Uma minoria, um Governo, um Presidente
Osonho de Sá Carneiro quando fez a AD, de ter “uma maioria, um Governo e um Presidente”, só haveria de concretizar-se décadas mais tarde, com Passos Coelho em São Bento e Cavaco em Belém. Montenegro terá o mesmo sonho, mas falta-lhe a maioria. Para já tem apenas um Governo e um Presidente. E tem um Governo frágil, entalado entre o PS e o Chega, obrigado a falar com ambos. Não basta prometer diálogo com “todos, todos, todos”. É preciso dar os passos certos para concretizar esse diálogo, com muito trabalho de bastidores e capacidade de abertura e flexibilidade. Pedro Nuno pode explicar como se faz.
Até agora, as poucas palavras de Montenegro indiciam que Cavaco Silva é um dos seus mentores. Desde o “deixem-nos trabalhar”, até à recuperação das “forças de bloqueio”, passando por afirmar que as notícias não afetarão o rumo do Governo, a cartilha está lá toda.
Acontece que já não estamos nos Anos 80 e 90, o mundo e a sociedade mudaram muito e há as redes sociais, esse fenómeno que Cavaco não teve de enfrentar.
A cartilha corre o risco de estar desatualizada e os silêncios prolongados do primeiro-ministro não são bons conselheiros na era da comunicação instantânea.
Com o PS disponível para um Orçamento Retificativo para aumentar classes profissionais, Montenegro pode aproveitar essa boleia, mas já perdeu a iniciativa. Foi Pedro Nuno quem escreveu ao primeiro-ministro, precisamente porque só teve silêncio quando verbalizou a disponibilidade socialista para um acordo que permitisse cumprir uma promessa eleitoral de ambos os partidos.
O primeiro teste da minoria vai ser a votação do Programa do Governo. Com uma moção de rejeição anunciada, vai ser interessante perceber quem vota a favor. Mais uma vez, o PS tomou a iniciativa e avisou que não será obstáculo ao Governo. O Chega muito dificilmente votará ao lado do PCP, pelo que parece assegurado que teremos Governo com programa.
Os próximos meses serão de tática política. O que as sondagens forem dizendo vai condicionar a ação dos três principais partidos. O PS atacará se perceber que, havendo eleições antecipadas, pode ganhar. O Chega já antecipa que terá mais votos e mais mandatos nas próximas eleições. E o PSD espera que se repita 1987, que quem derrube o Governo seja penalizado e que a minoria se transforme em maioria.
Pelo meio de tanta tática e estratégia é preciso governar. Com Governo e Presidente. Isso da maioria depois logo se vê.