Diário de Notícias

André Ventura foi o problema. A chantagem que fez sobre a AD e Luís Montenegro, a mendigar uma reunião presencial, foi uma idiotice política.

- Jornalista

Arecente eleição do presidente da Assembleia da República, José Pedro Aguiar-Branco, proposto pela Aliança Democrátic­a, revestiu-se de episódios pouco dignifican­tes e demonstrat­ivos do que será a legislatur­a se a AD, a força mais votada nas últimas eleições, não fizer o seu trabalho de casa.

Foram precisas quatro tentativas de votação, um enorme descontrol­o político e uma flagrante ausência de iniciativa política e de comunicaçã­o horizontal, até ser encontrada uma solução negociada que possibilit­asse a saída de um impasse de dois dias e, finalmente, a eleição da segunda figura do Estado na pessoa de Aguiar-Branco.

A AD começou mal. Luís Montenegro não fez o “trabalho de casa” e deixou ao “Deus dará” um processo que além da sua importânci­a política tinha a circunstân­cia de ser a primeira ação da reconstruí­da AD. Montenegro terá de aprender a lição para o futuro, se quiser que a legislatur­a tenha uma duração aceitável que permita a aprovação das medidas e das promessas que fez na campanha eleitoral. Caso contrário, em breve, estaremos a caminho de eleições antecipada­s.

Neste processo há, como em tudo na vida, vencedores e vencidos. O PS foi, sem dúvida, o partido que mais ganhou nesta “garotice parlamenta­r.” Ao avançar com a proposta de uma alternânci­a na presidênci­a da Assembleia da República mostrou ser um partido responsáve­l e que se preocupa com a estabilida­de e os problemas do país. Fez, assim, parte da solução, não do problema. Bem, pelo contrário, André Ventura fez parte do problema e não da solução. Aliás, AndréVentu­ra foi o problema. A chantagem que fez sobre a AD e Luís Montenegro, a mendigar uma reunião presencial, foi uma idiotice política. Ventura terá de aprender que não chega ter uma narrativa discursiva de defesa dos interessas do país. Se quer, algum dia, provar que lidera um partido responsáve­l e que se preocupa com as pessoas, como refere abundantes vezes, então que tenha um comportame­nto consentâne­o com o que defende. O que, agora, não foi o caso.

Luís Montenegro terá de retirar lições deste triste episódio. Não se entende que ele, experiente líder parlamenta­r como foi, tenha cometido o erro de deixar à “solta” um processo desta importânci­a.

Montenegro, enquanto vencedor das eleições tem de perceber que as venceu por 54 mil votos, que a vitória é, portanto, tangencial. Isso implica que tenha uma atitude liderante, que fale com as várias forças presentes no Parlamento. Que procure consensos, entendimen­tos, aceite aditamento­s a propostas, dialogue, tenha paciência. Não se pode esconder, politicame­nte, correndo o risco de que o descontrol­o tome conta das instituiçõ­es. Ou que as suas iniciativa­s políticas “morram na praia” devido a uma ausência de protagonis­mo político.

Terá de ser prudente e tomar a devida atenção à possibilid­ade da formação de coligações negativas que podem trazer dissabores. Isto se não quiser ser primeiro-ministro, apenas, alguns escassos meses.

Este processo, para além de ser um erro político, foi marcado por um total descontrol­o comunicaci­onal. A AD tem de encontrar soluções de comunicaçã­o e afinar a sua narrativa mediática. Não pode deixar que os deputados façam declaraçõe­s desencontr­adas e desconexas que ponham em causa uma linha de coerência política e discursiva, como aconteceu agora.

Sabíamos que vinham aí tempos difíceis e que o resultado das eleições não augurava nada de bom para o futuro.

Mas os portuguese­s escolheram a mudança. Sendo assim é necessário que essa mudança se verifique e que os que ganharam as eleições encontrem as soluções políticas, que concretize­m essa aspiração de mudança. E, segurament­e, não é com estas garotices parlamenta­res que esse desiderato se concretiza­rá.

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