O voto populista
Foi apresentado esta semana na Fundação Mário Soares um estudo muito interessante da Fundação Friedrich Erbert Stiftung (https://portugal.fes.de) sobre as atitudes dos portugueses perante a democracia. Identifica-nos como europeístas e progressistas, embora afastados da participação cívica.
Matéria controvertida em vários estudos e análises, o caráter xenófobo da população portuguesa, aqui não encontra respaldo. A conclusão dos investigadores aponta para uma população tolerante para com os imigrantes e os seus direitos. Porém, o facto de a tolerância da população portuguesa para com as comunidades migrantes não ter conhecido ainda teste suficiente (devido à presença ainda limitada de novas comunidades migrantes nas várias regiões) aconselha a prudência.
Mas se não foram as migrações, o que explica então o crescimento da extrema-direita num país que passou quase todo este último ciclo político (praticamente uma década) a crescer acima da média europeia, a aumentar os rendimentos mais baixos e a diminuir pobreza?
Nas últimas eleições, o Chega tocou no tema migratório, sim, mas apenas na medida necessária para reter alguns eleitores mais radicais. De outro modo, fez uma campanha assente na “vergonha” e “vassourada”.
O programa antielites, clássico (a própria definição) do populismo.
Os eleitores do Chega saíram a votar pela vassourada nos “políticos”, dando quase um quinto dos votos a este partido. O Trumpismo importado para Portugal.
Nem sequer importa muito que os protagonistas da “vassourada” estejam longe de ser impolutos. Foi um voto de protesto contra aqueles que foram frustrando, ao longo do tempo, as expectativas que nunca se cumprem.
O Chega soube aproveitar os segmentos da população menos instruídos, dizem os estudos. Que desta vez foram mesmo votar, incluindo (aparentemente) os jovens.
Em perspetiva histórica, conhecemos outros casos de mobilização das classes menos instruídas e mais afastadas do desenvolvimento por populistas de boa retórica. Com consequências desastrosas.
Mas a mobilização dos jovens é mais interrogante. Precisaremos de mais estudos, mas os jovens terão mesmo votado naqueles que negam a ciência e as alterações climáticas. Uma campanha de comunicação muito sólida terá conseguido falar com os jovens com quem os meios de comunicação tradicionais (e assim os partidos estabelecidos) já não falam.
Lições para os partidos democratas, em particular para o Partido Socialista, que governou neste ciclo político, e deve ambicionar voltar a representar melhor os que têm menos oportunidades, e votam hoje mais na extrema-direita, em particular os homens trabalhadores de baixas qualificações (indicam vários estudos europeus). E que sabe que tem de recuperar a relação com o eleitorado jovem.
O populismo é muito perigoso para as democracias, sabemo-lo bem. Saberemos nós transmiti-lo novamente aos portugueses (e já agora, de modo mais alargado, aos europeus)? As pessoas querem respostas concretas. Saberemos nós entregá-las?