Diário de Notícias - Dinheiro Vivo
Fórmula 1 e MotoGP são “montras para o mundo como há poucas”
Algarve é destino maduro e com taxas de ocupação de 100% no verão, mas um ano atípico com efeitos devastadores faz pensar em mudança.
O sol continuou a brilhar por terras algarvias e as praias banhadas por tons amenos de azul-esverdeado. Mas a banda sonora habitual das gentes de todos os cantos a falar em diferentes línguas silenciou-se. O retrato do último verão é cinzento. E como o turismo alimenta grande parte da economia algarvia, 2020 será ano de má memória por estas bandas, com efeitos devastadores sobre o emprego – direto e indireto. Que o inverno irá agravar. Há, porém, dois grandes eventos à porta que prometem trazer algum calor à região – e à economia local – nesta reta final de um ano para esquecer.
“Quando falamos da Fórmula 1 e do MotoGP, antes ainda do impacto na procura no momento do evento, há um impacto que é talvez mais importante: serem montras para o mundo como poucos eventos o conseguem ser”, assegura o presidente da Região de Turismo do Algarve (RTA). “Esse benefício e o facto de, apesar de tudo, virem pelo menos cinco mil pessoas de cada vez – pessoal das equipas das duas competições –, que permanecem cerca de uma semana no território, são já de si importantes.” Mas face ao volume da oferta estes eventos têm, ainda assim, impacto reduzido. “Tudo dependerá das condições em que estes eventos se realizem em termos de impacto direto e no momento do evento em termos de participação de público”, concretiza João Fernandes.
O Grande Prémio de Fórmula 1 vai decorrer no Autódromo Internacional do Algarve, em Portimão, entre 23 e 25 de outubro, estando à venda bilhetes embora para uma ocupação bem inferior à capacidade da infraestrutura. No final do próximo mês, de 20 a 22 de novembro, é vez do MotoGP – que trará a este palco o herói português da modalidade, Miguel Oliveira. “Estivemos a analisar e entre bancadas é relativamente fácil ter circuitos autonomizados para pequenos setores, ter circuitos de chegada, de estacionamento, de acesso ao recinto e um conjunto de valências extraordinárias – porque é um autódromo internacional, com a certificação mais elevada no mundo”, diz João Fernandes. “Seria muito, mas muito importante para o Algarve que pudesse acontecer com um volume considerável de público. Seria pelo menos o garante que durante aqueles períodos teríamos uma afluência significativa à região.”
Destino turístico maduro (tal como a Madeira), nos meses de verão o Algarve conta habitualmente com taxas de ocupação na casa dos 100%. O que significa que a região, para crescer, tem de apostar no resto do ano, esbatendo os efeitos da sazonalidade. Nos últimos anos, conseguiu algum resultado e os números de janeiro e fevereiro apontavam para a continuidade dessa tendência. Até rebentar a pandemia e com ela colapsarem os resultados do esforço. A dimensão da fatura será tanto mais pesada quanto mais demorarem a chegar vacina ou tratamento para a covid. lhões de passageiros desembarcados. E começámos 2020 da melhor forma, com janeiro e fevereiro a acrescentar, no seu acumulado, 14,6% aos hóspedes em hotelaria em relação ao período homólogo. A receita estava a crescer até mais do que a procura – que é algo que o Algarve ambiciona, crescer durante a época baixa”, diz João Fernandes.
A primeira quinzena de março ainda alimentou a onda de crescimento. Mas com Portugal (a 19 de março) e outros países europeus a declararem Estado de Emergência, implementando medidas de restrição de movimentos e o encerramento de fronteiras o quadro mudou, transformando-se num triste prólogo dos meses seguintes.
“Em março, a primeira quinzena decorreu com boa atividade mas a segunda ditou uma queda abrupta e no final, acabámos por ter praticamente 50% da atividade conseguida nesse mês em 2019. Abril e maio foram meses de confinamento e de inatividade praticamente total – apenas alguns turistas estrangeiros, que normalmente têm estadas prolongadas e que se sentiam mais seguros na região permaneceram, bem como alguns, nacionais e estrangeiros, que têm aqui uma segunda habitação”, acrescenta o responsável.
No final de maio, perdido o balão de oxigénio que a Páscoa tipicamente gera, o Algarve começou a recuperar as primeiras ligações ao estrangeiro, com voos como o da Luxair. “Conseguimos reativar os
“Se não houver mudanças em breve no transporte aéreo, será difícil que o golfe tenha uma atividade expressiva.” —JOÃO FERNANDES Presidente da Região de Turismo do Algarve
e de natureza ganham popularidade em termos do mercado doméstico e espanhol. E o Algarve tem outra carta na manga. “Na Europa, e nas grandes organizações, está a discutir-se o teletrabalho e estamos a tentar explorar isso do ponto de vista da oportunidade em diferentes mercados. Temos conseguido atrair alguns nómadas digitais e queremos alargar esse convite e essa oportunidade a um conjunto mais vasto de pessoas”, revela o líder da região de turismo. vai criar-se uma expectativa no consumidor diferente da que existe hoje.”
Apesar do grande ponto de interrogação que acompanha para já 2021, há quem tenha programados investimentos para a região. A easyJet anunciou nesta semana a abertura de uma base sazonal em Faro a partir de março. Mais de 20 anos depois de ter começado a ligar vários destinos da Europa a Faro, a low cost avança assim para a terceira base em Portugal, criando à partida uma centena postos de trabalho diretos.
Apesar dos dias difíceis que o turismo e a região atravessam, a implementação desta base vai ter também efeitos indiretos sobre o emprego. Além de todos os serviços ligados aos passageiros, que podem ser reforçados, localmente e a médio prazo mais turistas podem chegar à região, exigindo mais recursos humanos em áreas complementares como restauração, serviços e comércio.