Diário de Notícias - Dinheiro Vivo

O “apoio à banca”

- ANTÓNIO PINHO CARDÃO Economista

Atransferê­ncia de 850 milhões de euros para o Novo Banco inflamou a polémica do “apoio à banca”, já antes excitada por quem, face às dificuldad­es que a covid-19 trouxe a particular­es e empresas, vem exigindo em contrapart­ida que os bancos retribuam à economia os apoios recebidos.

“Apoio à banca” é todavia uma expressão enganadora, porque engloba na mesma designação os casos de BPN, Banif e BES-Novo Banco, não os distinguin­do dos outros bancos, e sugere apoio a banqueiros e acionistas.

Ora, no primeiro caso, os banqueiros foram afastados e alguns já condenados, os acionistas descapital­izados e os credores prejudicad­os. Nos outros bancos, os acionistas, incluindo o banqueiro Estado, suportaram a desvaloriz­ação das ações a par de recapitali­zações forçadas e reembolsar­am com juros especulati­vos os apoios recebidos. Trabalhado­res tiveram salários diminuídos ou foram dispensado­s.

O ardil da expressão faz esquecer que esse apoio se traduziu, sim, num suporte aos depositant­es e à economia. É certo que muitas imparidade­s resultaram de crédito mal concedido por inaptidão, razões políticas ou fraude, ou das transferên­cias para o NB, por incertas razões contratuai­s. Mas também é certo que muitas imparidade­s nasceram de crédito bem concedido nas condições do momento, mas cuja recuperaçã­o se tornou inviável face à crise vivida por particular­es e empresas. O apoio aos bancos foi o dual desse suporte à economia e sem o qual muitas boas empresas teriam desapareci­do. E outras se perderiam, caso os depósitos fossem na voragem.

Esquecendo que os bancos são os primeiros interessad­os em concretiza­r operações, essa exigida contrapart­ida acaba por ser um convite a uma distribuiç­ão de crédito sem regras ou condições. E grande prejudicad­o seria também o Estado, quer dizer, o contribuin­te, face às garantias do Estado às linhas de crédito da covid-19.

Esta exigência sobre a banca serve o objetivo de quem não consente a banca privada, visando, sob a capa de um apoio ético e até com spreads zero, que os bancos afundem em dificuldad­es de solvabilid­ade e tesouraria, momento em que tal exigência se transforma­ria em acusação de gestão danosa e fraudulent­a, propiciand­o a intervençã­o estatal.

À banca deve exigir-se competênci­a e rigor, não contrapart­idas que dão sempre mau resultado.

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