Diário de Notícias - Dinheiro Vivo
Há um evidente antes e um depois no Jornalismo
No país dos baixos salários, deveria ser bastante mais notório na atividade económica o impacto do aumento dos níveis de ensino e de qualificação, à medida que vai subindo também o número de licenciados e mestres. Já escrevi em editoriais sobre o desinteresse dos estudantes na escolha de cursos superiores ligados ao Ensino (ainda que no último concurso de acesso esta tendência se tenha invertido ligeiramente). Fruto de uma profunda ausência de planeamento político nos setores mais estruturais da sociedade, a degradação das condições de trabalho dos professores na escola pública cobre de um manto nebuloso as expectativas de futuro destes profissionais. E isso afasta a renovação pelas novas gerações. Outro exemplo, na Saúde, muitos profissionais fogem do caos do SNS e outros até do país, onde a emigração parece ser a melhor alternativa aos baixos salários, horas a mais de trabalho e em condições nos limites da dignidade. Esta é só uma constatação, não há uma só área afetada pela crise da desvalorização profissional, mas há, sim, pilares basilares da sociedade que se vão desgastando com atritos.
O Jornalismo em Portugal vive hoje a maior crise em democracia. E o que é que isso diz aos jovens qualificados? Fá-los inevitavelmente questionar a entrada na profissão, quando, mais do que nunca, são necessários, imbuídos de um espírito crítico, mordaz e com competências que contribuam para a renovação do Jornalismo, desde logo pela inovação, pelo recurso à inteligência artificial, blockchain, big data e pela defesa de uma cultura de trabalho humanizada, mas acutilante, inquieta, que promova o serviço público, que fomente a democracia e combata os perigos da desinformação. Mas terão de ser estes também a valorizar os seniores da profissão, que mostram que não há futuro sem passado, que não há estórias sem memória, que não crescemos sem experiência. O Jornalismo serve para dar voz às pessoas, calar essa voz é silenciar o país – é um ataque à democracia, à liberdade de expressão, à pluralidade, aos mais elementares direitos constitucionais.
Eu sou da geração em que os jornalistas eram postos a trabalhar no online por castigo. Em 2012, com o boom do Facebook, nas reuniões de edição encolhíamo-nos porque diretores acusavam os sites e esta rede social de estarem a roubar as vendas do papel. Fujam do bicho papão – era quase o que nos diziam. Em vez de empreenderem estratégias para promover a transição digital, a maioria tornou o online num bode expiatório. Fracassámos! Está à vista que isso nos atrasou. E hoje, anos depois, ainda muitos estão parados no tempo com sites e redes sociais.
Não há negócio hoje que tenha uma esperança de vida longa (média até) que não aposte na inovação. Esta é a palavra para sair da crise: inovação (mais tarde, poderão até vir a apelidar de Revolução, mas isso será quando a mudança ficar para a História, como ficou um dia a revolução industrial). Ousar experimentar o que nunca ninguém antes fez, ousar mudar os formatos ou juntá-los numa só plataforma, enfim, arriscar a mudança, tem-nos feito tanta falta. E isto é possível sem renegar a importância do papel, da rádio e da televisão.
Quem me dera a mim fazer parte dessa mudança. Honestamente, quem me dera! Mas o emagrecimento das redações – que não é de agora, é prática contínua nos últimos anos – retira-nos os jovens e os seniores. Retira-nos capacidade de nos juntarmos para operar a mudança, para inovarmos. Esta é uma preocupação que hoje está em discussão pública.