Cinco mil reformas este ano
António Gandra d’Almeida, tenente-coronel, é o novo diretor-executivo do SNS. Na AR, o anterior titular disse que tinha um plano preparado, mas Governo queria “um processo diferente”.
Na manhã em que estava agendada a audição em Comissão Parlamentar do diretor-executivo demissionário do SNS, Fernando Araújo, a ministra da Saúde jogou em antecipação e anunciou ainda antes das 8.00 horas, em comunicado às redações, a entrega do cargo a um médico com formação militar, António Gandra d’Almeida. A pronta nomeação por Ana Paula Martins, no dia seguinte a Araújo ter entregado o requisitado Relatório de Atividades que assinalou a sua saída de funções (ver caixa), assinalou o objetivo de virar rapidamente a página na Direção Executiva do SNS, cuja redefinição de funções ainda não está formalizada pelo novo Governo da AD. E não deixou abrir um vazio de poder no cargo, ao mesmo tempo que procurou esvaziar as atenções sobre a audição do demissionário Fernando Araújo no Parlamento.
Perante os deputados, sem nunca explicar diretamente a sua demissão, apresentada em abril, o agora antigo DE do SNS deixou alguns reparos à atuação da ministra Ana Paula Martins, com quem, garantiu, “nunca” teve qualquer reunião onde lhe tivesse sido apresentado “o plano estratégico do novo Ministério”.
Fernando Araújo disse que, quando o Governo tomou posse – e ao contrário do que foi afirmado pela ministra –, tinha “um plano preparado para os próximos meses com um conjunto de medidas (...) que não [colocou] no terreno por vários motivos: umas tinham sido amplamente criticadas e havia vontade de mudar o processo para um diferente”. O responsável garantiu que o plano estava desenhado e contemplava medidas para enfrentar o próximo verão e o inverno “de uma forma articulada e bem-organizada”.
Contudo, a nomeação de uma equipa para preparar um Plano de Emergência para o SNS, encomendado pelo Governo, à margem da Direção Executiva liderada por Araújo, levou o ex-responsável a entender que o Governo teria ideias diferentes. “Explicámos à senhora ministra exatamente isso: que era mais avisado que o plano fosse preparado pela equipa que estava a preparar o Plano de Emergência de acordo com a estratégia e com a visão que a nova equipa tivesse, que nós não conhecíamos”, acrescentou. Recorde-se
António Gandra d’Almeida (à
esquerda)
que essa equipa é coordenada pelo presidente do Conselho Regional da Ordem dos Médicos do Norte, Eurico Castro Alves.
Enquanto na Comissão Parlamentar o PS, através do deputado João Paulo Correia, acusava o Governo PSD/CDS-PP de interromper a “reforma em curso” no Serviço Nacional de Saúde e considerava que, “a partir de hoje”, a ministra é responsável por “todos os prejuízos” nos cuidados de saúde, Ana Paula Martins, após uma visita ao Centro de Saúde de Algueirão-Mem Martins, preferiu esvaziar o tema, dizendo que Fernando Araújo “cumpriu a sua missão” e que lhe agradeceu “o que fez por Portugal e pelos portugueses”.
Novo militar em cargos de Saúde
Ana Paula Martins realçou o currículo de António Gandra d’Almeida para ocupar o cargo de diretor-executivo do SNS, considerando que este tem uma visão que vai potenciar a capacidade do serviço público de Saúde. Tenente-coronel, de 44 anos, Gandra d’Almeida foi também, até 31 de janeiro, diretor da Delegação Regional Norte do INEM.
A nomeação apanhou de surpresa os dois sindicatos dos médicos, que, amanhã, sexta-feira, iniciam o promas sucede a Fernando Araújo como diretor executivo do SNS. cesso de negociações com a nova ministra da Saúde.
Ao DN, tanto a presidente da Federação Nacional dos Médicos (Fnam), Joana Bordalo e Sá, como o secretário-geral do Sindicato Independente dos Médicos (SIM), Nuno Rodrigues, disseram nada ter a comentar sobre o escolhido, competência “única e exclusiva da tutela”,
esperam que este tenha a noção que vai “abraçar uma missão muito difícil”, ressalva Joana Bordalo e Sá. “Porque não é possível fazer mudanças e tentar melhorar o SNS sem médicos. E ainda não vimos medidas a serem aprovadas e aplicadas que se destinem a fixar médicos no SNS.”
O secretário-geral do SIM, Nuno Rodrigues, aguarda com expectativa o início da ação do novo DE-SNS, esperando que, pela sua formação de base, médico e militar, e já pela sua experiência em determinadas funções, “possa vir a melhorar o SNS em termos de organização, planeamento e gestão de recursos, porque não podemos ter diferentes SNS no país”. Ou seja, “com cada Unidade Local de Saúde a trabalhar de forma diferente”.
Por seu lado, o bastonário da Ordem dos Médicos, Carlos Cortes, destacou a “visão transversal” de Gandra d’Almeida, “um conhecedor do SNS e um defensor do SNS”.
Já Xavier Barreto, dos Administradores Hospitalares, afirmou que o mais importante é saber a visão que a ministra e o novo diretor executivo do SNS têm para a função: “O Governo ainda não anunciou quais as mudanças que quer fazer na Direção Executiva.”
São 646 páginas de Relatório, mais cerca de oito mil em anexos, que compõem o documento que Fernando Araújo entregou à ministra da Saúde com o balanço da atividade desenvolvida ao longo de 16 meses pela sua equipa na Direção Executiva do SNS. O Relatório de Atividades deixa uma radiografia geral do Serviço de Saúde, dos recursos humanos ao financiamento.
“É crítico cativar médicos”
Cerca de 5000 profissionais do Serviço Nacional de Saúde deverão aposentar-se este ano, estima a Direção Executiva que está de saída, alertando que é “crítico conseguir cativar” novos especialistas e médicos que trabalham fora das unidades públicas. Desses 5000 profissionais em idade de aposentação 1901 são médicos. A anterior DE-SNS estima que se possam reformar ainda 699 enfermeiros, 1158 assistentes operacionais,
171 técnicos superiores de diagnóstico e terapêutica, 794 assistentes técnicos, 139 técnicos superiores, 37 farmacêuticos e 198 profissionais de outras áreas.
Urgências Obstétricas
A equipa de Fernando Araújo considera que a polémica Operação Nascer em Segurança, que incluiu o encerramento de blocos de partos e a criação de escalas de rotatividade entre maternidades, se revelou segura. “Houve um aumento do número total de partos no SNS no ano de 2023”, lê-se no documento, que recorre ainda a dados do Instituto Nacional de Estatística para destacar a diminuição da mortalidade infantil no país, de 2,6 para 2,5 óbitos de crianças com menos de 1 ano de idade por cada 1000 nados-vivos, em 2023.
11,6 mil milhões de euros para as ULS em 2024
As 39 Unidades Locais de Saúde (ULS) vão dispor de 11,6 mil milhões de euros em 2024, através de um novo modelo de financiamento que “precisa de ser aperfeiçoado nos próximos anos”, indica o Relatório entregue por Fernando Araújo. As ULS de de Coimbra (826 milhões), de São João , no Porto (706 milhões), de Lisboa Norte (680 milhões) e de Lisboa Central (680 milhões) recebem as maiores fatias de financiamento.
Ana Paula Martins Ministra da Saúde