhecer a Palestina. É agora o momento de o fazer e de, com Espanha, puxar a União Europeia para que também o faça.

A solução política não pode ser feita sobre escombros. Jorge Moreira da Silva, o subsecretá­rio-geral da ONU, chocado com o nível de destruição, com mais de metade das casas e das escolas desapareci­das, alertou que Gaza recuou 20% no Índice de Desenvolvi­mento Humano. A paz exige a reconstruç­ão urgente de Gaza e a comunidade internacio­nal tem de mobilizar recursos para reconstrui­r as infraestru­turas, os hospitais, as escolas, as casas que estão a ser dizimados, com a Autoridade Nacional Palestinia­na e com o povo palestinia­no. Já os escombros do trauma serão bem mais difíceis de reconstrui­r, num povo oprimido há décadas e que vive agora um sofrimento coletivo imenso que se prolongará durante gerações. Vai ser preciso um esforço coletivo global para garantir que palestinia­nos e israelitas possam viver livres e em paz. Mas nada começa sem um cessar-fogo definitivo.

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