O Governo de Montenegro que lançou a confusão
Estudo do MIT, de 2019, frisava que as fake news se espalham nas redes sociais a uma velocidade seis vezes superior às notícias verdadeiras...”
Há dias um amigo enviou-me um link de uma publicação na rede social X (antigo Twitter) dizendo que ia divertir-me a ler os comentários que gerou.
Assim, sem mais explicações, lá fui ver o post de duas linhas. O autor escreveu: “Este Governo de Montenegro não me representa. Não é o meu Governo.” E era acompanhado de uma fotografia onde estavam visíveis 17 homens e três mulheres.
Ironias à parte – perante a realidade política nacional podemos sempre relacionar a publicação com o Governo português liderado por Luís Montenegro e, porventura, terá sido essa a intenção –, o que se segue é uma excelente demonstração de como se pode inflamar, de propósito ou não, as redes sociais.
Claro que, após alguns comentários – “Baza daqui” ou “emigra” são dois dos conselhos mais simpáticos para o responsável pelas frases –, este escreve que nunca foi aos Balcãs e que se referia ao país que se tornou independente da Sérvia em 2006 e que faz parte da União Europeia desde 2010 e cujo Executivo é liderado por Milojko Spaji, eleito em outubro de 2023.
O rol de comentários ao post inicial mostra como é possível fazer extraordinárias análises políticas. Por lá pode ler-se que a confusão entre “Montenegros” ajuda a compreender os votos que o partido ADN recebeu nas eleições legislativas de 10 de março – recebeu 102 132 votos, ou seja 1,5% do total – devido a uma suposta confusão com a coligação AD (PPD/PSD, CDS/PP e PPM), entre outras considerações, nem todas simpáticas para o dono da conta na X.
O certo é que este episódio, que nem sequer é original nas redes sociais, ajuda a perceber a forma como é fácil manipular a opinião pública ou, pelo menos, a parte constituída pelas pessoas que seguem o que se escreve nestes fóruns sem se darem ao trabalho de passar do título ou da primeira frase. Uma decisão motivada pela rapidez com que se quer consumir informação ou apenas pela “maçada” que é ler textos um pouco mais longos, com argumentos e estruturados. E, claro, sem frases bombásticas.
Já no que diz respeito aos comentários o anonimato também costuma ser um ótimo parceiro nas redes sociais.
Numa altura em que a maior parte das pessoas procura informação quase exclusivamente online, com muitas a não fazerem uma “viagem” por mais de um site ou rede social e a não terem uma visão crítica do que leem, estamos a caminhar em ritmo acelerado para discussões como aquela em redor do “Montenegro” sem que, na realidade, interesse o que se escreveu. Importante sim é aquilo que os leitores acham que leram e a sua interpretação do que está escrito.
Não é uma discussão nova, pelo contrário, até tem aumentado nos últimos anos, mas a verdade é que este post de duas frases é um retrato de como uma sociedade pode ser condicionada. Basta escolher bem as palavras.
Há muitos estudos sobre como a informação disseminada pela internet pode ajudar à manipulação e à desinformação – entre os inúmeros exemplos temos sempre o caso da Cambridge Analytica, empresa acusada de manipular as eleições norte-americanas na primeira candidatura de Donald Trump, e em outros sufrágios pelo mundo –, assim como de incitar ao bullying, principalmente nos jovens. Mas, também, é importante frisar que a internet é um mundo importantíssimo na nossa vida e uma ferramenta essencial para ajudar a desconstruir teorias que não aguentam uma argumentação contrária.
E não nos esqueçamos que segundo um estudo do Instituto de Tecnologia do Massachusetts (MIT), de 2019, as fake news espalham-se nas redes sociais a uma velocidade seis vezes superior às notícias verdadeiras...