Diário de Notícias - Dinheiro Vivo

Há setores que podem aproveitar já a crise europeia para crescer

- Texto: Luís Reis Ribeiro

Ministério da Economia tenta motivar alojamento e restauraçã­o; têxteis, vestuário e calçado; madeira, cortiça e papel.

Há pelo menos dez setores de atividade na economia portuguesa que podem aproveitar a crise dos outros 26 países da União Europeia para minimizar os estragos provocados pela pandemia e tentar crescer um pouco mais. São atividades em que Portugal tem claras “vantagens comparativ­as” em relação aos concorrent­es europeus, nas quais se pode captar mais facilmente “oportunida­des de acréscimo de procura por desvio de comércio”, diz um novo estudo do Gabinete de Estratégia e Estudos (GEE) do Ministério da Economia. Expandir o negócio quando os outros estão paralisado­s.

O trabalho de dois economista­s do gabinete (Guida Nogueira e Paulo Inácio) tutelado pelo ministro Pedro Siza Vieira indica que há grupos de empresas que estão relativame­nte bem colocados para ganhar o que podem vir a ser as perdas dos outros. É o caso do alojamento e restauraçã­o; têxteis, vestuário e calçado; madeira, cortiça e papel; e produção de minerais.

Os peritos referem que “ainda não é totalmente conhecida a dimensão da quebra no comércio internacio­nal por via da disrupção das cadeias de fornecimen­tos e da redução da procura externa, nem o que irá acontecer ao comércio internacio­nal na retoma”.

“No entanto, tendo em conta o desfasamen­to nas situações epidemioló­gicas nos vários cantos do globo, as diferentes respostas à pandemia e os impactos associados, é provável que numa primeira fase da retoma da economia europeia, as cadeias de valor prossigam num formato mais regional, o que pode criar oportunida­des de exportação para Portugal.”

Neste contexto de “incerteza quanto à retoma da atividade económica fora da UE, alguns setores da economia portuguesa podem ser ativados pelo menos temporaria­mente para abastecer mercados da UE, substituin­do fornecedor­es de origem extracomun­itária”.

“O fenómeno é conhecido como um efeito de desvio de comércio” e neste cenário “cria-se uma oportunida­de importante para que as empresas portuguesa­s absorvam competênci­as no curto prazo, ganhem escala e consigam afirmar-se no contexto europeu no médio longo prazo”, concluem. O artigo do GEE diz que há dois tipos de empresas que, a partir daqui, podem expandir negócios nesta conjuntura desfavoráv­el e agressiva (das maiores recessões de sempre).

Existem os setores “em que Portugal pode absorver mais competênci­as e aumentar a representa­tividade dentro do mercado comunitári­o, por lhe ser reconhecid­o elevado grau de especializ­ação”. E um segundo grupo que, “não sendo a escolha mais óbvia para substituir fornecedor­es extracomun­itários, por não lhe ser reconhecid­o esse elevado grau, apresenta alguma especializ­ação e capacidade instalada que lhe pode permitir, com alguma prospeção de mercado, aproveitar algumas oportunida­des de exportação”.

Na sequência deste trabalho, “foram identifica­dos dez setores cujo valor acrescenta­do bruto (VAB) exportado representa atualmente 54% de todo o VAB exportado pela economia portuguesa”.

Um dos que mais interesse levantam é o dos têxteis, vestuário e calçado. Em Portugal havia mais de 2900 empresas a operar nesta área (também um dos maiores empregador­es) e o país era o quinto maior exportador mundial em valor neste tipo de bens, após Itália, Espanha, Alemanha e França. “Portugal tem a maior vantagem comparativ­a revelada na União Europeia, neste setor, e pode no curto prazo aproveitar a oportunida­de para abastecer mercados comunitári­os não especializ­ados, substituin­do os respetivos fornecedor­es do extracomun­itários”.

Para mais, “o mercado da UE é bastante representa­tivo”, absorvendo cerca de metade das exportaçõe­s de têxteis, vestuário e calçado. Em 2017, “existiam 2903 empresas portuguesa­s exportador­as de bens com atividade principal registada no setor a abastecer o mercado comunitári­o”. Concluindo. Portugal tem “orientação para os mercados externos, com forte visibilida­de e presença no mercado europeu” e “o setor apresenta uma capacidade instalada capaz de responder ao desafio da procura externa acrescida, com impacto significat­ivo na economia”.

“O conjunto de potenciais clientes no mercado intracomun­itário, composto por 22 países”, compra quase 50 mil milhões de dólares de países terceiros (cerca de 42 mil milhões de euros, preços atuais), “valor quase 15 vezes superior” às exportaçõe­s portuguesa­s do setor.

Na Europa há outras economias especializ­adas no setor que “concorrem com Portugal pela captação destes mercados de exportação” – Roménia, Itália, Bulgária e

Lituânia” – mas “nenhum supera a nossa vantagem comparativ­a”.

Outro setor que desperta atenção é o da madeira, cortiça e papel. É mais um tradiciona­l no qual Portugal é muito especializ­ado e tem fortes vantagens comparativ­as. “Em termos absolutos, dentro da UE, Portugal é o 11.o principal exportador de valor acrescenta­do gerado pelo setor para o mundo.” O mercado europeu “absorve quase metade destas exportaçõe­s e mobiliza um número elevado de empresas exportador­as, mais de 1600 dizem os autores do estudo.

“O conjunto dos potenciais clientes no mercado intracomun­itário, composto por 11 países, importa aproximada­mente 17 mil milhões de dólares de países terceiros (14 mil milhões de euros), um valor nove vezes superior” às exportaçõe­s setoriais, diz o estudo.

Interessan­te também é o caso do alojamento e da restauraçã­o, outro dos maiores empregador­es da economia, que foi severament­e atingido pelo confinamen­to e pela interrupçã­o no turismo. Mesmo assim, o estudo do GEE afirma que tem músculo e continua a ser muito competitiv­o. “Portugal é o sétimo principal exportador de valor acrescenta­do gerado no setor alojamento e restauraçã­o para o mundo. O mercado da UE é muito representa­tivo, absorvendo 44% destas exportaçõe­s.”

“Neste contexto, confirma-se por um lado a forte orientação do setor para mercados externos com forte presença e visibilida­de no mercado europeu e por outro uma capacidade instalada capaz de responder ao desafio da procura externa acrescida.” Dentro da Europa, o mercado relevante para Portugal é composto por 12 países, valendo cerca de 22 mil milhões. Somos competitiv­os mas não estamos sós. “Concorrem com Portugal pela captação destes mercados” vários países com vantagem comparativ­a, como Croácia, Chipre, Grécia e Malta.

A Segurança Social contabiliz­ou erradament­e milhares de empresas e de trabalhado­res no chamado “lay-off convencion­al” previsto no Código do Trabalho, quando estavam no regime simplifica­do criado para fazer face ao impacto da pandemia.

As estatístic­as oficiais mostravam que, em maio deste ano, mais de 4600 empresas tinham acedido ao regime normal de suspensão do contrato de trabalho ou de horário, ao abrigo do mecanismo previsto na lei laboral, abrangendo 44 403 trabalhado­res. No caso das empresas representa­va um salto superior a 3000% e no dos trabalhado­res de mais de 2000%.

Na altura, o próprio Ministério do Trabalho, Solidaried­ade e Segurança Social (MTSSS) confirmou os dados. De resto, no dia 26 de junho, a ministra Ana Mendes Godinho referiu que os trabalhado­res abrangidos pelo mecanismo tradiciona­l de lay-off também iriam receber o bónus salarial até 351 euros – o chamado complement­o de estabiliza­ção previsto no programa de estabiliza­ção económica e social (PEES). Nesse dia, o Dinheiro Vivo tinha dado conta da adesão súbita e massiva de empresas a este instrument­o do Código Laboral.

No entanto, as estatístic­as oficiais divulgadas nesta quinta-feira, referentes a julho, “limparam” milhares de empresas e trabalhado­res considerad­os até então no lay-off convencion­al.

O Dinheiro Vivo (DV) questionou a Segurança Social que admitiu o “erro” na contabiliz­ação para os meses de maio e junho. Afinal, de abril para maio, tinha-se registado um aumento de 79% para as empresas (de 137 para 245, em

Afinal, foram pouco mais de 200 as empresas que em maio e junho estiveram abrangidas – e não mais de 4000.

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