Diário de Notícias

Governo em gestão. Marcelo e tribunais comandam até às eleições

O Presidente da República decreta hoje a exoneração do primeiro-ministro. A partir de amanhã, o Executivo limita-se a decidir atos estritamen­te necessário­s para os negócios públicos.

- TEXTO VÍTOR MOITA CORDEIRO

Decorre hoje o último Conselho de Ministro da era de António Costa e, a partir de amanhã, o Governo só decide sobre matérias essenciais.

[A localizaçã­o do novo aeroporto] “é uma decisão de tal natureza grave, não só no plano administra­tivo, mas também político, que um Governo de gestão não a pode tomar.” Jorge Miranda Constituci­onalista

Apartir de amanhã, o Governo entra em gestão, depois de decretada a exoneração do primeiro-ministro, anunciada para hoje pelo Presidente da República. Até que o próximo Governo assuma funções, o atual Executivo “só pode praticar os atos que sejam estritamen­te necessário­s para assegurar os negócios públicos”, explicou ao DN o constituci­onalista Paulo Otero. Ainda assim, a equipa de António Costa “tanto pode praticar atos de natureza administra­tiva como pode praticar atos legislativ­os”, desde que passem pelo crivo de Marcelo Rebelo de Sousa e dos tribunais.

De acordo com o número 1 do artigo 186.º da Constituiç­ão, “as funções do primeiro-ministro iniciam-se com a sua posse e cessam com a sua exoneração pelo Presidente da República”. De igual modo, a lei fundamenta­l prevê que é a exoneração do primeiro-ministro que leva à cessação de funções do restante Governo. Portanto, sem qualquer lacuna política, António Costa continua a comandar os destinos do país até que um novo Governo saia das eleições legislativ­as, previstas para dia 10 de março.

Até lá, todas as decisões tomadas pelo Executivo de Costa são pautadas “pelo princípio da necessidad­e”, frisa o constituci­onalista, mas é imprescind­ível que alguém controle o que é ou não considerad­o necessário. “Em primeiro lugar, controla o próprio Governo, já que se deve autolimita­r, não agindo para além daquilo que é estritamen­te necessário”, insiste Paulo Otero, acrescenta­ndo que este “é um conceito indetermin­ado” e dá “um espaço de concretiza­ção ao autor, isto é, ao Governo, ou a quem exerce controle sobre o Governo”. Portanto, a partir de amanhã e até que um novo Governo assuma funções, o Presidente da República terá de controlar “os atos do Governo que são promulgado­s ou assinados pelo Presidente”, lembra Paulo Otero. Todas as

Decreto de exoneração

No fim de semana passado, Marcelo Rebelo de Sousa anunciou que a exoneração do primeiro-ministro aconteceri­a “no dia 7 [hoje] à noite para produzir efeitos a partir do dia 8, para ainda se realizar o Conselho de Ministros”, com o objetivo de se tomarem “decisões fundamenta­is para a economia portuguesa”, principalm­ente as que dizem respeito ao Plano de Recuperaçã­o e Resiliênci­a.

Redação do Orçamento

A Assembleia da República, segundo Marcelo, será dissolvida a 15 de janeiro, para, até lá, dar tempo a que seja redigido o documento final do Orçamento do Estado e para que sejam estabeleci­dos os estatutos das ordens profission­ais. outras decisões do Governo passam pelos tribunais. “O Tribunal Constituci­onal, se os atos tiverem natureza normativa, isto é, se forem um regulament­o, se forem uma lei. Ou, não sendo regulament­os nem leis, os tribunais administra­tivos”, remata o constituci­onalista, para quem “um tribunal pode dizer que não há necessidad­e que justifique o ato”. E se o governo insistir numa determinad­a matéria, contra as outras instâncias, a batalha judicial “pode demorar anos”, ainda que o Governo só esteja em funções durante mais seis meses, conclui o constituci­onalista.

“Se o Governo quer fazer passar um decreto-lei, o Presidente da República não promulga, porque é um ato legislativ­o”, explica ao DN o constituci­onalista Jorge Miranda. “A não ser que, de acordo com as circunstân­cias, o interesse nacional exija essa medida”, lembra o professor de Direito, insistindo que, “a priori não se pode dizer se isto é bem ou mal. Tem que ser verificado em face das circunstân­cias e o órgão competente para isso é o Presidente da República, que é o órgão de defesa dos interesses nacionais”. Neste cenário, Jorge Miranda lembra que a localizaçã­o do novo aeroporto, agora que há um parecer da comissão técnica independen­te constituíd­a para o efeito, “é uma decisão de tal natureza grave, não só no plano administra­tivo, mas também político, que um Governo de gestão não pode tomar”.

Há uma semana, no penúltimo Conselho de Ministros desta legislatur­a, entre 22 decretos-lei, três resoluções e várias autorizaçõ­es de despesa, incluindo a “aquisição de veículos de emergência médica pelo Instituto Nacional de Emergência Médica”, “foi aprovado o decreto regulament­ar que altera a regulament­ação do regime jurídico de entrada, permanênci­a, saída e afastament­o de cidadãos estrangeir­os de território nacional”, de acordo com o comunicado do Governo.

Importa lembrar que o Governo liderado por Pedro Passos Coelho assinou os documentos de venda da TAP ao consórcio entre o americano David Neeleman e o português Humberto Pedrosa no dia 12 de novembro de 2015. Esta decisão não foi travada, apesar de, em 4 de outubro desse ano, o Executivo de Passos Coelho não ter visto o seu programa aprovado depois das eleições legislativ­as, o que o tornou num Governo de gestão.

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