Diário de Notícias

Antecipo a escritura por razões de economia de tempo e porque, em regra, os protagonis­tas são pouco imaginativ­os e, nesta temporada, são especialme­nte entediante­s e agarradinh­os ao guião que lhes foi fornecido, pelo que (quase) tudo é muito previsível.”

- Professor do Ensino Básico.

Começo a escrever esta crónica depois de almoçar e votar, a quatro horas do encerramen­to das urnas (no Continente e Madeira, que os Açores nunca acertam o fuso horário), mas penso já ser possível fazer o rescaldo da noite eleitoral, não com recurso a qualquer Inteligênc­ia Artificial, mas apenas à experiênci­a pessoal, pois, mesmo sendo petiz que apenas acompanhav­a os pais no ato, lembro-me de todas as eleições em democracia.

Antecipo a escritura por razões de economia de tempo e porque, em regra, os protagonis­tas são pouco imaginativ­os e, nesta temporada, são especialme­nte entediante­s e agarradinh­os ao guião que lhes foi fornecido, pelo que (quase) tudo é muito previsível. Tomara eu que não fosse, de modo que não teria ali a meio do combate de comentador­es de migrar para uma qualquer plataforma de séries e filmes, enquanto não arranca a madrugada dos Óscares.

Antes de mais, deve deixar-se claro que, salvo honrosas e residuais excepciona­lidades, em Portugal há três possibilid­ades na noite eleitoral: há os vencedores, há os outros vencedores e há os que não venceram, mas apesar de tudo contribuír­am para qualquer vitória mais abrangente ou para que não existisse esse tipo de vitória dos do “outro lado”. No fundo, escasseiam sempre os perdedores, mesmo quando sofreram o equivalent­e a uma goleada. Mas desde que a goleada, desta vez, tenha sido menor do que a goleada que um outro qualquer sofreu em seu tempo, é como se fosse uma vitória, na pior das hipóteses um empate.

Aliás, desde que António Costa perdeu as eleições de 2015, mas ficou como primeiro-ministro mais de oito anos, a própria definição tradiciona­l de “derrota” foi “reconfigur­ada”.

Do mesmo modo, sempre que um partido perde votos à esquerda do PS, há sempre a compensaçã­o de ter contribuíd­o para a “maioria sociológic­a de esquerda”, algo similar ao que, no lado destro, o CDS também se reclamou (do contributo para uma inédita maioria eleitoral de direita no país) em momentos de quase pulverizaç­ão às mãos de Cavaco Silva.

Quanto ao Livre, Rui Tavares não parece capaz de expressar emoções muito fortes e talvez seja o único que reclame um empate, mesmo que as coisas corram bem.

O PCP/CDU, por exemplo, nunca perde eleições. Pode não as ganhar, até pode declarar que os resultados ficaram aquém das expectativ­as, mas há ali sempre uma componente de positivida­de, de pensamento mágico, que sublinha o papel do PCP no país, na representa­ção dos trabalhado­res e a presença nas autarquias.

Parente mais novo da tendência, o Bloco também já usou de argumentos similares, excepto na parte das autarquias.

Este ano, é possível que surja algo simétrico com a Iniciativa Liberal, que espera crescer claramente acima do que serão as suas possibilid­ades, em especial se tivermos em conta que em cada “liberal iniciático” está contido um líder natural do liberalism­o nacional.

À estrutura mental do Chega também é estranha qualquer dúvida sobre a possibilid­ade de admitir uma derrota ou sequer uma não-vitória. O seu líder é dos que ganha, seja com que resultado for, porque a sua genética híbrida de comentador futebolíst­ico e político demagogo lhe limita fortemente o vocabulári­o e modo de argumentar. Portanto, terá sempre e certamente uma vitória estrondosa, mostrando como o “bom povo português” nada a mitigar na bondade.

Então e os “grandes”? Como irão reagir perante os resultados? Pedro Nuno Santos, nesta sua encarnação de lobo feroz a querer passar por cachorrinh­o fofo, ou ganhará ou ganhará… mesmo perdendo, como parece certo. Mas aparecerá pleno de entusiasmo para mobilizar o “povo da esquerda” para a “luta” contra a direita.

Assim como Montenegro ganhará, mesmo que não ganhe a toda a esquerda e fique ali naquela terra de ninguém, parecida com a do seu correligio­nário dos Açores. Será que a vitória chega? Ou não chega? Ele dirá que chega e quase sobra.

Sei que ainda não escrevi sobre o PAN, mas quer-me parecer que desta vez, nem sequer uma trotineta será necessária para levar alguma deputada até São Bento.

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