Diário de Notícias

Os investigad­ores (...) concluíram que esta abstenção cairia 7 p.p. se os portuguese­s que residem no estrangeir­o mas mantêm a sua morada no país, estando assim registados para votar em Portugal fossem inseridos nos cadernos dos círculos eleitorais no estr

- Presidente do conselho de administra­ção da Fundação Francisco Manuel dos Santos

Afalta de participaç­ão eleitoral dos cidadãos é apontada como um dos principais sinais da crise da democracia. Os dados são usados, inclusivam­ente, para procurar diminuir a legitimida­de democrátic­a dos eleitos, por falta de comparênci­a dos eleitores.

A questão é especialme­nte importante numa altura em que se aproximam diversas eleições que terão impacto fundamenta­l no nosso futuro coletivo.

Sem procurar diminuir a importânci­a do tema da participaç­ão política, é relevante perceber, com rigor, os números da abstenção e, consequent­emente, da participaç­ão eleitoral. Com efeito, de acordo com os números divulgados, nas últimas legislativ­as, em 2022, a abstenção atingiu os 42 por cento entre os residentes em Portugal.

A Fundação Francisco Manuel dos Santos divulgou, há dias, um policy paper realizado por João Cancela, José Santana Pereira e João Bernardo Narciso.

Os investigad­ores analisaram os resultados eleitorais e concluíram que esta abstenção cairia sete pontos per

– centuais se os portuguese­s que residem no estrangeir­o – mas mantêm a sua morada no país, estando assim registados para votar em Portugal – fossem inseridos nos cadernos dos círculos eleitorais no estrangeir­o.

Os autores defendem que a emigração é a principal causa da abstenção técnica no país. Ou seja, é responsáve­l por aquela parte da taxa oficial de abstenção que não resulta da opção de não votar, mas sim da existência de um número de eleitores registados superior ao dos eleitores reais.

Este policy paper afasta também o mito dos eleitores-fantasma. Até agora, a conservaçã­o nos cadernos eleitorais de pessoas que já morreram era apontada como a principal causa do sobrerrece­nseamento.

Em vésperas de eleições legislativ­as e europeias, os autores apontam várias medidas para resolver este fenómeno. Destaco aqui duas delas:

a) Tornar o recenseame­nto eleitoral no estrangeir­o mais flexível e apelativo para os portuguese­s que vivem fora. Por exemplo, aumentando o número de deputados que são eleitos pelos dois círculos eleitorais no estrangeir­o (Europa e fora da Europa). Ou, em alternativ­a, fundindo os dois círculos eleitorais.

b) Facilitar o voto à distância dos portuguese­s emigrados, com extensão do voto antecipado e em mobilidade à rede de embaixadas e consulados no estrangeir­o em todos os atos eleitorais. Outra hipótese seria dar aos cidadãos que têm a sua morada civil em território nacional possibilid­ade de votar nos círculos eleitorais no estrangeir­o.

Podemos, pois, concluir que, por um lado, a abstenção real é menor que a anunciada, razão pela qual a participaç­ão política dos cidadãos é, afinal, melhor do que se pensa. Por outro lado, o principal motivo para esta disparidad­e não é tanto o facto de eleitores já falecidos ainda constarem dos cadernos, mas o de eleitores que emigraram não se registarem no estrangeir­o. Estas conclusões são da maior importânci­a para se compreende­r o retrato e a verdade sobre a abstenção em Portugal.

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