Não forcem os países do Sudeste Asiático a escolher
Num pano de fundo histórico em que os EUA (e boa parte do Ocidente) fixaram como objetivo conter a ascensão da China, desde logo na Ásia, a análise das relações da China e dos EUA (e outros países do Ocidente) com os países do Sudeste Asiático reveste-se de especial importância; estes países criaram a Associação de Nações do Sudeste Asiático (ASEAN) que é hoje uma zona de comércio livre com quase 700 milhões de habitantes.
O aumento do comércio externo e do investimento entre a China e os países da ASEAN mostra uma integração económica gradual. O comércio entre a ASEAN e a China tem aumentado muito, passando de 235,5 mil milhões de dólares (mM$), em 2010, para 878 mM$ em 2022, sendo que a China é o principal parceiro comercial da ASEAN desde 2009. Os fluxos de investimento da China para a ASEAN atingiram 15,5 mM$ em 2022, colocando a China como a quarta maior fonte de IDE na ASEAN (6,9% do total). A ASEAN constitui hoje o principal parceiro comercial da China, tendo ultrapassado os EUA e a UE.
Por outro lado, a reclamação e ocupação efetiva, pela China, da quase totalidade do Mar do Sul da China choca com as pretensões dos outros países costeiros, os quais têm procurado parceiros militares (máxime os EUA) que possam contrabalançar o progressivo poderio naval da China.
Sucessivas Administrações e analistas dos EUA têm chamado a atenção para a “tendência crescente de ações chinesas inúteis, coercitivas e irresponsáveis no Mar do Sul da China” e a sua ameaça aos interesses marítimos do Sudeste Asiático. Por seu turno, analistas e decisores políticos chineses sublinham aos responsáveis dos países do Sudeste Asiático os perigos associados às “provocações” da chamada “nova Guerra
Fria” dos EUA. Esta batalha em que responsáveis dos EUA e da China se digladiam ainda vai no adro.
Porém, os países da ASEAN desejam ter o melhor dos dois mundos. Por um lado, querem manter o acesso ao enorme mercado chinês e beneficiar de investimentos chineses, sobretudo em infraestruturas (em boa medida no âmbito da BRI); por outro lado, desejam manter uma relação de proximidade com os países ocidentais – desde logo com os Estados Unidos –, seja pela relevância destes mercados, seja pela cooperação militar, por forma a diminuir o progressivo efeito centrípeto do crescente poderio económico, comercial e militar da China na região.
Para que não subsistam dúvidas, o primeiro-ministro de Singapura, Lee Hsien Loong, advertiu que as propostas de “cooperação Indo-Pacífico” são bem-vindas se forem inclusivas e aprofundarem a integração regional, mas não devem minar os acordos da ASEAN ou “criar blocos rivais, aprofundar divisões ou forçar os países a tomar partido”. E o ex-presidente indonésio, JokoWidodo, apelou a uma visão do Indo-Pacífico que inclua a China, declarando que a ASEAN e a China não têm alternativa senão colaborar.
Além disso, convém atentar no Inquérito-relatório de 2024 do ISEAS –Yusof Ishak Institute. Este Inquérito-relatório revela que o Japão, os EUA e a UE merecem maior confiança que a China. Mas também mostra que, quando confrontados com a pergunta quanto a com qual país eles prefeririam alinhar, caso fossem obrigados, pela primeira vez, a China ultrapassa [resvés] os EUA na preferência.