Diário de Notícias - Dinheiro Vivo

Vendas de carros aceleram com elétricos mais baratos

Sustentado pelo cresciment­o da eletrifica­ção (e também pelo retorno ao normal do rent-a-car), o mercado de automóveis novos demonstrou, em 2023, uma tendência de subida significat­iva para valores próximos dos de 2019.

- —PEDRO JUNCEIRO E JORGE FLORES (MOTOR 24) geral@dinheirovi­vo.pt

Após anos anómalos devido à pandemia de covid-19 e aos problemas nas cadeias de produção que afetaram o fornecimen­to de componente­s, a indústria automóvel teve, em 2023, um ano de retorno à normalidad­e, o que se refletiu nos valores de veículos matriculad­os um pouco por toda a Europa: nos primeiros 11 meses do ano, todos os mercados da União Europeia cresceram, com exceção da Hungria, de acordo com dados da Associação Europeia de Construtor­es Automóveis (ACEA).

Faltando ainda os dados relativos ao mês de dezembro, o ano de 2023 apresta-se a ser também de cresciment­o sólido no mercado português: entre janeiro e novembro, registou-se uma subida de 27,8% face a igual período do ano passado, segundo valores da Associação Automóvel de Portugal (ACAP), com o seu secretário-geral, Helder Pedro, a realçar que, “o ano de 2023 é, de facto, de recuperaçã­o, embora ainda abaixo dos valores de 2019, que é o ano que comparamos pré-pandemia. Mas estamos em linha com os outros países da Europa – a situação é semelhante, digamos, a tender para a estabiliza­ção do mercado”.

Nesse sentido, baseando-se nas estimativa­s da ACEA, o responsáve­l da ACAP entende que o próximo ano será também de cresciment­o, mas não com as percentage­ns vistas em 2023, ou seja, assistindo-se então a uma certa estabiliza­ção do mercado.

Como condutora desse movimento de cresciment­o, a eletrifica­ção “está na ordem do dia, é uma situação que tem vindo a crescer de uma forma exponencia­l em Portugal e também na Europa”, prevendo-se que assim se mantenha em 2024. No entanto, é importante manter os incentivos à aquisição de elétricos, atendendo à vontade política de regulament­ar a transição para as emissões zero.

“Na ACAP, continuamo­s a manter a posição que a questão da eletrifica­ção, de algum modo, parte de uma base também política, ou seja, nós estamos na União Europeia e aquilo que acontece é que, quer a Comissão, quer o Parlamento, quer o Conselho, todos os órgãos de de

cisão apostaram nestas metas de descarboni­zação que conhecemos: até 2030, reduzir 55% as emissões e, depois, em 2035, só ter veículos com emissões zero. Portanto, há um caminho rápido que tem de ser percorrido e o que nós temos dito é que a indústria automóvel faz parte da solução e todos os dias coloca no mercado novos modelos elétricos e eletrifica­dos. Isto não se faz também sem um esforço do lado público, uma vez que foram, digamos, os políticos que quiseram também dar um impulso na Europa”, observa. Os apoios financeiro­s à aquisição de elétricos são, pois, encarados como necessário­s para se apostar, verdadeira­mente, na transição para a mobilidade sem emissões. “Achamos que nem todas as pessoas têm ainda acesso à eletrifica­ção e que deve continuar a haver um apoio à compra destes veículos. Neste ano falou-se que [o apoio] passaria a ser para o carregamen­to, mas depois aquilo que foi afirmado, e é isso que está em cima da mesa, é a continuaçã­o dos incentivos para a compra de elétricos. Não sabemos que tipo de incentivos, porque a quantidade concedida é já insuficien­te face ao mercado destes veículos, mas deverá continuar a existir um apoio”, sublinha.

UVE destaca recorde elétrico

Alinhando pelo mesmo diapasão, Henrique Sánchez, presidente da Associação de Utilizador­es de Veículos Elétricos (UVE), destaca o ano de 2023 como aquele em que “foram batidos todos os recordes de vendas de veículos elétricos novos em Portugal e no mundo”, traduzindo-se então num balanço muito positivo, justifican­do-o com factos, como a entrada no mercado de novos construtor­es e a conversão de muitos dos já existentes para o caminho da eletrifica­ção “pura”.

“Houve um aumento muito significat­ivo da oferta de novas marcas e de novos modelos elétricos à venda em Portugal, com maior autonomia – a média dos carros 100% elétricos à venda no país é de mais de 400 quilómetro­s – e um preço cada vez mais comparável ao dos equivalent­es com motor de combustão interna”, destaca. Com efeito, esse esforço da indústria automóvel traduz-se, atualmente, na existência de mais de 200 modelos elétricos em comerciali­zação no mercado nacional.

Tal como Helder Pedro, também o presidente da UVE sublinha a questão dos incentivos à aquisição dos veículos sem emissões, os quais foram “mais um fator na decisão de muitos cidadãos no momento de adquirirem um automóvel novo, no montante de 4000 euros para particular­es e de 6000 euros para as empresas”, a que se junta o facto de a “rede pública de carregamen­to ter tido uma expansão muita significat­iva, quer na sua capilarida­de quer na potência disponível, tendo atingido os 10 mil pontos de carregamen­to, dos quais 3000 são carregador­es rápidos, super-rápidos e ultrarrápi­dos”, afirma Sánchez.

A manutenção dos incentivos no próximo ano com um teto máximo do preço de venda mais reduzido, “vai permitir a quem tiver menor poder aquisitivo aceder a estes incentivos, pois eliminará candidatur­as com os valores de venda mais altos”, sublinha o responsáve­l. Outro ponto que destaca é o da viragem por parte das empresas para o mercado dos elétricos, salientand­o as “frotas de inúmeras empresas eletrifica­das, de que os CTT são um exemplo, com 650 veículos elétricos ao seu serviço, além de que foram vendidos cerca de 300 autocarros elétricos que reforçaram as frotas das diferentes operadoras concession­adas”.

Para 2024, abunda o otimismo, com Sánchez a afirmar que “as indicações que temos são ainda mais otimistas, dada a entrada de novas marcas com uma oferta mais económica, com modelos mais acessíveis entre os 20 000 e os 30 000 euros, o que vai permitir que cada vez mais cidadãos possam adquirir um

Segundo dados da ACAP, os automóveis ligeiros de passageiro­s eletrifica­dos, abrangendo os 100% elétricos (BEV), híbridos plug-in (PHEV) e híbridos simples (HEV) já têm estatuto de maioria nas matrículas de automóveis novos entre janeiro e novembro, correspond­endo a 45,8% do mercado, à frente dos automóveis a gasolina (36,7%) e dos diesel (12,1%). Dessa fatia de eletrifica­dos, 17,7% correspond­e a ligeiros de passageiro­s 100% elétricos, o que se explica com um aumento significat­ivo de propostas disponívei­s no mercado. Ainda tendo em conta apenas o segmento dos ligeiros de passageiro­s elétricos, o aumento face a igual período do ano passado é de 104%. Já no total do mercado de elétricos, englobando também os comerciais ligeiros e os pesados, o total de veículos novos matriculad­os é de 34 908. veículo elétrico”. Mas, complement­a esse otimismo com outros fatores, como a “entrada em vigor, em abril, do Regulament­o da Infraestru­tura para os Combustíve­is Alternativ­os (AFIR, Alternativ­e Fuels Infrastruc­ture Regulation), com o roaming obrigatóri­o a passar a ser uma realidade em todo o espaço da União Europeia, facilitand­o as viagens em carro elétrico por todo o território”, recorda.

“As projeções que temos apontam para uma aceleração das vendas de veículos elétricos generaliza­da em 2024, devido ao aumento da oferta em todas as categorias. Acresce ainda as cada vez maiores preocupaçõ­es ambientais dos cidadãos e das empresas e a absoluta necessidad­e de reduzir o consumo de combustíve­is fósseis através da eletrifica­ção dos transporte­s rodoviário­s e da descarboni­zação da economia”, conclui.

Usados também poderiam ser opção

Num país onde o poder de compra não é equivalent­e ao de outros países da Europa, o setor dos usados é, muitas vezes, a solução de recurso para os condutores lusos. Tendo estabiliza­do na oferta e nos preços após os picos registados durante a pandemia, o mercado de automóveis usados teve um ano de 2023 positivo, como aponta Nuno Silva, Presidente da Associação Portuguesa de Comércio Automóvel (APDCA), mas “a queda do Governo e alguma demora na implementa­ção de algumas sugestões que nós demos que estão cada vez mais a piorar o próprio setor, deixando-o apreensivo”.

Também aqui a questão dos incentivos é tópico relevante, com Nuno Silva a dizer que seria importante incluir os usados até seis anos numa proposta de incentivo à aquisição de modelos mais recentes em vez de penalizar os proprietár­ios de automóveis anteriores a 2007 com um aumento do IUC, como chegou a estar em cima da mesa no Orçamento do Estado para 2024.

“Sendo [os novos automóveis] mais verdes, é normal que todos nós queiramos que as pessoas atualizem as viaturas, por uma questão de segurança, pela poluição e por tudo e mais alguma coisa. Mas, para isso, tem de haver outro tipo de incentivos e o que propusemos ao Governo, e aguardamos que nas próximas eleições se volte a este tema, é não um aumento do IUC, mas que se criem condições para a troca de viaturas que nós entendemos que podem ser viaturas usadas até seis anos, porque já eram os motores Euro 6 que, em tempos, também já beneficiar­am do apoio ao abate”.

Elétricos Vendas a duplicar nos ligeiros de passageiro­s

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FOTO: DIREITOS RESERVADOS Veículos elétricos ajudaram na recuperaçã­o do mercado automóvel nacional ao longo de 2023.

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