CDS-PP adota superação como palavra de ordem
CONGRESSO Sem obstáculos à reeleição, Nuno Melo quer partido moderno e para jovens. Com ataques ao Chega e recados ao PSD. Ex-presidente Manuel Monteiro disse que “não temos de pedir desculpa por sermos contra o aborto.”
Opresidente do CDS-PP, Nuno Melo, será reeleito hoje para um segundo mandato, mas em circunstâncias bem diferentes daquelas que enfrentou em 2022, ao assumir a liderança dos centristas, após o partido ficar sem representação parlamentar.
Sem oposição e de regresso ao Governo e à Assembleia da República, embora só com um ministro, dois secretários de Estado e dois deputados, Melo recorreu ontem várias vezes à palavra “superação” no primeiro dia do 31.º Congresso do CDS-PP, que hoje termina em Viseu.
Ao apresentar a moção de estratégia global, que visa um partido mais moderno na comunicação e dirigido aos jovens, o que se traduzirá em renovação nos órgãos dirigentes, cujas listas ainda estavam a ser definidas à hora de fecho desta edição, o ministro da Defesa Nacional recordou “as superações quando era mais difícil”. Isto é, durante os dois anos em que o partido esteve fora da Assembleia da República e “a maior parte dos comentadores diziam que tinha acabado”.
“O que nos define são as superações. Sabemos que ninguém tem sucesso na descrença”, disse, sendo ovacionado ao referir-se à placa do grupo parlamentar, retirada há dois anos e agora aparafusada pelo próprio Melo. “Está lá, onde faremos por a merecer todos os dias”, prometeu.
Certo de que o CDS “não se mede por dois anos de ausência da Assembleia da República” e sim “por 50 anos de pertença”, diise, reafirmando que o partido “nunca foi substituído por ninguém”. E dedicou ataques às forças políticas que lhe retiraram eleitores, de forma subtil com a Iniciativa Liberal, sobre a entrega da saúde a privados, e ostensiva com o Chega. Aplaudido de pé ao dizer que Paulo Núncio e João Almeida são só dois deputados, “mas valerão por 50”, recordou que “outro tipo de extremistas anunciaram que seriam donos do Caldas”, quando André Ventura admitiu comprar o prédio arrendado ao CDS-PP pelo Patriarcado de Lisboa.
Mas Nuno Melo também deixou recados ao PSD, defendendo que os centristas foram essenciais para a vitória da Aliança Democrática nas legislativas, encerrando o ciclo de governação socialista. “O CDS não foi muleta e o PSD não foi barriga de aluguer”, disse, incitando os que o ouviam a que “nunca se sintam parceiros menores desta coligação”.
Num primeiro dia em que a nova declaração de princípios do CDS-PP – que “não revoga a outra”, subscrita pelos fundadores em 1974, e “só a complementa e atualiza” – foi aprovada com apenas oito abstenções, viu-se um vídeo de Paulo Portas, que agradeceu a Melo por “superar um tempo difícil” e apontou como caminho para o partido demonstrar utilidade e competência. Mas a figura mais destacada foi outro ex-presidente: Manuel Monteiro disse que “não temos de pedir desculpa por sermos contra o aborto”. Por seu lado, Paulo Núncio apontou o combate à corrupção, a dignificação das forças de segurança e a defesa dos valores centristas como prioridades imediatas.
Dia 3 de abril. A Assembleia da República entra formalmente em funções, desfeito que está o impasse da eleição do presidente da mesa, José Pedro Aguiar-Branco. Entram, nesse dia, duas iniciativas legislativas do PAN (um projeto de resolução sobre a atribuição das bolsas de estudo e um pedido de constituição de uma comissão de inquérito à gestão da Global Media). Eram as primeiras após a plenitude de funções.
O volume de produção legislativa tem sido intenso. Olhando para o site oficial do Parlamento, desde o início da legislatura (que começou a 26 de março) já deram entrada nos serviços parlamentares 122 iniciativas legislativas. Consultando os dados, é também possível ver que mais de metade das entradas são projetos de lei gizados pelos partidos. Independentemente do lado da barricada em que se está, propostas semelhantes acontecem e algumas transitam da última legislatura.
O PCP, por exemplo, apresenta agora um projeto de lei sobre o complemento vitalício de pensão para antigos combatentes, que na anterior legislatura foi chumbado pelo PS, mas aprovado... pelo PSD.
A Iniciativa Liberal (IL) é, por larga margem, o partido que mais projetos de lei produziu (21), só acompanhado de perto pelo Bloco de Esquerda (que ganha nas resoluções, com 16 apresentadas) e pelo PCP (13 projetos de lei, tantos quantos o BE).
Sendo que, também aqui, há um tema que já vem da legislatura passada e é comum entre a IL, o BE, o PAN e o Livre: a introdução do ciclo de compensação nacional nas eleições para a Assembleia da República (que já existe nas eleições para a Assembleia Regional dos Açores). Apesar da convergência, os partidos diferem quanto ao número de mandatos atribuíveis por este novo círculo (por exemplo, a IL defende que devem ser 30 e o Livre 37).
Outro tema em que há convergência são as forças de segurança. Em concreto, a necessidade de lhes atribuir um suplemento de missão. Aqui, Chega, PCP e PAN estão de acordo com esta necessidade.
Outra figura legislativa que, da esquerda à direita, tem sido entregue são os projetos de resolução. Não vinculativos, destinam-se apenas a fazer recomendações sobre alguns assuntos. Aqui, ao contrário do que acontece nos projetos de lei, todos já apresentaram pelo menos um. Ainda que, no caso do CDS-PP, o projeto de resolução entregue seja para a constituição de uma comissão eventual para verificar os poderes dos deputados eleitos (que também foi entregue por todos os grupos parlamentares). Aqui, o Bloco volta a estar entre aqueles que mais resoluções produziram (liderando com 16).
Desde o início da legislatura, foram também já pedidas quatro Comissões de Inquérito Parlamentar (CPI). As de BE e PAN – mais uma vez sobre o mesmo tema (a gestão da Global Media, grupo de comunicação a que pertence o DN, que marcou a legislatura anterior) – já foram chumbadas. Há ainda duas para serem votadas: uma do PCP, sobre a privatização da ANA, e uma do Chega, sobre o chamado “caso das gémeas”. Neste último caso, o partido de André Ventura já avançou até que, se a proposta não for viabilizada, pode fazer entrar um requerimento potestativo, contornando o chumbo.
Programa de Estabilidade com seis resoluções
Há já vários projetos de resolução apresentados pela oposição com um tema em comum: o Programa de Estabilidade. Seis, ao todo, sobre o tema. Há, no entanto, perspetivas diferentes. Se, por exemplo, a IL recomenda ao governo que “reflita no Programa de Estabilidade as previsões macroeconómicas” anunciadas em campanha, o PCP apresentou uma resolução que “rejeita o Programa de Estabilidade e a política de direita”.
O PAN tem duas resoluções sobre o tema, pugnando por coisas diferentes (“transparência da execução orçamental e garantia de envolvimento da Assembleia da República na aplicação de receita fiscal extraordinária” e “inclusão dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável da Agenda 2030 e
dos princípios de orçamentação verde da Lei de Bases do Clima”).
O BE também apresentou uma resolução a pedir a transparência “nas opções de política económica” e defendendo a rejeição do Programa de Estabilidade. O Livre recomenda que o governo “contemple critérios objetivos e previsíveis para a utilização da folga orçamental”. Com este programa a ser discutido na próxima quarta-feira (dia 24), o governo já sabe que terá a oposição atenta.
Mudanças no IRS já deram entrada no Parlamento
Também no dia 24 de abril será discutida – e votada – a proposta do Executivo para alterar o Código do IRS. O diploma, aliás, já está na Assembleia, tendo dado entrada ontem, poucas horas depois de ter sido anunciado publicamente.
Além dos partidos e do Executivo, há também dois projetos de deliberação da autoria de José Pedro Aguiar-Branco, presidente do Parlamento: um para agendar a votação sobre o Programa de Estabilidade (e a data-limite para entrega de propostas) e outro para definir o elenco e a comissão das 14 comissões parlamentares permanentes, que entraram em funcionamento na passada quinta-feira e que já têm vários assuntos em mãos.