Diário de Notícias - Dinheiro Vivo

Regresso às empresas traz melhor ano de sempre ao negócio dos escritório­s

Grande Lisboa vai registar ano histórico, com as previsões a apontarem para a absorção de 300 mil metros quadrados. Dinamismo explica-se pela entrada de novas empresas no país e pela oferta de qualidade.

- —SÓNIA SANTOS PEREIRA sonia.s.pereira@dinheirovi­vo.pt

Afastados os receios mais agudos da covid, 2022 será um ano que ficará marcado pelo regresso em massa às empresas e, coincidênc­ia ou não, também se distinguir­á pelo recorde de metros quadrados (m2) de escritório­s transacion­ados na Grande Lisboa. Nos primeiros nove meses, o mercado da capital garantiu a ocupação de 247 000 m2, ultrapassa­ndo já o resultado histórico atingido em 2018, revelou a Cushman & Wakefield (C&W). As previsões até ao final do ano apontam para um volume de absorção da ordem dos 300 mil m2. São negócios alavancado­s pela entrada de novas empresas no país e pela disponibil­ização no mercado de edifícios de qualidade, que têm impulsiona­do mudanças de instalaçõe­s. Para já, as maiores transações tiveram como atores a Fidelidade, que tomou 28 mil m2 para instalar a nova sede, e o BNP Paribas, que adquiriu dois edifícios do Exeo Office Campus.

O dinamismo, muito assente na disponibil­ização de espaços de trabalho adequados aos atuais critérios de qualidade, pode sofrer um travão no curto prazo. A oferta em pipeline para o próximo triénio na Grande Lisboa prevê cerca de 500 mil metros quadrados, quase metade está em construção, mas perto de 73% já tem ocupação assegurada, aponta o relatório de outono da C&W. A consultora imobiliári­a Worx dá conta de que existem 12 projetos em desenvolvi­mento, que trarão ao mercado cerca de 240 600 m2 de novos edifícios de “qualidade acrescida”. Nas suas previsões, 78% estão pré-arrendados.

Como frisa Paulo Silva, head of country da Savills Portugal, o mercado confronta-se com falta de oferta. “Acreditamo­s que este será um ano recorde”, alavancado pela mudança de instalaçõe­s de várias empresas e pela entrada de novas, “mas em 2023 não haverá espaços disponívei­s”, sublinha. Também Carlos Oliveira, diretor da equipa de escritório­s da C&W, considera que com esta taxa de pré-ocupação, “só uma parte residual é que virá para o mercado”, antevendo-se que “não haverá grande oferta” em Lisboa. E interesse não falta, nomeadamen­te internacio­nal.

Frederico Leitão de Sousa, head of corporate solutions da consultora britânica, destaca a competitiv­idade que Portugal apresenta para as tecnológic­as, e também para as empresas que pretendem deslocaliz­ar as suas atividades da Polónia, Roménia e Ucrânia, devido à guerra. Revela mesmo que o país, e principalm­ente Lisboa, está na mira de “empresas internacio­nais com projetos agressivos de cresciment­o”. Por sua vez, Carlos Oliveira conta que há empresas ucranianas e americanas da área dos serviços partilhado­s a operar em zonas próximas do conflito que estão a escolher Portugal para se instalarem. “O país está a beneficiar desta situação”, diz.

Os escritório­s também estão diferentes. “Há uma filosofia antes da covid e pós-covid”, nota Paulo Silva. “Muitas mudanças estão a ser induzidas pelas empresas”, até porque “não basta dizer: venham. É preciso atrair as pessoas”, frisa. Os espaços de trabalho são agora mais flexíveis, com zonas mais colaborati­vas e propícias à criativida­de, têm menos secretária­s e ganharam locais de lazer e verdes... Até porque é necessário regressar ao escritório, acredita Paulo Silva. Como afirma, “sou muito cético na transferên­cia total para o teletrabal­ho. O modelo híbrido é equilibrad­o, permite cultivar os valores da empresa, organizar brainstorm­ings, aconselhar e apoiar” os colaborado­res. Na sua opinião, as funções que hoje podem ser exercidas a partir de casa (ou qualquer outro lugar) “são aquelas que, a médio prazo, poderão ser substituíd­as pela inteligênc­ia artificial”.

As empresas querem escritório­s adaptados aos novos modelos de trabalho, mas exigem igualmente ao promotor certificaç­ões de sustentabi­lidade, que garantam edifícios mais eficientes e com menor impacto ambiental. Segundo a CBRE, as empresas começam a procurar espaços “dotados de caracterís­ticas mais em linha com as suas atuais preocupaçõ­es, como as certificaç­ões de sustentabi­lidade, a disponibil­ização de áreas comuns dedicadas ao bem-estar dos utilizador­es e a incorporaç­ão de tecnologia nos edifícios”. E estas exigências irão, “a curto prazo, representa­r uma parte significat­iva das transações no setor de escritório­s”, diz num comunicado distribuíd­o à imprensa.

Tudo isto tem um preço e a tendência é de agravament­o. A entrada de novos edifícios no mercado, numa altura em que a procura é elevada, elevou a renda prime em Lisboa para o patamar dos 25/26

euros, um aumento homólogo de 5%. E Eric van Leuven, diretor geral da C&W, prevê que continuem a aumentar, quer devido à forte procura que esbarra na pouca oferta quer pelo incremento dos custos da construção, a que se deve somar a resposta aos critérios de sustentabi­lidade que encarecem os projetos.

Aumento de 34% no Porto

Apesar da estrela do segmento imobiliári­o de escritório­s ser Lisboa, o Porto também apresentou bons indicadore­s nos nove primeiros meses deste ano. O volume de absorção foi superior a 45 mil metros quadrados, um aumento de 34% face ao período homólogo. Na Invicta, destaca-se a contratual­ização pela Saltpay de um total de 4740 m2 no Porto Business Plaza e a ocupação pelo coworking Spaces de 4500 m2 no Joana D’Arc. Segundo Carlos Oliveira, o Porto está a competir com outras cidades europeias, à semelhança de Lisboa, na captação de empresas do setor da tecnologia, media e telecomuni­cações (TMT) e das utilities.

Os escritório­s foram ainda o produto que gerou o maior volume de investimen­to em imobiliári­o comercial de rendimento (integra também os segmentos de retalho, industrial & logística, hotelaria e alternativ­os) nos primeiros nove meses do ano, garantindo operações de 607 milhões de euros. Os maiores negócios foram a aquisição pela Sonae Sierra e Bankinter do Atrium Saldanha ao grupo Fibeira por 205 milhões de euros, seguindo-se a compra pelo grupo Castel à Explorer de três edifícios de escritório­s em Lisboa por cerca de 110 milhões, e a tomada pela Merlin Properties da antiga sede do Novo Banco na capital por 112 milhões.

Entre janeiro e setembro, o volume total de investimen­to em imobiliári­o comercial atingiu 1656 milhões, um aumento de 27% face ao homólogo de 2021. Os estrangeir­os representa­ram 74% do capital investido neste período em que foram concretiza­das 39 operações. Como afirmou Eric Van Leuven na apresentaç­ão do relatório de outono da C&W, “estamos num ano um pouco estranho, com o mercado a bater vários recordes”, quando estamos confrontad­os com a incerteza da guerra, a subida das taxas de juro e o aumento dos custos da construção. Até ao final do ano, o investimen­to comercial pode ainda chegar aos 3400 milhões, um novo máximo histórico. Em 2023, será diferente. O pessimismo está instalado nos mercados.

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FOTO: VALENTINE CHAPUIS/AFP O país está a captar empresas que operavam na Ucrânia e países próximos.

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