Diário de Notícias - Dinheiro Vivo
Vem aí um selo que distingue edifícios saudáveis que privilegiam critérios ambientais e de saúde. Promotores e investidores a postos.
O mundo do trabalho mudou em poucas semanas. Habituados a deslocar-se diariamente para o escritório, grande parte dos funcionários viu-se, de um dia para o outro, em casa. O trabalho remoto ganhou um dinamismo inesperado e as pessoas parecem gostar desta nova realidade. Mas se empresas e colaboradores se adaptaram a este novo modo de viver, o futuro não deverá ser tão diferente da era pré-covid. Ainda assim, consultoras e promotores imobiliários reconhecem que o mercado dos escritórios terá de espelhar uma nova forma de estar, priorizando a proteção da saúde.
A criação de um selo que assegure edifícios sustentáveis ao nível ambiental e humano é o próximo passo, adianta Hugo Santos Ferreira, vice-presidente da Associação Portuguesa de Promotores e Investidores Imobiliários (APPII). A associação, em conjunto com outras empresas, está a ultimar uma “parceria com a Nova Medical School para criar um laboratório de certificação de edifícios saudáveis e dar orientações a promotores e gestores para promover a saúde”.
Poderá ser o passo essencial para o regresso. “O ambiente de escritório proporciona experiências, interações com colegas, confronto de ideias, resolução de conflitos, aprendizagens não replicáveis digitalmente”, argumenta Amílcar Marques da Silva. O responsável da Cushman & Wakefield nota que só neste espaço se promovem experiências pessoais e colaborativas que não são possíveis em casa. “Por muito que a tecnologia nos dê soluções que melhorem a qualidade de vida, não substitui o que se consegue através da interação humana”.
Também Mariana Rosa, da JLL Portugal, acredita que “no pós-pandemia, o contacto presencial – networking, conversas cara-a-cara – permanecerá essencial. Porém, a tendência da última década de densificação do espaço de trabalho será invertida, com foco na flexibilidade, bem-estar e eficiência para aumentar a produtividade”. Os projetos de escritórios vão ter de responder a novas exigências: espaços de qualidade, arejados, amplos, com luz natural, servidos de transportes públicos, comércio e serviços, com características modernas, bons sistemas de ar condicionado e ventilação e disponibilidade de espaços exteriores privativos ou comuns.
Dessa nova realidade fazem parte os coworks, espaços de trabalho partilhado que por cá surgiram há 10 anos como “resposta eficaz à precariedade e fragilidade dos independentes”, recorda Fernando Mendes, líder do Now_Beato. Uma década depois, os coworks estão “nas mesmas condições de reagir e ajudar a levantar uma nova onda de esperança na cidade e no país”. Apesar de as receitas terem “simplesmente desaparecido” em dois meses, Fernando Mendes encontra sinais de esperança, não só na maior procura por parte das empresas – não de trabalhadores independentes – como no facto de “a maioria dos que ficaram confinados perceberem agora a real importância de poder usufruir de um espaço assim, uma casa fora de casa”.
No LACS, a maior preocupação é responder à falta de espaço, pelo que foi criado um pacote de 10 horas de utilização de salas de reuniões de maior dimensão, para garantir a segurança dos trabalhadores. E empresas que tenham deixado as suas instalações podem juntar, numa sala de reuniões, as equipas em trabalho remoto ou realizar encontros com clientes ou fornecedores, assinala a diretora-geral, Dulce Martinho.
Os preços descem?
“A maior certeza hoje é a incerteza”, frisa Hugo Santos Ferreira. Embora admita uma descida temporária – algo “normal e esperado para este momento de paralisação” –, as previsões apontam para uma retoma num prazo de 6 a 12 meses. Amílcar Marques da Silva considera “cedo para aferir o real impacto da covid-19 no imobiliário que não seja conjetural”. Para já “tem impacto residual nos ativos imobiliários”. E Mariana Rosa sublinha que as premissas que definem o valor das rendas nas grandes cidades mantêm-se inalteradas: baixas taxas de disponibilidade, falta de escritórios de qualidade, procura de empresas nacionais e internacionais para entrar e/ou expandir.
Já Jorge Valdeira, diretor da Regus, especializada em centros de trabalho flexível, reconhece que poderá haver alguma retração nos preços do arrendamento de escritórios. É porém cedo para certezas, dada a inexistência no momento de informação estatística que aponte para onde vai o mercado. Certo é que a pandemia não travou os planos de expansão. Com 14 centros em Portugal, a Regus prepara-se para abrir em julho a 15.ª unidade, na Quinta do Lago, Algarve, um investimento de um milhão. Valdeira acredita que o novo espaço será bem acolhido desde a estreia, quando os turistas precisarem de “dar um olho aos negócios”. Há ainda contactos para franchisar a marca em cidades fora Lisboa e Porto, ainda que haja escassez de oferta e os escritórios privados nestes centros continuem com muita procura.
Apostar na segurança
Sem nunca terem suspendido atividade, os centros da Regus adaptaram-se às novas exigências de higiene e segurança. Maior distanciamento entre secretárias no coworking, reforço de limpeza, colocação de desinfetantes e material informativo, portas abertas para evitar usar puxadores e recomendação de uso de máscara são disso exemplo. Nos escritórios privados, cada empresa suas medidas.
Também a Ávila Spaces, que explora dois centros de negócio em Lisboa, avançou com um conjunto de regras para o desconfinamento. O que, conta Carlos Gonçalves, implicou “investir milhares de euros” em materiais de proteção base e dos espaços, como divisões em acrílico – medida dispensada no Now_Beato por ser “a forma mais dura de relembrar que não podemos estar perto uns dos outros”. A limpeza foi também reforçada. A estas medidas, o LACS juntou um circuito de entrada e saída dos edifícios e definiu uma taxa máxima de ocupação de zonas comuns.
O regresso ao escritório virá, ainda assim, com turnos e muitos colegas à distância: na Critical Software mantém-se a recomendação para “trabalhar de casa sempre que possível”, confirma o responsável pela gestão de infraestruturas da tecnológica portuguesa.
“A densificação do espaço de trabalho será invertida, com foco na flexibilidade, no bem-estar e na eficiência, para aumentar a produtividade dos trabalhadores.”
Responsável pelo departamento de escritórios da JLL Portugal