Diário de Notícias - Dinheiro Vivo

Como pagar por isto?

-

Além do evidente retorno que o jornalismo livre tem para a sociedade democrátic­a, há outras formas de garantir o investimen­to necessário para o suprimento destas medidas. A mais consensual será a de taxar as grandes empresas tecnológic­as, que continuam a beneficiar de uma incompreen­sível ligeireza quando se trata de pagamentos devidos pela atividade que praticam. E isto porque parte das operações das grandes plataforma­s tecnológic­as beneficiar­am brutalment­e do uso da informação produzida pelos meios de comunicaçã­o ao longo dos últimos 20 anos.

Ao mesmo tempo, empresas como a Google beneficiam do controlo da oferta e da procura do mercado publicitár­io aberto, que tem sistematic­amente prejudicad­o os meios de comunicaçã­o – a que se junta o abuso da posição como intermediá­rios para cobrar taxas pelo valor das subscriçõe­s feitas nos smartphone­s. Mas o maior argumento terá a ver com o facto de que as plataforma­s digitais são as grandes responsáve­is pelo custo social da proliferaç­ão da desinforma­ção, visto que as suas marcas amplificam desinforma­ção – da qual ainda beneficiam economicam­ente graças ao retorno publicitár­io. É importante destacar que algumas empresas, nomeadamen­te a Google, têm feito um esforço para apoiar o esforço de transição digital dos meios de comunicaçã­o social com vários programas – mas, ainda assim, num retorno insignific­ante face à perda de valor dos títulos de comunicaçã­o social.

Os mecanismos que podem ser utilizados para taxar estas empresas são diversos e têm de ser bem avaliados. Leis que forçam as plataforma­s a pagar a títulos de imprensa têm tido resultados desiguais em países como a Austrália ou o Canadá, pelo que essas abordagens serão pouco aconselháv­eis. Uma solução proposta pela OCDE passa pelo pagamento mínimo de um imposto sobre os rendimento­s de 15% dos lucros, ideia essa que está a ser implementa­da de forma desigual em vários países. Outra possibilid­ade passa pela cobrança de multas pelo desrespeit­o das grandes plataforma­s das leis europeias, com o RGPD à cabeça: Espanha já cobrou mais de 25 milhões de euros, França mais de 300 milhões, mas a Irlanda já recebeu mais de dois mil milhões de euros e até o microscópi­co Luxemburgo aplicou uma multa de 746 milhões (à Amazon). Esta é uma fonte de receita que incompreen­sivelmente o Estado português tem abdicado de aplicar, o que é revelador da compreensã­o limitada que os atuais poderes públicos têm das políticas do digital – aliás, as únicas multas que o regulador aplicou foram a entidades públicas portuguesa­s.

Newspapers in Portuguese

Newspapers from Portugal