Diário de Notícias - Dinheiro Vivo
Lições da Farfetch
A“Há pouca tolerância aos fracassos e o insucesso empresarial permanece, muitas vezes, como um estigma. É importante, por isso, que os nossos empreendedores saibam resistir a uma certa intolerância social face ao erro e encontrem motivação para tentar de novo.”
ascensão e queda da Farfetch vem recordar-nos que a vida das empresas é feita de ciclos e transformações sucessivas. Mesmo quando se trata de projetos realmente inovadores e com grande potencial, como é o caso da Farfetch, a evolução nem sempre é linear ou isenta de contratempos.
Para se manterem relevantes no mercado, as empresas precisam de se reinventar constantemente, sobretudo se forem tecnológicas ou estiverem na fronteira do conhecimento. Ora, este desafio é tremendo e, por isso, nem sempre superado. Basta pensar na quantidade de gigantes tecnológicos que pareciam too big to fail e que, entretanto, desapareceram ou perderam importância: Yahoo!, Blockbuster, Napster, Compaq, Netscape, Nokia, Blackberry, etc..
A venda da Farfetch a um grupo sul-coreano representa um revés para o país. Trata-se do primeiro “unicórnio” de origem portuguesa e de uma empresa emblema do nosso ecossistema tecnológico, para cuja crescentemente internacionalização e atratividade de investimento a Farfetch muito contribuiu. Além disso, há natural preocupação pelos postos de trabalho (na sua maioria empregos muito qualificados), pela perda do talento que a empresa incorpora e pelos projetos que podem ter caído, como o Fuse Valley, em Matosinhos.
Em Portugal, como sabemos, as contrariedades nos negócios são muito penalizadas pela opinião pública. Há pouca tolerância aos fracassos e o insucesso empresarial permanece, muitas vezes, como um estigma. É importante, por isso, que os nossos empreendedores saibam resistir a uma certa intolerância social face ao erro e encontrem motivação para tentar de novo, corrigindo o que correu mal anteriormente. Não há fórmulas mágicas para triunfar nos negócios, o que obriga, muitas vezes, a uma aprendizagem por tentativa e erro.
Importa também desmistificar a ideia de que o investimento em startups tecnológicas, ainda sem resultados consolidados, é meramente especulativo. Quem investe nestas empresas está a aplicar o seu dinheiro em conhecimento sofisticado, em ideias disruptivas, em inovação tecnológica, em propriedade intelectual, em talento diferenciado... São negócios de elevado potencial de crescimento, cujo valor é muitas vezes intangível e difícil de rentabilizar no imediato.
Neste sentido, o ecossistema português deve procurar evitar a morte prematura de startups, que é ainda muito elevada, e ajudar os nossos empreendedores a lidar com os erros e a continuar a acreditar nos seus projetos.