FMI exclui “correção repentina” dos preços das casas em Portugal
Valor dos imóveis residenciais cresceu 111% em Portugal desde 2015, bem acima dos 42% na Zona Euro. A “escassez de oferta” explica a subida, diz diretor do Fundo para a Europa.
“Portugal fez um trabalho excecionalmente bom na redução da dívida pública ao longo da última década. É um dos rácios dívida/PIB com o declínio mais rápido na Europa após a pandemia, ao ter caído de 135% para 99% do PIB.”
Acorreção nos preços da habitação em Portugal não será repentina e é preciso aumentar a oferta para responder a uma dificuldade que é transversal a outros países, defende o diretor do Fundo Monetário Internacional (FMI) para a Europa. Em entrevista à agência Lusa, Alfred Kammer diz que Portugal registou aumentos significativos nos preços das casas nos últimos anos, mas assinala que é um cenário que se estende a outras economias.
“Os preços das casas [em Portugal] aumentaram, dos níveis de 2015 até agora, em 111%, contra 42% na Zona Euro. É um aumento muito maior”, sublinha, acrescentando que se assiste a um abrandamento nos preços da habitação na média dos países da moeda única, mas que isso ainda não se verifica em terras lusas. “Em Portugal, os preços residenciais ainda continuam a aumentar.”
No entanto, aponta Alfred Kammer, o FMI não está preocupado com o impacto destas subidas na “estabilidade financeira”. Para o responsável do FMI, este aumento resulta de “uma escassez de oferta”, pelo que a instituição não espera “uma correção repentina nos preços da habitação residencial”.
“Esta é uma grande questão não só em Portugal, mas em vários países europeus. É uma questão de acessibilidade da habitação e, portanto, o que é preciso é criar o espaço regulatório e aumentar a oferta. O que o governo também está a fazer é ter investimento público para criar habitação social”, afirma. Segundo ele, “estas são duas boas respostas políticas e devem ser prosseguidas”.
“Tínhamos feito um estudo sobre a questão da acessibilidade dos preços da habitação e dos arrendamentos há alguns anos e uma das grandes questões que daí resultou foi que não se trata apenas de uma questão de política social. É também uma questão de produtividade e de crescimento”, disse, argumentando que os centros de produtividade geralmente estão nos centros urbanos, para onde se deslocam os jovens.
“Se não houver habitação, não podem deslocar-se para os centros urbanos, e isso prejudica a produtividade e o crescimento do país. Portanto, é uma questão muito maior do que apenas uma questão de equidade e justiça”, justificou.
Na mesma entrevista, o diretor do FMI para a Europa elogia a evolução da economia portuguesa e recomenda uma reforma fiscal abrangente, avisando que incertezas, sejam políticas ou externas, têm sempre impacto no investimento.
Questionado sobre se um governo minoritário pode ser um risco para as perspetivas económicas portuguesas, Alfred Kammer admite que “a incerteza é sempre algo negativo” e deve-se “tentar reduzi-la” tanto quanto possível. “Sempre que há um aumento de incerteza, de onde quer que venha, há um impacto, nomeadamente no investimento, por causa das perspetivas. Isso é um problema e não importa se vem de um governo minoritário, ou da perceção de uma mudança nas políticas, ou se vem de uma elevada incerteza externa, incluindo de uma fragmentação geoeconómica.”
No entanto, Alfred Kammer destaca que “Portugal teve um crescimento muito forte nos últimos anos”, apesar do abrandamento previsto para este ano, mas ainda assim acima da Zona Euro. “O que estamos a assistir são os efeitos da política monetária europeia, que estão a deprimir a procura, mas também a diminuir a procura externa, mas o crescimento foi bastante forte e bastante robusto ao longo dos últimos anos”, assinala.
O FMI reviu em alta o crescimento económico de Portugal para 1,7% este ano, mostrando-se ligeiramente mais otimista do que o governo (1,5% num cenário de políticas invariantes), e cortou a taxa de inflação para 2,2%, segundo as previsões divulgadas esta semana.
“Conquista notável” na dívida pública
No retrato que traça da economia portuguesa, o responsável destaca a trajetória de redução da dívida pública face ao PIB nos últimos anos, tendo-se fixado em 99,1% em 2023. “Portugal fez um trabalho excecionalmente bom na redução da dívida pública ao longo da última década. É um dos rácios dívida/PIB com o declínio mais rápido na Europa após a pandemia, ao ter caído de 135% para 99% do PIB”, assegura. E defende a importância desta opção, argumentando que uma dívida elevada cria vulnerabilidades e é “um fardo” quando taxas de juro mais altas sobem o custo do serviço da dívida.
“Foi uma conquista notável e achamos que uma política orçamental prudente deve continuar a ser seguida no futuro”, recomenda, defendendo que se devem criar almofadas para despesas públicas adicionais no futuro.
O FMI prevê um excedente orçamental de 0,2% do PIB este ano e um rácio da dívida de 94,7% e de 80,1% em 2028.